Por: Rangel Alves da Costa(*)
FALTA
ALGUÉM, QUEM VEM?
Se de repente,
para um acontecimento importante da vida, uma realidade ou encenação, um
momento que não pode esperar, faltar alguém para ser principal personagem, para
fazer a composição, para não desfalcar, quem virá?
O velho
filósofo de lanterna à mão, subindo e descendo as ruas procurando o homem
honesto na sociedade, não foi mais visto fazendo o percurso, não foi mais visto
alumiando a face de cada um. E agora, quem virá procurar ao menos um ser que
dignifique a existência e os trabalhos da Criação?

Se ninguém
quiser ser Diógenes de Sínope, certamente aceitará outra missão, ser outra
pessoa. Então quem estará disposto a subir a montanha, e lá em cima perto das
nuvens, próximo ao primeiro degrau da escada do céu, confessar os seus erros,
detalhar seus pecados, dizer a mais absoluta verdade sobre seus atos terrenos?
Proponho que
alguém aceite fazer diferente do que realmente faz. Neste sentido, recomendo
que reflita o quanto critica as ações dos outros sem agir muito diferente dos
criticados; que critique as corrupções parlamentares, as ludibriações
governistas, as improbidades das governanças municipais, ao mesmo tempo em que
deixa de votar nestes mesmos parlamentares e governantes.
Ainda no
caminho destas proposituras, proponho que surja alguém que vá além do discurso
mesmista da indignação com a desagregação da família, a violência doméstica, os
descuidos e omissões dos pais para com os filhos. E que, por isso mesmo, se
preocupe mais com sua família do que com a dos outros, saiba ouvir e ponderar
antes de partir para as agressões e xingamentos, procure saber o que os seus
filhos andam fazendo e em qual companhia.
Verdade é que
falta alguém que verdadeiramente saiba amar bem mais do que a palavra
expressada sobre o amor. Quem é capaz de não confundir o amor relacional com o
desejo carnal; de, com o coração verdadeiramente tomado do mais puro
sentimento, levar diante do outro um poema na boca e dizê-lo baixinho perto da
face, diante do lábio; de ter coragem para dizer que no momento só pode
oferecer uma flor, mas quando puder presenteará com uma concha de mar enfeitada
de onda?
Falta alguém,
quem vem? Quem vem levantar da cadeira para dar o lugar ao idoso, à grávida, ao
enfermo? Quem vem com o copo plástico na mão, o papel do picolé, o copinho do
sorvete, a ponta apagada do cigarro, o embrulho do bagulho que acabou de comer,
em direção à lixeira? Quem vem para ajudar ao idoso atravessar a faixa de
pedestre, para ensinar sem enganações onde fica uma rua ou um local, e até para
olhar para o próximo que passa sem ser com arrogância e frieza?
Mas ainda
falta alguém, o problema é saber que vem. Quem vem com encorajamento para dizer
que nunca deixou de ser romântico, que cantaria serenata à janela, jogaria pela
janela uns versos rimados de amor, choraria pelo desamor, prantearia a saudade,
deixaria no umbral da janela um buquê de flores do campo? Que vem dizer que ama
de verdade e por isso tudo faria para demonstrar esse amor?

Quem vem se
indignar com as pichações dos marginais, com as praças e jardins abandonados,
com os animais abandonados pelas ruas, com as crianças drogadas jogadas embaixo
das marquises, com o padre pedófilo que sobe no púlpito para falar em pecado,
com a criança que foi violentada pelo padrasto ou familiar, com a mulher que
todos os dias apanha do marido bêbado? Mas se vier que não venha apenas com
silenciosa revolta, mas com a palavra ecoada perante o mundo. Um dia alguém
ouvirá!
Quem virá para
humildemente dizer que errou, confessar por vontade própria, redimir-se das
injustiças praticadas, das falsidades promovidas, das mentiras espalhadas? Quem
virá pedir perdão, erguer a mão, reconhecer no inimigo um irmão? Quem virá
tomar ainda banho de chuva, não se envergonhar de cantar bem alto debaixo da
molhação, dizer que ainda é criança, ter vontade de ser realmente adulto?
Mas ainda
falta alguém. Quem vem? Você virá?...
Poeta e
cronista
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