Por: Rangel Alves da Costa(*)
NOMES E
SOBRENOMES
Para tudo na
vida há uma designação, uma referência pela qual é conhecido. Nada é apontado
ou avistado, já se tendo conhecimento do que se trata, sem que logo surja à
mente sua denominação. Eis a força do nome das coisas e dos seres.
Gramaticalmente,
nome é a palavra ou conjunto de palavras que designam pessoa, coisa ou conceito
abstrato; identifica genericamente um exemplar ou indivíduo. O nome, pois,
serve para nomear, fazer conhecer, indicar.
No ser humano,
o nome é completado com sobrenome. Neste contexto, o nome será o prenome e o
sobrenome são os apelidos familiares acrescentados ao nome. Por outras
palavras, são os nomes acrescentados ao do batismo. Assim, João, por nome, dos
Santos por sobrenome. E dos Santos é a referência à família da qual João faz
parte.
Contudo, os
nomes e sobrenomes possuem ainda outras utilidades. Podem ser utilizados como
metáforas, produzindo outros modos de referência aos seres ou coisas; ou
ocasionalmente, como forma de proporcionar uma conotação poética aos mesmos
seres e objetos.
Assim, o nome
de alguém pode ser Maria, tendo por sobrenome da Imaculada Anunciação. Mas o
enamorado, rapazinho que anda apaixonado, pode achar muita mesmice em chamá-la
minha Maria, doce Maria ou bela Maria. Daí que poderá, a um só tempo, lançar
mão de outro nome e sobrenome, e simplesmente a chamaria a flor anunciada ao
meu coração.
Um jovem bem
vistoso aos olhos da mocinha, e cujo nome, por razões secretas, ela não quer
revelar, de repente pode ser transformado em algo aparentemente insuspeito para
os demais, mas para ela com profunda significação. Ao avistá-lo logo lhe vem à
mente o pássaro encantado que povoa os seus sonhos. O nome dele é Antonio,
tendo Silva dos Santos como sobrenome, mas nada disso interessa. Basta ser
reconhecido como o pássaro encantador de sonhos.
Especialmente
algumas pessoas, dado aos vínculos que possuem com os renomeados, se utilizam
da transformação do nome num significado maior e o sobrenome numa extensão
explicativa dessa significação. Mãe, por exemplo, adora inventar nomes e
sobrenomes para os pequeninos. O mesmo ocorre com casais apaixonados, que no pensamento
ou nas juras de amor nunca citam as reais identificações.
Mãe gosta de
chamar o filhinho de tudo que seja doce, agradável, mimoso, menos do próprio
nome. Rafael se torna meu raio de sol, João se transforma meu anjinho, Bruna
passa a ser meu favo de mel, de repente Ana se torna minha princesinha. E por
sobrenome vão acrescentando raio de sol do meu dia, anjinho de minha vida, favo
de mel da mamãe flor, princesinha mais linda do mundo.
Na paixão não
é diferente. Os enamorados, sempre envoltos em juras e promessas eternas,
utilizam-se do artifício da renomeação para cimentar ainda mais os sentimentos
tão encantadores. Daí que é meu botãozinho de rosa pra cá, meu nobre cavaleiro
pra lá; ora a razão de minha vida, ora meu ser em completa perfeição. E nunca
citam os nomes próprios. Também não precisaria. O amor tem esse dom de
transformar a dura realidade em jardim, os problemas em momentâneas soluções.
Chamo a pedra
de amiga sabedoria; designo por magia da existência a chuva que cai na
madrugada e que me faz mais reflexivo sobre a vida; nomeio de existência de
Deus o alto da montanha e o que se descortina ao redor; não consigo chamar
senão graça divina o poder compartilhar a prece da natureza ao entardecer.
A tanta coisa dou outro nome, tanto ser me permito chamar diferente, sempre
expressando a ternura sob o véu.
Por isso não
se incomode se prefiro preservar o seu nome e chamar diferente. Ao avistar quem
admiro logo esqueço as identificações documentais. Tantas vezes nem penso em
renomear. O coração se toma de tamanha felicidade que tudo se torna mais
intenso e significativo que qualquer nome com sobrenome.
(*) Meu nome é
Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no
município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito
na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também
História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou
autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e
"Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas
Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em
"Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros
contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e
"Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada
sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão -
Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do
Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor:
Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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