Por: Rangel Alves da Costa(*)
E
ERAM TÃO JOVENS...
Vida cheia de
vida, vida cheia de esperança, vida de planos e grandes perspectivas, vidas na
flor da idade. E eram tão jovens...
Em meio à
madrugada, talvez por um descuido terrível ou porque predestinado a assim mesmo
acontecer, eis que a fagulha acende a chama. Um sinalizador de palco. E daí o
incêndio, o pavor...
Vidas que
estavam ali para brincar, comemorar entre amigos, reencontrar colegas, brindar
as alegrias da vida universitária e todas as alegrias, pois na maioria
estudantes. E eram tão jovens...
Nunca há
espaço seguro, com rota de fuga, com facilidade de escape, quando o terror se
alastra, a correria começa, cada um pensando somente em fugir e todos na mesma
aflição. Tudo é difícil der transposto. Assim aconteceu.
Certamente que
estavam acostumados a diversões em boates, casas de shows, espaços tão
propícios aos jovens. E ali seria apenas mais uma noitada agradável. Apenas
seria. E eram tão jovens...
Com o fogo se
alastrando, os gritos ecoando, o espanto e o terror tomando conta de tudo, os
mais frágeis, as meninas de salto alto e os que iam tropeçando, simplesmente
caíam para em seguida serem pisoteados. Alguns se arrastaram para morrer
adiante.
Muitos colegas
de curso, amigos de universidade, conhecidos no convívio cotidiano da vida
estudantil. Outros conhecidos destes e amigos daqueles, e todos ali sorridentes
sob as luzes flamejantes do imenso salão. E eram tão jovens...
Aqueles que
caíram dificilmente conseguiram se levantar; os que correram para os banheiros
ou por lá já estavam não tiveram melhor sorte. Quando a fumaça fortemente se
espalhou, aqueles que ali estavam foram sendo terrivelmente asfixiados.
Jovens casais
participavam do evento, namorados tiveram de apartar suas mãos para nunca mais
se reencontrarem. E somente o irromper da tragédia, da crueldade indescritível,
para que um namorado solte a mão de seu amor. E eram tão jovens...
O fogo em si
não provocou tantas mortes, mas a fumaça asfixiante sim, as pessoas agonizando
pelos banheiros sim, os jovens pisoteados e desfigurados sim, o verdadeiro
tropel em desesperada busca de fuga e salvação sim. E eram tão jovens...
A mocinha não
havia avisado à família que participaria da festa. Somente depois das onze da
noite chamou os seus para ajudar na escolha da roupa. Uma saia verde e uma
blusa branca. Estava linda. Seu nome: Leandra Toniolo, de 23 anos. Uma das
vítimas. E eram tão jovens...
O noticiário
dá conta que a tragédia seria menor se a arrogância e a brutalidade dos
seguranças da boate não impedissem a fuga dos jovens em desespero. Impediram
que buscassem as saídas para evitar prejuízos com o não pagamento da comanda.
Cobravam as vidas.
Muitos que ali
estavam e foram vitimados, certamente retornariam na semana para repor aulas na
universidade. As listas de presença estarão fechadas e em profundo silêncio. Os
professores olharão sem ainda acreditar para as cadeiras vazias, os colegas
estarão olhando em direção à porta para ver se o amigo chega. E eram tão
jovens...
Um rapazinho
viajou de lugar distante para reencontrar sua namorada, estudante universitária.
Passariam o final de semana juntos, mas na noite do sábado participariam da
festa. Ele, Roger Dall'Agnol, de 21, e ela, Susiele Cassol, de 19
anos, não conseguiram sair do incêndio com vida nem planejar o futuro a dois.
Enquanto os
corpos amontoavam-se pelos banheiros e salões, os celulares das vítimas, ainda
junto com elas, tocavam incessantemente. Eram as famílias desesperadas que
apenas queriam ouvir uma voz do outro lado dizendo que estava salva, estava
bem, estava vivo. Mas os telefones tocavam, tocavam e tocavam. Ninguém atendia.
E eram tão jovens...
O noticiário
televisivo e os sites de notícias mostram a terrível e aflitiva situação das
famílias que perderam seus meninos. Olhos assombrados, feições pasmas, gestos
desesperados. E ainda não haviam feito o reconhecimento dos seus. E depois a
dor e o sofrimento em toda a sua intensidade.
Quase duzentos
e quarenta mortos e tantos outros ainda espalhados pelos hospitais em
tratamento. Não só uma tragédia, um terrível sinistro ou demasiadamente funesto
acontecimento, mas um mundo que de repente se acaba. E assim, de modo tão
brutal e incompreensível à crença humana.
Tudo dói. Dói
demais, porque tantas vidas ainda em construção. E eram tão jovens...
(*) Meu nome é
Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no
município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito
na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também
História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou
autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e
"Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas
Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em
"Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros
contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e
"Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada
sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão -
Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do
Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor:
Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e
cronista
http://blograngel-sertao.blogspot.com
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