segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

NOMES E SOBRENOMES (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

NOMES E SOBRENOMES 

Para tudo na vida há uma designação, uma referência pela qual é conhecido. Nada é apontado ou avistado, já se tendo conhecimento do que se trata, sem que logo surja à mente sua denominação. Eis a força do nome das coisas e dos seres.

Gramaticalmente, nome é a palavra ou conjunto de palavras que designam pessoa, coisa ou conceito abstrato; identifica genericamente um exemplar ou indivíduo. O nome, pois, serve para nomear, fazer conhecer, indicar.

No ser humano, o nome é completado com sobrenome. Neste contexto, o nome será o prenome e o sobrenome são os apelidos familiares acrescentados ao nome. Por outras palavras, são os nomes acrescentados ao do batismo. Assim, João, por nome, dos Santos por sobrenome. E dos Santos é a referência à família da qual João faz parte.

Contudo, os nomes e sobrenomes possuem ainda outras utilidades. Podem ser utilizados como metáforas, produzindo outros modos de referência aos seres ou coisas; ou ocasionalmente, como forma de proporcionar uma conotação poética aos mesmos seres e objetos.

Assim, o nome de alguém pode ser Maria, tendo por sobrenome da Imaculada Anunciação. Mas o enamorado, rapazinho que anda apaixonado, pode achar muita mesmice em chamá-la minha Maria, doce Maria ou bela Maria. Daí que poderá, a um só tempo, lançar mão de outro nome e sobrenome, e simplesmente a chamaria a flor anunciada ao meu coração.

Um jovem bem vistoso aos olhos da mocinha, e cujo nome, por razões secretas, ela não quer revelar, de repente pode ser transformado em algo aparentemente insuspeito para os demais, mas para ela com profunda significação. Ao avistá-lo logo lhe vem à mente o pássaro encantado que povoa os seus sonhos. O nome dele é Antonio, tendo Silva dos Santos como sobrenome, mas nada disso interessa. Basta ser reconhecido como o pássaro encantador de sonhos.


Especialmente algumas pessoas, dado aos vínculos que possuem com os renomeados, se utilizam da transformação do nome num significado maior e o sobrenome numa extensão explicativa dessa significação. Mãe, por exemplo, adora inventar nomes e sobrenomes para os pequeninos. O mesmo ocorre com casais apaixonados, que no pensamento ou nas juras de amor nunca citam as reais identificações.

Mãe gosta de chamar o filhinho de tudo que seja doce, agradável, mimoso, menos do próprio nome. Rafael se torna meu raio de sol, João se transforma meu anjinho, Bruna passa a ser meu favo de mel, de repente Ana se torna minha princesinha. E por sobrenome vão acrescentando raio de sol do meu dia, anjinho de minha vida, favo de mel da mamãe flor, princesinha mais linda do mundo.

Na paixão não é diferente. Os enamorados, sempre envoltos em juras e promessas eternas, utilizam-se do artifício da renomeação para cimentar ainda mais os sentimentos tão encantadores. Daí que é meu botãozinho de rosa pra cá, meu nobre cavaleiro pra lá; ora a razão de minha vida, ora meu ser em completa perfeição. E nunca citam os nomes próprios. Também não precisaria. O amor tem esse dom de transformar a dura realidade em jardim, os problemas em momentâneas soluções.

Chamo a pedra de amiga sabedoria; designo por magia da existência a chuva que cai na madrugada e que me faz mais reflexivo sobre a vida; nomeio de existência de Deus o alto da montanha e o que se descortina ao redor; não consigo chamar senão graça divina o poder compartilhar a prece da natureza ao entardecer. A tanta coisa dou outro nome, tanto ser me permito chamar diferente, sempre expressando a ternura sob o véu.

Por isso não se incomode se prefiro preservar o seu nome e chamar diferente. Ao avistar quem admiro logo esqueço as identificações documentais. Tantas vezes nem penso em renomear. O coração se toma de tamanha felicidade que tudo se torna mais intenso e significativo que qualquer nome com sobrenome.

(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.

Poeta e cronista
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