por José Gonçalves do Nascimento*
Dois dos atuais folhetins globais - I love Paraisópolis e Babilônia - trazem nomes de duas importantes favelas brasileiras, sendo uma em São Paulo e outra no Rio de Janeiro. Oportuno seria se, ao apresentar o dia-a-dia de tais comunidades, a mesma televisão abordasse também a origem dessa modalidade de ocupação urbana. Não o fará, certamente. Sem a pretensão de suprir tal lacuna, arriscaremos a seguir algumas pinceladas sobre o tema.
Favela é uma euforbiácea própria dos tabuleiros rasos e pedregosos dos sertões nordestinos. Em que pese seus temíveis espinhos, cuja picada pode provocar inflamações e até mesmo aleijar, suas folhas maduras constituem item básico na ração animal. Suas sementes servem para engordar galinhas, porcos, caprinos e ovinos.
Favela é uma euforbiácea própria dos tabuleiros rasos e pedregosos dos sertões nordestinos. Em que pese seus temíveis espinhos, cuja picada pode provocar inflamações e até mesmo aleijar, suas folhas maduras constituem item básico na ração animal. Suas sementes servem para engordar galinhas, porcos, caprinos e ovinos.
Algo comum na toponímia brasileira, o nome dessa espécie vegetal, acabou por
batizar pequena elevação situada nas proximidades do arraial de Canudos,
conhecida por Alto da Favela. À época da guerra, era ponto privilegiado para os
ataques inimigos, visto que dali se tinha toda a panorâmica do povoado. Por
essa razão, o Alto se tornou lugar de grandes concentrações militares, de modo
que seu nome logo ficou conhecido.
A guerra de Canudos durou um ano e custou a vida de aproximadamente 15 mil
pessoas, entre soldados e conselheiristas. Dos 20 mil homens que compunham o
exército brasileiro, 12 mil foram mandados para combater em terras de Canudos.
Para o governo, a sorte da jovem república estava nas mãos dessa parcela do
exército e seria decidida no sertão da Bahia. Depois de amargar sucessivas
derrotas, as forças oficiais finalmente batem Canudos. A república estava
salva.
No fim da guerra, o governo federal prometeu construir moradias para os
combatentes, que, em sua grande maioria, eram da cidade do Rio de Janeiro. A
promessa, contudo, não foi cumprida. Em face disso, ao regressarem à capital da
república, os soldados resolvem ocupar o Morro da Providência, nas proximidades
do então Ministério da Guerra, e ali se abrigam em modestos casebres de
madeira. Por analogia ao Alto da Favela, onde os praças haviam combatido
durante a guerra, aquele aglomerado de barracos passou a chamar-se favela.
Assim, das cinzas de Canudos e do descaso do Estado em relação àqueles que
bravamente o defenderam numa guerra brutal e vergonhosa, nascia a primeira
favela brasileira. De lá para cá, as favelas têm se proliferado por toda parte,
alcançando os quatro cantos do país. Os governos que sucederam Prudente de
Morais – o presidente que patrocinou a destruição de Canudos – nada fizeram para
resolver o problema habitacional, que é cada vez mais assustador.
A reforma agrária prometida e não realizada pela república foi concretizada em
Canudos, libertando os sertanejos da fome e do jugo pesado dos “coronéis”. Sem
exagero, Canudos foi a mais exitosa experiência de reforma no campo que o
Brasil já experimentou. Tanto é verdade que, em apenas quatro anos, a
comunidade conseguiu construir uma das economias mais sólidas do interior do
Brasil, sendo capaz de suprir as necessidades de milhares de sertanejos.
Uma ampla e justa reforma agrária, que não se restrinja apenas à mera
distribuição de terras, mas que abranja avanços significativos no campo
político, social e técnico, será a solução para grande parte dos problemas do
Brasil, em especial o do débito habitacional. Não há dúvida de que parcela
considerável das favelas brasileiras é habitada, predominantemente, por pessoas
procedentes do campo; ou seja, por aqueles que, não encontrando espaço no meio
rural, são levados a “tentar” a vida nos grandes aglomerados urbanos.
Mais de cem anos se passou; a voz do Conselheiro foi calada; as ruínas de
Canudos foram submersas nas águas do Cocorobó; a secularmente prometida reforma
agrária ainda não foi concretizada; as favelas cada vez mais se multiplicam Brasil
afora; e os governantes como sempre de braços cruzados, “crescendo a pança” e
contemplando de longe a desgraça alheia...
Quantas favelas ainda teremos que “erguer” até que a terra seja efetivamente
distribuída aos seus verdadeiros donos?
*Poeta e cronista
jotagoncalves_66@yahoo.com.br
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