Embora remonte
à antiguidade clássica, quando integrou a pauta de grandes pensadores que
intercalaram dois vocábulos da língua grega a fim de buscar a compreensão dos
fenômenos humanos e naturais, a geografia moderna só veio ser sistematizada no
século XIX.
A Prússia
reivindicava primazia dentro da complexa situação verificada na segunda metade
do século XIX, quando ainda permaneciam ao longo de suas fronteiras existência
medieval através de ducados e principados, cujo modus vivendi, bem como
estrutura político-administrativa, articulavam-se anacronicamente com o antigo
regime.
Vencida a
disputa com o império austro-húngaro, a Prússia, poderosa potência europeia,
encabeçou o processo de unificação germânica, absorvendo paulatinamente
territórios indispensáveis à sua pretensão de galgar hegemonia no continente.
Completada
tardiamente, a unificação alemã, verificada integralmente somente em 1870,
transformou-se em ponto nevrálgico nas relações externas, principalmente com a
Inglaterra e a França, pois a revolução burguesa havia se efetivado há mais
tempo, estando esses países inseridos imemorialmente no imperialismo, fase
superior do capitalismo na época.
Para tanto,
fez-se necessário sistematizar a ciência geográfica, dando-lhe caráter
científico através de uma série de medidas, principalmente ênfase à
fundamentação teórica alicerçada no positivismo de Augusto Comte.
Entre outras
medidas indispensáveis, encontrava-se a necessária opção pelo estudo das
condições naturais apresentadas pelas diversas partes do planeta, visando implementar
o maior número possível de informações basilares sobre riquezas minerais que
pudessem ser usadas no crescimento da Alemanha, sobretudo no setor industrial.
Formava-se a
Escola Determinista, cuja influência na geografia clássica foi decisiva, pregando
que o homem era produto do meio. O determinismo geográfico, esboçado
principalmente na Antropogeografia de Ratzel, definiu que as condições naturais
determinam a vida em sociedade, chegando ao ponto de deturpar a teoria da
evolução das espécies de Darwin, através da qual há nítida inspiração do
teórico alemão a fim de fazer valer suas pretensões, bem como, principalmente,
as do seu País e da classe dominante deste.
Naturalistas
como Alexandre Von Humboldt, Karl Friedrich Philipp von Martius, Johann
Baptist Von Spix, Carl Ritter, Fritz e Herman Muller realizaram observações em
diversas partes do globo, contribuindo decisivamente para o avanço dos estudos
das ciências naturais, bem como, principalmente, para o reconhecimento do
efetivo potencial econômico de grande parte do planeta pelo país de origem.
Considerado,
ao lado de Humboldt, pai da geografia moderna, Ratzel notabilizou-se em razão
de ter cunhado o termo espaço vital (em alemão, Lebensraum), cuja síntese pode ser
definida através de máxima da geografia política, a qual preconiza que toda a
sociedade, em um determinado grau de desenvolvimento, deve conquistar
territórios onde as pessoas são menos desenvolvidas. No início do século XX, Rudolf Kjellèn
acresceu o termo geopolítica às discussões.
A teoria do
espaço vital passou a ser ensinada em escolas e universidades alemães como
verdade absoluta, tendo influenciado decisivamente na formação da mentalidade
nacional a ponto de ser encarada como condição sine qua non para o sucesso das
pretensões germânicas no que tange à busca incessante pelo quinhão que,
intransigentemente, considerava negado pelas potências hegemônicas daquela
época turbulenta.
Posta em
prática contra a vizinha França, a teoria do espaço vital de Raztel revelou-se
mortífera e descomunal, inaugurando, quando da guerra franco-prussiana
(1870-18710), as famosas blitzkriegs.
As
indispensáveis minas de carvão mineral existentes na Alsácia-Lorena,
localizadas na fronteira com a Alemanha, motivaram a cobiça germânica em se
apropriar do território imprescindível à continuidade do projeto industrial da
poderosa potência que surgiu tardiamente na década de setenta do século XIX.
Disputas por
espaço vital a parte, a classe dominante francesa teve que se aliar aos
invasores em 1871, quando da formação da Comuna de Paris, pois privilégios
estavam sendo ameaçados pela forma organizacional da estrutura de inspiração
anarquista.
O surgimento
de uma escola francesa, capitaneada por Paul Vidal de La Blache, destaca a
importância auferida pela geografia no que diz respeito à formação de opiniões
e validação de interesses.
Bismark,
poderoso primeiro-ministro de Sua Majestade o Kaiser Guilherme I não poupou
retórica ao afirmar que a guerra franco-prussiana tinha sido ganha com a forma
como a educação estava sendo implementada na Alemanha, estruturada para fazer a
guerra.
Iniciativa
oriunda das pregações contidas nas doutrinas formuladas por Ratzel encontra-se
no padrão do calibre das armas alemães. Enquanto na Inglaterra era o 0.44 e
0.45 mm os mais usuais, na Alemanha chegaram aos absurdos 7mm e 7.65mm,
respectivamente os calibres do potente fuzil Mauser e da pistola Luger
Parabellum, sem falar nos calibres atingidos pelos mortíferos canhões Krupp.
A geografia
ensinada na Alemanha preparava todos para a guerra, a qual não tardaria a ser
deflagrada, há pouco mais de cem anos. O orgulho dos Países europeus que
detinham a hegemonia não seria facilmente sufocado pelo verdadeiro fanatismo
nacionalista que se instalou em terra germânicas.
O Kaiser
Guilherme II convocou Conferência Geográfica que se realizou em Berlim no
início da década de oitenta do século XIX. A pressão pelas armas surtia efeito
animador no sucessor do monarca que efetivou a unificação da Alemanha.
A principal
pauta enfatizava a necessidade de repartilhar as colônias, sobretudo inglesas e
francesas na África e na Ásia. Era, mais uma vez, a teoria do espaço vital
sendo chancelada pela orgulhosa Alemanha.
Pressionada ao
limite aceitável. França e Inglaterra concordaram, em tese, no repartilhamento
das imprescindíveis colônias, fornecedoras das indispensáveis matérias-primas
que asseguravam boa parte do desempenho industrial nesses países europeus.
A questão mais
delicada envolveu a negociação acerca da cessão de parte da África oriental
para a Alemanha. No subsolo dessa estratégica região africana encontravam-se
matérias-primas de valor inquestionável para o sucesso daquela fase da
revolução industrial daquela época.
A ousada
iniciativa que alicerçava as bases da geografia desenvolvida na Alemanha não
tardou a se chocar com os interesses que norteavam o imperialismo inglês e
francês. A primeira guerra foi deflagrada em 1914, dando provas que as
rivalidades culminaram no primeiro grande conflito do século XX.
Esmiuçada a
partir de 1970, enfaticamente quando da publicação de A Geografia, isso serve
em primeiro para fazer a guerra, autoria do professor francês Yves Lacoste, a
geografia clássica, sobretudo a desenvolvida na Alemanha, vem sendo analisada
criticamente sob a ótica do materialismo histórico e dialético, embora
duramente criticada pelos oponentes, pois afirmam que a etimologia comporta
apenas a fundamentação teórica calcada no positivismo de Augusto Comte.
A geografia
dos Estados-Maiores e a geografia dos professores delimitaram campos de
interesses que firmaram sólidas bases a partir do momento em que foi usada essa
ciência a fim de fazer valer prerrogativas inseridas diretamente no jogo de
poder que marcava significativamente relações internacionais em uma Europa
conturbada pelas disputas e conquistas.
[1] José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo.
Professor-Adjunto IV do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e
Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista
em Geografia e Gestão Territorial (UFPB) e em Organização de Arquivos (UFPB).
Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UERN).
[2] Marcela Ferreira Lopes.
Geógrafa-UFCG/CFP. Especialista em Educação de Jovens e Adultos com ênfase em
Economia Solidária-UFCG/CCJS. Graduanda em Pedagogia-UFCG/CFP. Membro do grupo
de pesquisa (FORPECS) na mesma instituição.
Enviado pelo professor, escritor e pesquisador do cangaço José Romero Araújo
cardos
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