Por: Rangel Alves da Costa(*)
HISTÓRIA
PARECIDA COM A SUA
Moravam
próximos um ao outro. Ela na rua que dá pra lá, e ele na rua que dá pra cá.
Meninotes,
crianças, se encontravam sempre nos momentos das brincadeiras. Ela brincando de
roda, ele interessado em chutar bola de meia.
Um dia se
olharam de um jeito diferente. Ela, pela primeira vez, achou o amigo bonito
demais. Ele comparou a amiguinha a uma flor.
Evitavam-se
olhar, se encontrar e conversar porque os corações apertavam assim que se
avistavam. Ela se envergonhava toda ao pensar em namoro, enquanto ele não
pensava noutra coisa.
Um dia ela
avermelhou quando recebeu um pirulito de presente. Ele queria dar uma maçã de
amor, mas não tinha dinheiro naquele dia. E junto com o doce foi um papelzinho
dizendo: Você é linda.
No outro dia
ela avermelhou novamente. Ele perguntou se havia gostado do pirulito e em
seguida ofereceu uma flor. De cabeça baixa, nervosamente ela aceitou e quase
saiu correndo. Apenas disse obrigado e partiu. Mas olhou para trás.
Ao perceber
aquele olhar encantador, ele se encheu de esperança de tal forma que começou a
pular sozinho, a sorrir com todas as bocas, a se sentir tão perto de namorar. E
seria a primeira namoradinha, o primeiro amor.
Quando ele
soprou um beijo em sua direção, a menina não dormiu a noite inteira. Teve
febre, uma doencinha de amor. E pensou como deveria ser bom tocar o seu lábio
no dele, bem levemente, como se fosse uma brisa.
Ela queria
assim, mas ele foi guloso demais e deu um beijo de gente grande. Ficou mais de
cinco segundos com o lábio colado no dela. Ela achou bom, mas depois
simplesmente baixou a cabeça.
Só levantou
quando ele perguntou se ela era sua namorada. E também não respondeu, apenas se
danou a correr até parar adiante. E olhou pra trás. De lá jogou um beijinho
com a mão e depois gritou: Sim!
Namoravam
escondidos porque ela tinha medo que os seus pais soubessem e lhe dessem uma
surra. Mas um dia, mais de ano depois, ela colocou a mão junto à dele,
segurando firme, e assim saíram caminhando até a pracinha.
O primeiro
amor dos dois, assim continuaram após a adolescência e chegar a idade adulta.
Na juventude fizeram as promessas que cumpririam mais tarde, acaso o destino
permitisse que continuassem apaixonados.
Um dia,
acompanhado do pai, ele seguiu até a casa da família dela e pediu a mão da
mocinha em compromisso. Concedida, prometeu que não demoraria muito para
anunciar o noivado, se assim fosse do gosto de todos.
Casaram numa
manhã de sábado, na igrejinha toda enfeitada de flores do campo. Ao sair da
igreja o tempo estava nublado, nuvens negras encobrindo o céu, prenúncio de
tempestade. E logo começou a chover.
Ao lado dele,
durante todos aqueles anos de namoro, jamais ela havia se entristecido. Mas
após o casamento veio a tempestade. E ela chorou. Pela primeira vez ela chorou.
O sal da vida
é tempero que não falta em nada. Ninguém vive tão docemente que não necessite
de uma pitada desse sal. Aquilo que ele aceitava nela, agora não aceitava mais.
E o mesmo se diga com relação a ela.
Mas as pedras
de sal se dissiparam no convívio. Pois a prova do amargor trouxe a compreensão
de que até os espinhos têm flores e as pedras no meio do caminho servem para
ensinar a andar.
E os sorrisos
tomaram as feições das tristezas; e a solidão a dois foi cortada pelos filhos
que foram chegando. E a vida passando, o calendário envelhecendo a idade. Até
que um dia...
Um dia ela
pediu um beijo igualzinho aquele primeiro que era pra ser tão apressado. Ele
perguntou por que. Então ela respondeu que no tempo que lhes restava tudo teria
de ser tão apressado.
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São
Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e
advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos.
Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a
concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das
Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em
"Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes";
contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e
outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia
Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel -
prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no
Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio
do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do
autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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