Por: Rangel Alves da Costa(*)
UM
HOMEM SÁBIO
Ensina Khalil
Gibran (1883-1931, nascido nas montanhas libanesas) que a simplicidade é o
último degrau da sabedoria. O que se pode ler, então, além das palavras do
grande sábio? Seria apenas uma afirmação abstrata, cujo significado pode ser
tudo e nada ao mesmo tempo? Ou a verdadeira pedra da sabedoria?
Creio que a
resposta dependerá daquilo que se tenha como simplicidade. E não somente isto,
mas também o que seja a simplicidade num sábio. Talvez somente assim se
obtivesse algo como desprendimento, renúncia às vaidades da vida, uma vida
imune às influências materialistas.
Compreendo tal
afirmação como uma síntese na vida daquele que alcança o conhecimento
e a elevação espiritual: depois de tudo alcançado ser apenas a brandura e a
humildade. No mesmo sentido, a singeleza do ser humano na sua ação de vida e no
modo de compreensão desta.
Assim, o
último degrau da sabedoria, ou seja, o estágio maior de elevação do
ser, só será alcançado quando, ao alcançar o nível instintivo da prudência e da
sensatez, o homem se situar no mundo como elemento próprio da natureza, e não
como agente que forja a modificação no seu percurso.
No contexto,
sendo a sabedoria o último estágio da razão humana, logo se depreende que todo
conhecimento adquirido só estará aperfeiçoado se o ser também se reconhecer
grande apenas nas suas virtudes. E tais virtudes refletem o modo de se conduzir
perante a realidade e a ação exemplar perante essa mesma realidade.
A sabedoria em
si possui muitos conceitos. É a capacidade humana para a ampla reflexão da
realidade, de si mesmo e do próximo; é o poder de compreensão das altas
indagações da vida; é a amplitude do conhecimento. É o conhecimento justo e
correto das coisas.
Mas também
sabedoria é entender a importância e o significado daquilo que dificilmente é
visto como da essencialidade da vida. Nisto a certeza de que a sabedoria
abrange também enxergar aquilo que aos outros é de pouca ou menor importância.
O verdadeiro
sábio não é aquele de grandes discursos, de conceitos sobre tudo, que procura
se impor através do nível de conhecimento alcançado. É, principalmente, aquele
da reflexão, da constante e silenciosa busca do conhecimento, do diálogo com a
natureza e com os seres existentes na vida. Ora, para o sábio, tudo possui
fundamental importância.
Tudo, pois,
assoma como importante aos olhos do sábio, mas, como diz Gibran, é através da
simplicidade que se expressa o mais alto grau da sabedoria. E ser simples, para
os fins do saber, é enxergar a realidade sem paixões, é apreciar a candura de
algo invisível a muitos, é ter a certeza da limitação do seu saber e do seu
conhecimento.
Certa feita,
um velho sábio foi surpreendido por seu discípulo ao ser indagado porque mirava
tanto aquelas folhas secas que eram levadas pela ventania do entardecer. E
ouviu como resposta: Não pense que enxergo apenas as folhas frágeis ou mortas
ao vento. Avisto muito mais a vida.
E prosseguiu:
Nas folhas sinto o outono, nesta estação as transformações, as fragilidades, a
perda das seivas da existência, a morte. E nada muito diferente da vida, onde o
vento é a existência e a folha pode ser vista como o próprio homem que um dia
perecerá. Daí que avistando a folha também compreendo esse percurso inevitável
do ser humano, da vida à morte.
Doutra feita,
dessa vez respondendo a um camponês que indagou por que insistia em escrever
por cima do véu das águas, vez que a correnteza tudo desfazia rapidamente, o
mesmo sábio respondeu: O mais difícil é saber quando vou terminar esse livro.
Tenho certeza que nunca, ainda que cada letra jamais seja apagada pelas águas.
E explicou:
Como as mesmas águas nunca retornam ao mesmo lugar, tudo aquilo que escrevi
estará gravado mais adiante. No entanto, o mais importante não é a certeza da
conservação do meu livro, mas a lição que cada um absorverá toda vez que tiver
sede de conhecimento. Ao beber desta água estará lendo o que aqui insisto em
escrever.
Tal sábio não
era Gibran. Mas bem que o poderia ter sido. Afinal de contas, poucos homens
conseguiram expressar tão bem a sabedoria humana. E com absoluta e profética
simplicidade.
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no
sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em
Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão
de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT,
cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em
"Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas
em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes";
contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e
outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã"
e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada
sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão -
Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do
Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor:
Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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