sábado, 25 de abril de 2015

SUICÍDIO MATA MAIS QUE AIDS, DENGUE E LEISHMANIOSE EM TERESINA

Foto: João Brito Jr/ O Olho

Repórter: Nataniel Lima Publicado por: Nataniel Lima 22/04/2015 07h00 - Atualizado em 22/04/2015 

Teresina perde média de 50 pessoas por ano para o suicídio. Estudo do sociólogo Benedito Carlos aponta que entre 2001 e 2010 mais de 500 pessoas tiraram a própria vida na capital

Corda. Produto tóxico. Arma de fogo. Solidão. Sofrimento. Depressão. Essas são algumas das possibilidades e meios pelos quais passa uma pessoa que tira a própria vida. Um assunto ainda muito sensível e delicado de ser falado ou divulgado. No entanto, as estatísticas de casos de mortes por suicídio apontam a gravidade do tema e necessidade de discussão pela sociedade.


Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), anualmente mais de 800 mil pessoas tiraram intencionalmente a própria vida. O estudo afirma, ainda, que a cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio. Para a psicóloga especialista em saúde mental, Eulaliany Kelly, o suicídio não deve ser caracterizado como doença ou transtorno mental, mas como um ato.  

Eulaliany Kelly conta que o suicídio não é uma doença ou transtorno, mas um ato/ Foto: Nataniel Lima

“O suicídio, na verdade, é um momento em que a pessoa está muito vulnerável. E, diante desta vulnerabilidade, ela comete o ato que muitas vezes pode ser de fato consumado ou não”, releva a psicóloga. “Se não é consumado fica como uma tentativa de suicídio. Essa vulnerabilidade é, muitas vezes, gerada em torno de um sofrimento psíquico”, pontua.

HOMENS JOVENS COMETEM MAIS SUICÍDIO EM TERESINA



O sociólogo Benedito Carlos (foto) é bacharelado em Ciências Sociais e mestre em Educação pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e professor da UFPI, tem uma série de estudos sobre o tema. Segundo ele, há uma onda de suicídios planetária motivada, entre outros motivos, por diversas crises sociais e econômicas.

“O mundo passa por crises diversas e cada vez que isso acontece um sintoma é o aumento das taxas de suicídio. Teresina é uma das capitais mais pobres do Brasil, há poucas oportunidades de trabalho, lazer, estudo”, aponta o professor como uma das possíveis causas do significativo número de suicídios em Teresina.

As autoridades de saúde da capital piauiense precisam reconhecer o suicídio como grave problema de saúde pública, de acordo com professor. “O crescimento da taxa de suicídios pode ser interrompido com medidas de baixo custo”, acredita o professor doutor. “O suicídio jamais foi tratado, no estado, como sério problema de saúde pública, conforme recomenda a Organização Mundial de Saúde. Nosso sistema de saúde não possui a menor estrutura para orientar, acompanhar e assistir os fragilizados pela angústia que cerca o drama do suicídio”.

Como objeto de estudo para seu doutorado, o professor Benedito Carlos estudou os suicídios em Teresina na primeira década do século XXI. E, de acordo com seus resultados, entre 2001 e 2010 mais de 500 pessoas tiraram a própria vida, ou seja, cerca de 50 por ano. No período estudado, foram contabilizadas 11 mortes por dengue, 320 por leishmaniose, 389 por AIDs e 562 por suicídio em Teresina. Os dados foram coletados no Ministério da Saúde, através do Sistema de Informações sobre Mortalidade.



O estudo mostra, ainda, que os homens são os que mais cometeram o ato nos últimos anos na capital piauiense, sendo 69% de homens (um total de 387 homens) e 31% de mulheres (175 mortes). Os solteiros também são maioria entre os suicidas. No período pesquisado, foram 315 mortes de solteiros por lesões autoprovocadas voluntariamente, 198 óbitos de casados, 17 de pessoas separadas e 16 de viúvos.

Os jovens, entre 15 e 24 anos, são os que mais cometem suicídio (172 pessoas entre 2001 e 2010 em Teresina). Suicídios de jovens entre oito e 14 anos são mais raros na cidade (oito no período estudado), assim como óbitos autoprovocados voluntariamente por idosos com mais de 75 anos (nove, ao todo).




FATORES PODEM SER BIOLÓGICOS E SOCIAIS

Entre os motivos que levam uma pessoa a cometer suicídio, a psicóloga ressalta uma multiplicidade de fatores que podem ser de biológicos a sociais. “As causas são as mais diversas. É qualquer situação que leve o indivíduo a um grande sofrimento psicológico. Por exemplo, um abuso sexual, violência na família, perda de emprego, perda de relacionamento”.

Segundo a psicóloga, é preciso entender que cada pessoa reage diferente aos tipos de sofrimentos psíquicos. Por conta disso, algumas delas veriam o suicídio como uma alternativa para aliviar o sofrimento vivido em determinado momento da vida.

COMO IDENTIFICAR

“Não dá para saber se a pessoa é suicida ou não. O que é possível é identificar, de acordo com o histórico do sujeito, são algumas mudanças comportamentais. Tipo: ele era uma pessoa extrovertida e da noite para o dia fica uma pessoa de baixo astral”, conta a psicóloga.

De acordo com a especialista em saúde mental, a conversa é essencial nesses momentos. “Mas, para identificarmos mesmo, devemos perguntar. Não vamos saber do outro apenas deduzindo. É importante que a gente pergunte principalmente se percebermos alguma mudança que nos faça pensar que aquilo possa realmente acontecer”, completa.

Eulaliany Kelly conta ainda que quando se percebe que alguém esta vulnerável deve-se perguntar se a pessoa está pensando ou se já pensou em tirar a própria vida. “É importante ressaltar, também, que não há idade, classe social ou raça para o suicídio”, afirma.

Psicóloga e especialista em saúde mental fala sobre suicídio/ Foto: Nataniel Lima

COMO PREVENIR E AJUDAR

Após perceber a mudança de comportamento de um indivíduo e o indagá-lo sobre seus pensamentos relacionados a tirar a própria vida, a psicóloga alerta para algumas formas de prevenção, tais como retirar de perto objetos que possam facilitar a pessoa a fazer qualquer ato contra a própria vida.

“Cordas, produtos tóxicos, armas, deixe tudo isso distante da pessoa. E, claro, esteja sempre com ela. Dando apoio. É uma parte importante isso”, declara. “Dentro da família é importante que outras pessoas saibam. Pra que todos possam colaborar. Precisamos construir uma rede de ajuda, especialmente dentro da família”.

Já para o professor doutor e sociólogo Benedito Carlos, é importante saber que qualquer pessoa é suscetível a cometer suicídio. “O Estado deve atuar com ações preventivas para evitar as mortes, porque a maioria não quer morrer, apenas quer afastar a dor, angústia, o sofrimento. Se forem socorridas, as pessoas podem dar sentido à vida”, relata o professor.

Para isso acontecer, o sociólogo afirma que a cidade precisa se preparar para atender os casos de tentativas de suicídio. “Os gestores de saúde pública precisam criar equipes multidisciplinares de assistentes sociais, médicos, psicólogos que façam acompanhamento através de ligações telefônicas, visitas, medicação”, detalha.

DE SUICÍDA A “AMIGO HEROI”

Há dez anos, Paulo Ferreira* tentou tirar a própria vida. O jovem, que na época tinha 16 anos, devido há problemas emocionais e sociais acreditou que seria a melhor solução para as dificuldades que vivia. “O que me motivou foram os problemas familiares que vinham aumentando. E eu me via numa situação em que eu não enxergava uma saída. Sem falar que foi na época que eu me achava diferente por ser gay”, relata.

Paulo conta que decidiu tirar a própria vida por se achar uma “aberração” e para dar fim ao próprio sofrimento decidiu tomar veneno. “Só que eu vomitei e comecei a chorar. Pensei comigo: ‘nem para morrer eu presto’. Só que eu procurei um amigo para relatar o que aconteceu e ele me indicou o CVV, o Centro de Valorização da Vida. Foi lá onde eu tive a certeza que tive uma segunda chance”, revela Paulo Ferreira.

Após ter sido acompanhado por psicólogos, Paulo afirma que se interessou em ser voluntário porque sentia a necessidade de ajudar com uma palavra amiga outras pessoas que passam pelo que ele passou.

“A satisfação não tem tamanho. Você estar ali, ajudando o próximo, salvando uma vida, ouvindo um desabafo, não tem preço. Somos invisíveis, muitos não sabem nem nossos nomes, nem quem somos, mas choramos muitas vezes juntos. Sem falar que esquecemos um pouco dos nossos problemas”, conta o voluntário do CVV.

Paulo conta que seus pacientes e dos outros voluntários costumam chamá-los de “amigos heróis” e “anjos”, fato que chega a emocioná-los.
*O nome do personagem foi alterado para proteger a sua identidade. 

MITOS SOBRE O SUICÍDIO

1 - As pessoas que falam sobre o suicídio não farão mal a si próprias, pois querem apenas chamar a atenção.
2 - O suicídio é sempre impulsivo e acontece sem aviso.
3 - Os indivíduos suicidas querem mesmo morrer ou estão decididos a matar-se
4 - Quando um indivíduo mostra sinais de melhoria ou sobrevive a uma tentativa de suicídio, está fora de perigo.
5 - O suicídio é sempre hereditário.
6 - Os indivíduos que tentam ou cometem suicídio têm sempre alguma perturbação mental.
7 - Se um conselheiro falar com um cliente sobre suicídio, o conselheiro dará a ideia de suicídio à pessoa.
8 - O suicídio só acontece “àqueles outros tipos de pessoas,” não a nós.
9 - Após uma pessoa tentar cometer suicídio uma vez, nunca voltará a tentar novamente.
10 - As crianças não cometem suicídio dado que não entendem que a morte é final e são cognitivamente incapazes de se empenhar num ato suicida.

De acordo com o professor, todos os mitos listados acima são falsos.

AJUDA ESTÁ A OITO NÚMEROS DE QUEM PRECISA

Para ouvir uma palavra amiga em momentos difíceis o Centro de Valorização da Vida (CVV) atende a qualquer momento do dia através do número (86) 3222-0000. Recentemente, a Prefeitura Municipal de Teresina, lançou um projeto de prevenção ao suicídio.

Trata-se de um ambulatório chamado de “Provida”, voltado para o atendimento de pessoas com ideias suicidas ou que já tentaram o suicídio. A Prefeitura de Teresina mantém o serviço no Lineu Araújo, das 8h às 12h e das 14h às 18h, de segunda a sexta-feira, com uma equipe formada por um médico e dois psicólogos. O atendimento inicial não precisa de marcação de consulta. 


http://www.oolho.com.br/noticias/noticia/the-deve-se-preparar-para-atender-casos-de-tentativa-de-suicidio-diz-doutor-em-sociologia

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