Por Rangel Alves da Costa*
Muitas vezes a
imprensa e pessoas se confundem ao citar cidades ou municípios como sendo parte
da região sertaneja. Isto talvez seja devido à inobservância da divisão
geográfica e territorial de Sergipe. Mas não é fácil apontar corretamente a
localização regional de determinados municípios, principalmente quando se trata
de sertão. E assim, por exemplo, por que Carira é de uma região sertaneja
diferente daquela de Porto da Folha ou Poço Redondo.
A complicação
é oriunda da divisão da região sertaneja em Mesorregião e Microrregiões. A
Mesorregião do Sertão Sergipano é formada pelos municípios da Microrregião de
Carira, que são Carira, Frei Paulo, Nossa Senhora Aparecida, Pedra Mole, Pinhão
e Ribeirópolis. Já a Microrregião Sertaneja do São Francisco (ou Microrregião
Sergipana do Sertão do São Francisco) é formada pelos municípios de Canindé de
São Francisco, Feira Nova, Gararu, Graccho Cardoso, Itabi, Monte Alegre de
Sergipe, Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo e Porto da Folha.
Não obstante,
há ainda a divisão territorial de Sergipe que prevê a divisão do sertão
sergipano em dois territórios: Médio Sertão e Alto Sertão. O Médio Sertão
abrange os municípios de Aquidabã, Cumbe, Feira Nova, Graccho Cardoso, Itabi e
Nossa Senhora das Dores. Por sua vez, o Alto Sertão é formado por Canindé de
São Francisco, Feira Nova, Gararu, Graccho Cardoso, Itabi, Monte Alegre de
Sergipe, Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo, Porto da Folha e Nossa Senhora
de Lourdes.
Por último,
tem-se ainda o denominado Sertão do Baixo São Francisco, formado pelos
municípios de Canindé, Poço Redondo, Monte Alegre, Porto da Folha, Nossa
Senhora da Glória e Gararu. Não é uma divisão territorial fácil de ser
assimilada, vez que um município que está no território do Alto Sertão pode não
estar na Região Sertaneja do São Francisco ou no Sertão do Baixo São Francisco.
É o caso do município de Nossa Senhora de Lourdes, que faz parte apenas do Alto
Sertão. E também faz parte da Mesorregião do Leste Sergipano e na Microrregião
de Propriá. Deu para entender?
É realmente
complicado. Mas não vejo a mesma complicação quando o que se quer apontar é
onde fica o verdadeiro sertão e quais os municípios que o compõe. E para mim só
há um sertão, o do São Francisco, do semiárido, da terra esturricada de tanto
sol, das cactáceas espinhentas e das pedras fazendo moradia para bicho afoito e
peçonhento. O sertão da vereda, da tocaia e da emboscada, da lua bonita, do
povo singelo, da fervorosa religiosidade. E sertão este que começa a partir de
Nossa Senhora da Glória e vai em direção a Monte Alegre, Porto da Folha, Poço
Redondo até chegar a Canindé do São Francisco.
Apenas estes
cincos municípios fazem parte desse mundo sertão que começa na Boca da Mata.
Por mais que a geografia faça inclusões, como ocorre com Nossa Senhora de Lourdes,
delimito o Alto Sertão Sergipano apenas com aqueles municípios citados acima.
Falar sobre o autêntico sertão, o semiárido sertanejo, o berço da estiagem,
logo se mostra um retrato já conhecido de todos. A paisagem emoldurada pelo sol
ou pela lua, tendo ao fundo a feição do povo sertanejo, a catingueira ladeada
pelo mandacaru e xiquexique, as cidades comumente padecentes e as moradias
distantes entregues ao deus dará.
É na Boca da
Mata que começa o verdadeiro sertão. E não é por outro motivo que Nossa Senhora
da Glória possui também tal denominação. Boca porque passagem, abertura,
começo, caminho para o sertão. E mata pelo que se encontrava mais adiante,
nunca concepção mais antiga onde se tinha aquela região sertaneja como
recoberta de vegetação nativa, com grandes árvores, arbustos fechados e
interiores de difícil penetração. Assim, entrar na Boca da Mata significava
iniciar o percurso ao mundo sertanejo.
Verdade que o
desbravamento e a povoação do território sertanejo se deram através do Rio São
Francisco. Os que aportaram nas margens ribeirinhas, trazendo apenas sonhos ou
carregamento de animais, primeiro exploraram as margens, fincaram currais, e
somente depois adentraram na mata. E assim o sertão foi sendo habitado até
vingar na civilização sertaneja. Contudo, quando o povoamento interior já
estava garantido, a entrada na região por terra se dava pela Boca da Mata, a
partir dos caminhos de onde está hoje Nossa Senhora da Glória.
Pelo Velho
Chico, o caminho das águas; pela Boca da Mata, a estrada sertão adentro. Desde
os tempos mais antigos que a atual Nossa Senhora da Glória possui localização
privilegiada na região sertaneja e também desde aquela época que vem se impondo
como polo regional. Além de ser o portal para o mundo sertão, também o principal
centro comercial e de onde saía toda a manutenção sertaneja. Em comboios de
animais, caminhões pau de arara e velhas caminhonetes, os mantimentos eram
adquiridos na feira de Glória e depois distribuídos pelas distâncias matutas.
Ainda hoje a
feira da Boca da Mata é referência na região, bem como Nossa Senhora da Glória
alcançou um patamar de desenvolvimento muito acima de outros municípios
vizinhos. Mas tudo nascido num tempo antigo, bem antigo.
Poeta e
cronista
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