terça-feira, 26 de março de 2013

HISTÓRIAS DA CASA VELHA (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)

HISTÓRIAS DA CASA VELHA

Uma casa simples, pobre e parecendo abandonada, de paredes velhas e já sem cor definida. Na frente, apenas uma porta e uma janela. Por dentro...

Parecia abandonada porque não havia certeza de algum morador. A porta e a janela abertas ou se abrindo, certamente indicaria a presença de alguém ali. Mas neste aspecto a dúvida continua.

De vez em quando a janela era avistada totalmente aberta. Noutras vezes apenas entreaberta. Mas passava dias e mais dias, até meses, completamente fechada. E de repente o ventania se fazia de abanador.

O mesmo se diga com relação à porta. Algum tempo era vista escancarada, para em seguida ser fechada de vez. Contudo, não era difícil avistá-la ao sabor da ventania, abrindo e fechando, tornando ainda mais misteriosa aquela situação.

De uma coisa havia certeza: quem entrasse ou saísse de lá jamais era percebido pelos que passavam adiante. Estranhamente ninguém se aproximava nem da porta nem da janela para bater ou lançar o olho ao interior para conhecer o que se passava ali.

Os moradores das redondezas tentavam explicar a situação da casa de diversas maneiras. Alguns diziam que ali sempre existiu morador, ainda que apenas uma ou duas pessoas, mas com gente vivendo lá dentro. E que talvez não gostasse de sair de casa.


Outros diziam que, quando muito, somente viajantes cansados ou desconhecidos de passagem pelo lugar, abriam aquela porta para o repouso e descanso. E por isso mesmo a porta e janela de vez em quando ficavam abertas.

Já outros davam pareceres extremos, estranhos, misteriosos. Tinha gente que jurava ter visto fantasma ali. Jurava por tudo na vida ter avistado lá dentro, nas noites de breu, uma mortalha levando uma vela acesa. Já outro dizia ter ouvido lamentos, gemidos de dor, sussurros lancinantes.

Teve um que afirmou ter avistado, nas noites de lua cheia, uma bela mulher à janela. Acenava para que se aproximasse, mas quem cometesse o erro de seguir até lá encontraria uma bruxa terrível. Por conversas desse tipo é que as pessoas evitavam passar diante da casa depois da noite fechada.

Mas pouco disso era verdade. Ao menos era o que assegurava o mais velho morador da região. Homem com quase noventa anos, tido e reconhecido pela sabedoria dos tempos e seriedade no trato das coisas da existência, dizia a verdade a quem quisesse ouvir.

O problema é que poucos acreditavam, poucos queriam ouvi-lo, e sempre com a desculpa de que o mesmo já não dizia coisas com coisa. Estava completamente gagá, era o que afirmavam. Mas nem todos agiam assim, pois alguns viam nas suas palavras tudo de mais verdadeiro que pudesse existir.

Segundo o velho senhor, diferentemente do que diziam e pensavam, nada de anormal existia naquela casa. Há muito tempo que vivia completamente abandonada, desde que a última família saiu do lugar fugindo da seca impiedosa. E ao ir embora fechou porta e janela, deixou tudo trancado, na esperança de logo voltar.

Só que o tempo foi passando e nada da vida melhorar pra família. E desse modo, jamais qualquer um conseguiu retornar para reabrir as portas do lar. Por consequência, a casa ficou sendo entregue à sorte do tempo. Daí ficar maltratada, abandonada, como moradia de qualquer um que chegasse e quisesse entrar.

Por isso que a porta e a janela ora estavam fechadas ora abertas. E não somente viajantes procuravam repouso ali, mas também animais da redondeza. Geralmente ao cair da noite um ou outro buscava ali um abrigo até o amanhecer.

Mas a moça na janela era verdade. Afirmava o velho. E era a alma de uma donzela que morreu ali mesmo na janela enlouquecida e esperando o seu grande amor chegar montado num cavalo de nuvem estrelada.

Toda noite ela ressurge do desconhecido, abre a janela e se põe a esperar seu amado. Mas só consegue avistá-la quem ela achar parecido com seu cavaleiro do infinito. E acena para que se aproxime e sinta o quanto o amor não correspondido maltrata, envelhece, torna a pessoa num verdadeiro fantasma.

(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.


Poeta e cronista
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