quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

DEPOIS DA CURVA DA ESTRADA (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

DEPOIS DA CURVA DA ESTRADA

Se estrada significa caminho, direção, partida, sua curva – ainda que apenas uma – possui uma significação muito maior, mais instigante e misteriosa.

Quando a pessoa fala em abrir cancela, pegar a estrada e seguir adiante, diz apenas da viagem, mas não do que poderá avistar ou encontrar no meio do percurso. E sempre haverá muito mais além de pedras no meio do caminho.

Como geralmente todo caminho não é em linha reta, de modo que da cancela se possa avistar a trilha até ir afinando e sumir, possuindo mudanças de direção mais adiante, daí é que surge a importância de suas curvas, da curva da estrada. Sinuosidades no passo, recurvas da existência.


Toda curva de estrada desperta profundo mistério no viajante. Existe, está adiante, será preciso segui-la, mas nem todos sabem o que podem encontrar. Mas não apenas isto, pois, a um só tempo, é também poesia, tristeza, mágoa, decisão, saudade, medo, temor, coragem, determinação.
Que bom se bastasse colocar o pé na estrada e seguir trilhando destino. Vai caminhando, reconhecendo tudo ao redor, mas logo fica pensativo quando avista a primeira curva. O que haverá depois dela?

A estrada é áspera, dura, empoeirada, de terra quente, cheia de pedras e espinhos, nada fácil de caminhar. Mas adiante, depois da curva da estrada, talvez os olhos não acreditem, mas logo avistarão flores do campo crescendo ao lado de gramíneas verdejantes.

Pela estrada, a paisagem é triste, cinzenta, seca, com mataria retorcida e galhos se quebrando ao sabor do sol e do vento. As folhas secas voam longe, a poeira turva o olhar. Não sabe que depois da curva da estrada, como se estivesse noutro lugar, logo passa a sentir a força da natureza, o canto dos pássaros, a brisa amena.

Saiu de casa entristecido, com lágrimas derramadas, o coração querendo despedaçar. Nunca havia partido, saído de casa para viagem longa, até mesmo sem saber quando vai voltar. Tudo é dor, aflição, uma vontade danada de retornar. Até que vira a curva da estrada e começa a sentir que a vida é feita de desafios, que tem de ser forte para seguir adiante. Enxuga os olhos e suspira. Ouve uma melodia chegando no vento.

Sempre temeu partir um dia, viajar, arriscar a vida noutro lugar. Fez a mala forçadamente, se despediu da família sem coragem de olhar nos olhos de ninguém. Abriu a cancela sem olhar para os lenços acenando atrás. Caminhava distante de si mesmo e de tudo, nem parecia que tinha de pensar no que fazer adiante. Virou a curva da estrada sem perceber, mas só até avistar um passarinho fazendo sua casinha de barro num pé de pau. Tanto queria assim, tanto queria construir um lar. Então mirou adiante e apressou o passo em busca de seu objetivo na vida.

A mãe dizia que a menina tivesse cuidando enquanto brincasse lá fora, que prestasse muita atenção para não ir além da curva da estrada. Mas a menina sequer já havia chegado à curva do caminho. Até que um dia, lembrando os conselhos mas com a intenção de descumpri-los, correu mais longe e de repente já estava além do lugar. Caminho cheio de pedras; caiu e se machucou. Voltou chorando e arrependida. Ouviu da mãe que ainda estava muito novinha e despreparada para ir além da curva de qualquer estrada.


O cachorro correu e virou na curva da estrada. O menino ia correndo atrás quando o pai gritou que esperasse o cachorro retornar para saber o que havia ali adiante. Acaso não voltasse assustado, então podia seguir até lá. E depois falou sobre os seus temores: a estrada é conhecida, a curva é logo ali, mas o desconhecido se esconde ou espera em qualquer lugar.

Quais lições, então, surgem desses encontros e confrontos com as estradas e suas curvas? Muitas, todas. Como nem conhecemos bem a estrada em que caminhamos, assentamos nossos pés e temos de seguir, melhor será sempre temer o que está além, adiante. Espere sempre encontrar um jardim. E tente avistar a flor em meio aos labirintos.

(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.  

Poeta e cronista
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