Por Rangel Alves
da Costa*
Várias são as
razões – e todas deploráveis – para que as pessoas não valorizem as pequenas e
significantes coisas da vida, do mundo, da existência.
Por orgulho,
soberba ou indiferença, determinadas pessoas simplesmente ignoram o que não se
apresenta como poder, riqueza ou meio de tirar proveito de toda ordem.
Ou possui o
brilho do ouro ou não possui qualquer importância, ou não tem o valor do
diamante ou de nada lhe interessa, ou é vil metal ou vale menos que ferrugem
envelhecida.
A verdade é
que muitos se acostumaram com o fulgor, com o brilho, com a importância. Ou lhe
surge resplandecente ou será tido como algo qualquer desprezível.
Pessoas assim
são entremeadas de arrogância, imbecilidade, empáfia, ignorância,
insensibilidade e desumanidade, só para citar alguns aspectos desse menosprezo
repugnante.
Gente há que
carrega o preconceito como virtude e a discriminação como divisor de
relacionamento. Corta caminho ou vira esquina para evitar dar um bom dia ou boa
tarde.
Gente há que
tem olhar diferenciado segundo a pessoa que avista. Prefere cegar diante de um
pobre, de uma pessoa do povo, mas os olhos brilham perante o nome, o sobrenome,
a função.
Gente há que
não estende a mão se a outra mão não possuir dedos cheios de anéis. Não sorri
se o outro sorriso não for de boca de ouro e não fala a não ser para chamar o
outro de doutor, excelência, nobre cavalheiro.
Gente há que
só sabe o que é pobreza por que a imprensa fala na sua existência, só sabe o
que é sofrimento por que os jornais e a televisão falam num povo faminto e
sedento.
Gente há que é
assim. E há gente ainda pior. Gente que gostaria de viver numa redoma e o seu
mundo sintético bem distante de tudo, principalmente do povo. Como o povo de
repente faz um mal danado a certo tipo de gente!
Gente há que
se desumanizou de tal forma que nem parece ter nascido de um ventre, chorado ao
encontrar a luz, sido criança de pés no chão e tantas vezes caída ao chão.
Pessoas que
desde muito não abrem a janela, não reconhecem mais a poesia da natureza, nunca
mais ouviram um canto de pássaro, não sabem mais o que é viver.
E o que é
viver senão abraçar o mundo, a vida, a existência? O que é viver senão
aproveitar o máximo das pequenas coisas e buscar a felicidade em tudo e a todo
instante?
Viver é
aproveitar as pequenas coisas, se deliciar com os encontros, deixar-se cativar
pelo sublime, pelo singelo, pelo que nem pensava existir. Viver é assim: viver!
Viver é ser a
medida da própria natureza. Há coisa mais bela que o grão brotando, que o
orvalho molhando a folha, que o pólen fertilizando a flor? E tudo tão
pequenino...
Pequenino é o
beija-flor, o colibri, o tiziu. Pequenino é o araçá e o açaí. Pequenina é a
semente que frutifica e a gota d’água que alimenta a terra e a vida.
Os olhos
humanos deveriam aprender a amar muito mais as coisas pequeninas. Não apenas de
tamanho, mas que geralmente nem são avistadas. Olhai os lírios dos campos!
Os corações
humanos deveriam ser mais sensíveis ao que se espalha pelos quadrantes da vida
e nem sempre é avistado pela pressa de encontrar motivos de grande
significação.
Alguém já
disse que nos pequenos frascos estão as maiores essências. Nos jardins
esquecidos também estão as mais belas flores. Ora, a beleza duma flor não está
na sua cor ou raridade, mas no encanto que provoca quando avistada e sentida.
As flores do
campo jazem esquecidas nos beirais das estradas e entre ervas daninhas. Somente
um coração sensível para fazer um buquê daquelas pequenas flores geralmente
desprezadas pelos caminhantes.
Assim como a
lua é apenas uma lua para que assim desejar, igualmente será o sino de uma
igrejinha distante. É preciso ter sentimento para viver a lua, é preciso ter fé
para compreender o significado daquele simples badalar.
Tudo uma
questão de sentimento. Também de ser humano ou apenas parecer.
Poeta e
cronista
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