(*) JOSÉ
ROMERO ARAÚJO CARDOSO

Resgatar a história do semi-árido nordestino através de coleções de peças e equipamentos que expressaram a produção econômica e a vida social em épocas pretéritas é o mesmo que buscar a nostalgia dos caminhos das boiadas, as veredas dos velhos tangerinos de outrora e o romantismo bucólico de um sertão gradativamente pulverizado pelos ecos da modernidade que nos faz em esquecer as raízes de nossa identidade.
A fazenda Rancho Verde começou a ser estruturada no início da década de 90 do
século passado, quando o prof. Benedito Vasconcelos Mendes adquiriu terra na
estrada da Alagoinha, município de Mossoró-RN.
Além de razões particulares,
constava entre os objetivos do grande sábio do semi-árido adequar sua
propriedade à pesquisa de melhoria genética de animais domésticos nativos e
exóticos que pudesse auxiliar o homem sertanejo na difícil luta pela
sobrevivência numa região castigada pelas secas, cujas características
edafoclimáticas a singularizam.
Colecionando utensílios diversos e equipamentos que eram utilizados nas
principais atividades econômicas do semi-árido, logo o acervo que o prof.
Benedito Vasconcelos Mendes acumulou na Rancho Verde não deixou margem a
nenhuma dúvida quanto à necessidade de se criar infra-estrutura necessária para
que um museu fosse implementado urgentemente.
A inauguração será concomitante ao lançamento do livro Reflexões sobre o
Nordeste, de autoria do prof. Benedito Vasconcelos Mendes, quadrimilésimo
título da Coleção Mossoroense da Fundação Vingt-un Rosado.
Centenárias relíquias estavam espalhadas por todos os cantos, testemunhando
como vivia e conseguia o sustento o homem nordestino em tempos imemoriais, as
quais de fato são marcas indeléveis da produção da vida material de um povo
forte.
O museu do sertão da fazenda Rancho Verde está divido em oito setores que
compreendem a casa de cera, a casa de farinha, o engenho de rapadura, o
alambique de cachaça, a queijaria, a cocheira, a bodega e os utensílios
domésticos.
No primeiro setor pode-se deslumbrar o local onde os sertanejos preparavam a
cera extraída das folhas da carnaubeira. O destaque é para uma mais que secular
prensa de vara “seu” Damásio, adquirida na região do Jaguaribe (Estado do
Ceará).
A cera de carnaúba teve destacada importância econômica nos vales secos
dos Estados do Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte em boa parte dos séculos XIX
e XX.
O segundo setor se tratava de uma oficina encontrada praticamente em todo o
semi-árido nordestino, destinada à fabricação de goma e farinha de mandioca.
Armazenar farinha, rapadura e queijo era condição imprescindível para
sobreviver às secas, principalmente entre as famílias abastadas.
O tamanho dos
caixotes de armazenamento demonstrava o grau de opulência dos proprietários
sertanejos. Momentos distintos da evolução da produção desses gêneros estão bem
representados no museu da fazenda Rancho Verde, quando a tração humana foi
substituída pela animal e depois pela força mecânica.
O terceiro setor teve maior quantidade de estabelecimentos nas serras úmidas e
nas várzeas dos rios intermitentes do Nordeste seco. Os engenhos produziam
artesanalmente alfenins, batidas e rapaduras. As moendas eram de madeira e
depois foram substituídas pelas de ferro.
No quarto setor encontramos a fábrica rústica de aguardente, também encontrada
em profusão no mesmo espaço dominado pelos engenhos de rapadura. Há
identificação em diversos processos, à exceção da fermentação do caldo visando
obter o produto final.
O quinto setor é onde se preparava o queijo, sendo o de coalho o mais difundido
no nordeste. Neste processo o abomaso bovino tinha papel fundamental,
substituído hoje por fermento industrial.
No sexto setor encontramos a cocheira, onde charretes, carros-de-boi, carroças,
apetrechos de montaria, etc., eram guardados depois da labuta diária.
Nesta
parte há destaque para o gibão como principal apetrecho da montaria do
vaqueiro. Em razão de a caatinga ser muito espinhenta, o uso desse acessório
diferencia o homem que lida com o gado no semi-árido nordestino do que faz o
mesmo trabalho em outras regiões brasileiras.
O sétimo setor corresponde à bodega, difundida em todas as cidades da região.
Trata-se de um pequeno armazém de secos e molhados onde se vende de tudo um
pouco, incluindo remédios alopáticos e os da farmacopéia caseira sempre
requisitada por todas as classes sociais.
O último setor abrange os utensílios domésticos que enriqueceram a cultura
popular e que se transformaram em verdadeiras obras de arte que resistem ao
tempo. São peças que reforçam a afirmação de Capistrano de Abreu que fizemos a
civilização do couro.
Encontramos
ainda panelas de barro, lamparinas de folhas de Flandres, gamelas, objetos
feitos com frutos de árvores nativas, etc. O fascínio do prof.
Benedito Vasconcelos Mendes com as coisas do semi-árido nos
concedeu um espaço privilegiado onde o respeito à nossa cultura é observado em
todos os detalhes, preservando-se nosso passado recente com o intuito de que
gerações presentes e futuras saibam como as pessoas de outrora viviam e
produziam suas riquezas.
(*) Professor-adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e
Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista
em Geografia e Gestão Territorial (UFPB) e em Organização de Arquivos (III
CEOARQ - UFPB). Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UERN).
E-mail: romero.cardoso@gmail.com.
Enviado pelo autor do texto
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