Por Rangel Alves
da Costa*
Dizem que num
tempo distante, numa época de versos talhados a cinzel e amor verdadeiro, um
poeta apaixonado, triste pelo não reconhecimento e desprezo da mulher e musa
tão amada, decidiu refugiar-se na montanha e de lá, para sempre, cantar seu
amor em versos ao vento.
Vivendo numa
gruta nas distâncias do cume, rodeado de bromélias flamejantes e pedras
solitárias, convivendo com o constante barulho do vento e dos pássaros grandes
que por ali faziam os seus ninhos, do amanhecer ao anoitecer escrevia pedaços
de versos em folhas ressequidas e depois as jogava ao sabor da aragem.
“E um tempo de
amor demais
amor que ainda
amo
e não ficou
para trás
em teu nome
teci a vida
renda dourada
a escolhida
com agulha de
pétala
a paixão tão
sentida
para adormecer
o sono
de quem ama
esperando
o vasto leito
perfeito
para morrer
sonhando”.
E sem jamais
conseguir esquecer aquela que um dia enviou-lhe um poema de volta, escrevendo
no verso que o seu coração estava guardado para homem da terra e não para
pássaro do céu, quanto mais se entretinha com lagartixas e aranhas mais sua
mente desenhava uma teia. E nesta, ele mesmo estava grudado esperando a saída.
E procurava desgrudar-se daquele terrível abandono escrevendo mais versos nas
folhas achadas ao léu.
“Amor meu amor
onde estais
o que fazes
em meio às
flores
não sinto nas
outras
as mesmas
cores
senão destas
sinceros
ciúmes
por serem
flores
mas sem
possuir
teus doces
perfumes”.
Anos e anos
assim, e o homem poeta se tornando num velho poeta, e continuando tão
apaixonando ou mais, que já não se bastava no entristecimento, nas saudades,
lembranças e recordações, pois passou a de vez em quando lacrimejar com o
pensamento nas distâncias daquele ser tão distante.
E de repente,
de tanto escrever e soltar versos ao vento, um dia não encontrou mais uma folha
sequer. Quanto mais procurava mais encontrava apenas gravetos e garranchos,
pedras e espinhos. Então olhou ao redor, rabiscou na própria mão seu último
verso e disse que seria a folha sem vida perdida pelo ar. E se jogou lá de cima
com os versos soltos na mão aberta.
“Sozinho
homem também
passarinho
voando para o
seu túmulo
bem distante
do ninho
onde canta o
seu amor
janela sem ser
caminho”.
Sentada na
cama, folheando diários de um tempo outro, seu corpo sentiu calafrio ao
perceber uma folha seca, que trazida pelo vento, recostava no seu ombro. Apenas
juntou-a aos seus escritos e foi mirar o horizonte da janela. A feição
envelhecida da mulher sentiu-se molhar por uma lágrima fininha.
Poeta e
cronista
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