Por: Rangel Alves
da Costa(*)
NAMORADEIRA
Eis aqui o
proseado da menina namoradeira, brinquedo sem ser brincadeira, cantada em
cordel pela feira. De todas foi a melhor, de todas foi a primeira.
Dizem que
nasceu uma flor, menina com gosto e sabor, de beleza sem igual, admirada com
louvor. No corpo queimando ardor, em tudo maior esplendor.
Desde novinha
a danada seguiu sua própria estrada, não queria a boneca preferindo ser falada,
de namoradeira chamada, tão nova e desavergonhada.
Mas era bonita
demais, tudo que ao olhar satisfaz. Não tinha moço ou rapaz que dela não fosse
atrás, procurando um sorriso e desejando muito mais.
Botava flor no
cabelo, no vestir o maior zelo, e esse seu jeito de ser causava o maior
desmantelo. Arrepiava a pedra, fogo surgia do gelo. No corpo
espalhava loção, um cheiro doce de paixão. Caminhava pela rua perfumando
coração, no vento causando emoção e na moçada aflição.
Vestia roupa
de chita e ficava mais bonita, descalça saía a andar, numa mania esquisita. Mas
espinho não furava o pé da doce e meiga cabrita.
Tinha um
rebolado atraente, avivando em toda gente uma sensação que sente quando o fogo
é ardente. Não tinha um cristão sequer que não a achasse envolvente.
Menina tão
delicada, suave e perfumada, apenas de um deveria ser namorada. Mas nada disso
que nada, pois queria muito mais e com isso ser invejada.
Mas se dizia
de respeito, só namorava direito. Preservava o seu nome, dizia ter um conceito,
mas a rapaziada sabia que bastava dar um jeito.
Namorava um de
cada vez, porém uns cinco por mês. Dizia ter lucidez, agindo com polidez, sem
ninguém ver sua nudez.
Não se
importava se chamada de mocinha descarada, ou mesmo de quenga safada, não tendo
a injúria por nada. Gostava de namorar e seguia sua estrada.
Recebia
presente de moço inocente, versos de amor de donzelo carente, frasco de perfume
de um bocado de gente. Mas só escolhia um bem diferente, sem qualquer doação,
sem nada aparente.
Namorou com
quebrado e endinheirado, com gente de anel e com pé-rapado, com menino
astucioso e com despreparado, até com quem parecia ser afeminado.
O seu beijo
era famoso, por isso falavam num gosto gostoso, num lamber caridoso, num morder
mais tão saboroso. Um lábio delicioso e o resto calor fogoso.
Marcava com um
na janela, outro depois da cancela. Namorava no quintal e no fundo do hospital.
Marcava encontro no mato e nas águas do regato. Sumia na mataria e descabelada
aparecia.
Namorava até
demais, mas nenhum homem era capaz de alcançar muito mais. Quando ia pra
frente, ela ia pra trás. Até ficava nua, mas deitar jamais. Era isso que não
deixava nenhum moço em paz.
Dizia que o
namoro era pra divertimento, e se pegasse barriga começava o tormento, pois um
dia ainda queria o mais belo casamento. Casar de véu e grinalda, na igreja
fazer juramento.
Um dia
aconteceu o inesperado. Ela avistou um rapaz e o quis por namorado. Ao invés de
ir atrás, ele a olhou enviesado. Ela insistiu em querer, mas ele distanciado.
E de repente
ela se sentiu diferente, com o corpo todo quente, no peito paixão ardente.
Agora era ela que era terra sem semente, uma moça apaixonada e por alguém tão
reticente.
Prometeu com
mais ninguém namorar e fazer de tudo para ele lhe aceitar. Faria o que quisesse
para provar tanto amar, seria sua mulher, se deixaria aproveitar, mas naquele
sofrimento não poderia ficar.
Mas ele disse
não. A fama dela não tinha correção. Somente limpando a honra com cem anos de
solidão. E ela viveu sozinha amargando a aflição, até morrer bem velhinha com
uma flor murcha à mão.
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e cronista
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