Por: Lúcia Rocha

UM
JORNAL QUE FAZ ESCOLA
Hoje, 17 de outubro, o terceiro jornal mais antigo em
circulação na América Latina, O Mossoroense, está comemorando 140 anos.
Idealizado por Jeremias da Rocha, fundador da imprensa mossoroense.
O Mossoroense tem sido ao longo do tempo, uma verdadeira escola para os
profissionais da imprensa da cidade, alguns foram mais longe, como o jornalista
e escritor Dorian Jorge Freire, que começou a escrever ainda menino, filho e
neto de jornalista, com atuação na imprensa paulista.
Comigo também não foi diferente e explicarei como se deu a vocação e
como surgiu a oportunidade de fazer parte do jornal centenário, de onde parti
para outros vôos.
O jornalismo sempre foi uma paixão, desde
criança, quando comecei a ler jornais. O Brasil vivia sob o regime militar e a
família não via com bons olhos aquela escolha. Aos dez, a coisa foi ficando
mais séria, porque mudamos para a Rua Mário Negócio, para bem próximo da casa
de seu Lauro Escóssia, então diretor de O
MOSSOROENSE.
Criança, logo a gente se
apegou com as netas de seu Lauro: Florina - escreve-se Florina mesmo, sem o D -
Cláudia e Valéria. As brincadeiras se juntavam ao papo com seu Lauro, ainda em
atividade e sempre com um jornal à mão. Ou teclando na máquina, geralmente de
bermuda e sem camisa.
Na minha família havia dois primos
ligados diretamente à profissão: Assis Cabral, na Rádio Difusora, como
noticiarista e depois comentarista esportivo; e Canindeh Alves, locutor e
diretor de algumas emissoras de rádios. Ainda criança, por diversas vezes vi
Canindeh usando uma máquina de datilografia na casa dele. Seus dedos deslizavam
no teclado, parecia um pianista. Impressionava aquela agilidade.
Aos doze, achei que estava na hora
de dar o primeiro passo rumo ao jornalismo e ingressei, por conta própria, na
escola de datilografia de Rogério Dias, a Dat Rápida, pertinho de casa. Digo
por conta própria, porque apenas comuniquei em casa e pagava com dinheiro ganho
com a venda de balas na escola de mamãe. Rogério Dias lembra bem
disso.
Obediente a família, tive que
me contentar com os cursos que a UERN oferecia e cursei Ciências Sociais. Ao
final do curso, incentivada por minha sobrinha Teresa Cristina, única pessoa
que me incentivava a fazer jornalismo, escrevi-me com ela no vestibular
da UFRN, eu para jornalismo e ela, arquitetura. Somente Teresa sabia. Aprovada,
todos ficaram sabendo pelo Diário de Natal, isso em 1987. Naquela época, o
único profissional com graduação em atividade em Mossoró era, registre-se, a
areiabranquense, Aglair Abreu, egressa da UFRN.
Depois de adulta, jamais alimentara
o sonho de entrar numa redação. Portanto, devo em primeiro lugar, meu diploma e
o ingresso no jornalismo a Teresa, residente na Suécia há alguns
anos.
Ao final daquele ano,
1987, a professora da disciplina História do Jornalismo, Otêmia Porpino,
comentou que no Curso de Comunicação da UFRN, não havia nada a respeito de um
dos jornais mais antigos em atividade, que é o nosso O Mossoroense. Então,
passou como trabalho da disciplina naquelas férias, a tarefa de colher a
história do jornal.
Foi então que se deu o meu
ingresso num veículo de comunicação,nas páginas do centenário O Mossoroense,
pela bondade do então diretor, Emery
Costa.
A sede do jornal já era na
Travessa O Mossoroense, o mesmo já pertencia ao grupo liderado pelo então
deputado federal, Vingt Rosado e comandado pelo seu primo e genro, médico Laire
Rosado.
Quando procurei Emery, ele
abriu todas as portas do jornal para a pesquisa e ofereceu um espaço para fazer
reportagens.
Tornei-me uma espécie de repórter especial durante todo aquele ano de
1988, escrevendo uma página aos domingos, com reportagens longas, sobre
os mais diversos assuntos, desde a chegada de ultraleves, como também uma
entrevista com a saudosa Neuma da Mangueira, em passagem pela cidade.Essas
reportagens eram feitas aos domingos, acompanhava-me o fotógrafo do jornal,
Nequinho. Eu levava o material para Natal e passava a semana datilografando,
errando, rasgando páginas, reescrevendo até chegar a sexta-feira, quando pegava
a estrada para Mossoró.
O sábado era na redação,
acompanhando todo o processo. Entregava as páginas datilografadas para Cosme,
que montava a página. Cada letra uma barrinha de chumbo, o jornalismo estava
bem distante do advento do computador.
No domingo saia em
campo, com outra pauta. Até hoje nunca tive pauteiro. Sempre deram total
liberdade para escrever sobre qualquer assunto e jamais os diretores do jornal
procuraram saber a pauta, o assunto. Assim, naquele ano de 1988, fiz uma página
sobre a participação da mulher na política e entrevistei a então candidata a
prefeito da cidade, a pediatra Rosalba Ciarlini. Que chegou a perguntar se a
entrevista seria mesmo publicada.
Ficou acertado com Emery que não haveria
salário e nenhuma ajuda de custo para o deslocamento nos finais de semana
Natal-Mossoró-Natal, enfim, período maravilhoso que jamais deixarei de
agradecer a Deus pela oportunidade, por Ele ter usado cada funcionário do
jornal para encaminhar-me no ingresso da profissão tão desejada e sonhada.
Foi assim, com o espaço
oferecido por Emery que meu texto foi se desenvolvendo, acredite! Os primeiros
professores e incentivadores foram dois funcionários cujo currículo é a escola
da vida e o próprio jornal, Guerra e Cosme, o Vovô. Pessoas éticas e por demais
gentis, que ao modo de cada um, davam dicas e falavam de outros colaboradores
que passaram pela casa. Um deles me chamava bastante atenção, Dorian Jorge
Freire, que só vim a conhecer pessoalmente muito tempo depois.
Naquele ano de 1988,
lembro bem de um jovem, menor de idade,que atuava na página policial. Cid
Augusto, que passava a manhãs colhendo informações de delegacia em delegacia,
juntamente com o fotógrafo Luciano Léllys. Quando chegava ao jornal, Cid
sentava e retirava da cintura um revólver, que deixava na mesa, bem junto da
máquina, enquanto dedilhava as noticias, geralmente em torno de roubo de
galinhas, briga de vizinhos, acidentes, num tempo de uma Mossoró mais pacata.
Depois Cid procurou o conhecimento acadêmico na UFRN, fez mestrado, hoje um dos
melhores textos da imprensa potiguar e diretor do jornal.
Lamento que
as empresas não mais oferecem oportunidades de estágio, mesmo sem remuneração,
porque correm o risco de processos na justiça do trabalho.
Eu até pagaria, se fosse o
caso, se pudesse voltar no tempo para remunerar o jornal, pela oportunidade que
me deu.
No ano seguinte, passei
a escrever no semanário Dois Pontos, de Natal, de onde sai para a TV Cabugi,
depois São Paulo. Aos poucos estou disponibilizando todo esse material de
reportagens no blog.
Tenho a maior satisfação em dizer
que passei por três instituições centenárias. O Colégio Sagrado Coração de
Maria, Colégio Diocesano e jornal O Mossoroense.
Sinceramente, não sei
qual rumo seria dado o meu destino se não tivesse aceitado o convite de Emery
Costa para fazer ‘qualquer coisa’ no velho e bom jornal centenário O
MOSSOROENSE, uma grande escola para muita gente que atua na imprensa. A mesma
escola por onde passara Dorian Jorge Freire, talvez o melhor texto do
jornalismo brasileiro, com atuação na imprensa de São Paulo e com quem me
espelho não somente no texto, mas na ética e na condução da carreira
profissional, acima de tudo.
Guerra e Vovô bem sabem disso.
Por diversas vezes falei pessoalmente o quanto eles são importantes para mim.
Mas sempre que dizia isso em entrevistas, os colegas supriam essa informação.
Injustamente, por sinal. Temos excelentes colegas que desenvolvem a profissão
muito bem, independente de possuir o diploma.
A formação acadêmica é ótima,
foi bom demais ter passado pelos bancos da universidade, porém, caráter,
dignidade, amor à profissão e um bom texto, quem não trouxe do berço, pode
adquirir na faculdade da vida, basta ter bom senso e ler
bastante.
O melhor goleador
capacita-se mais a cada treino. Seja num time de várzea ou numa grande equipe.
Assim também deve ser no jornalismo.
Lúcia RochaJornalista e cientista social
http://www.luciarocha.com.br/2012/10/o-mossoroense.html
Se você gosta de ler histórias sobre "Cangaço" clique no link abaixo:
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário