Por: Rangel Alves da Costa(*)
NUDEZ
Todo mundo
nasceu nu, porém a nudez se torna tabu, afronta social e até crime. Atentado
violento ao pudor, ação obscena. Todo mundo nasceu nu e assim permanece por
alguns anos sem que tal fato ofenda a ninguém, mas em seguida tem de usar
vestimenta exatamente para não ofender.
Todo mundo
nasceu nu, e primeiro a fralda e depois a roupinha para não afrontar com a
nudez e ficar adequado ao consenso social do vestir. Todo mundo nasceu nu e
assim permaneceria se algumas pessoas não sentissem vergonha do próprio corpo.
E porque estas se escondem em panos, os outros não podem continuar como
desejam.

A Bíblia, no
Gênesis, fala na nudez, mas não como o pecado que se apregoa. Primeiro diz que
Adão e Eva estavam nus e não se envergonhavam; depois, após cometerem o pecado,
viram a nudez de modo vergonhoso e procuraram se encobrir com folhas de
figueira. Contudo, a vergonha não foi pela nudez das partes íntimas, mas pela
fraqueza do corpo caído em tentação.
Daí ser
correto afirmar que a nudez em si não é nem pecado nem vergonhoso. O que
transgride, afronta princípios, condena moral e socialmente, é o tipo de
destinação que se dá à nudez ou o objetivo que se tem ao andar nu. O nu pelo nu
nada mais é que o homem em seu estado original, muito diferente do despir
simplesmente para utilizar acintosamente das faculdades do corpo.
Urge, pois,
desnudar a nudez para compreendê-la. De modo geral, tem-se a nudez como o
estado do corpo nu, a ausência de roupa por cima de uma pessoa, o corpo sem
ornamentos ou peças que cubram suas partes. Por consequência, nu é o não
vestido, o despido, o pelado, sem qualquer vestimenta, aquele que está como
veio ao mundo.
A criança nua
é paparicada, mexida, remexida, beijada, cheirada, adorada, para mais tarde ser
mandada vestir a roupa sob pena de umas palmadas. E quando cresce mais nem se
fala, pois parece que a decência e a honradez humana se resumem ao seu
comportamento no vestir. Daí em diante a nudez é quase pecado, fim de mundo,
coisa de desavergonhado.
Sem nada que
justifique, pois o nu tanto faz o braço, a perna como a bunda, pois num só
corpo e parte dele, mas elevam a nudez à categoria dos exageros, dos absurdos.
Acham belo e poético a pintura representando o nu. E logo justificam a nudez
artística, a criatividade do artista, a expressão corporal ali tão bem
retratada. Mas coitada da modelo ou musa, que só pelo fato de ter ficado nua já
será vista com outros olhos.
Vestido abaixo
do joelho; por debaixo da roupa tem de haver ainda a calcinha ou a cueca;
sentar e mostrar a calcinha é coisa de rapariga; andar com roupa curta demais é
coisa de mulher quenga. Ainda hoje são encontradas situações desse tipo, e não
apenas nos interiores mais distantes. E não será inverdade afirmar que ainda
existem aquelas que cumprem seus deveres sexuais tanto cobertas em lençóis como
em roupas folgadas. Tudo para não pecar. Neste caso, o pecado não é o sexo, e
sim a nudez.
Por que a
nudez do outro é tão instigada, desejada, imaginada, bisbilhotada, enquanto a
própria nudez é tão preservada e até proibida na maioria das situações? Por que
a nudez se veste para provocar a mesma nudez? Por que a nudez imaginária de
outra pessoa tem o dom de instigar a imaginação de tal modo que se tem mais da
pessoa do que em estado de nudez?
Diante das
inúmeras indagações que poderiam surgir, basta citar mais uma, e talvez
conclusiva: Por que o nu é tão proibido se o homem é essencialmente um ser
nudo? Ora, se um homem nascesse predestinado aos panos, as vestimentas não
seriam uma convenção social para ser considerada somente a partir de certa
idade.

Emerge uma
última questão: O que é nudez, afinal, é o ficar sem roupas ou manter-se,
diante de todos, na pele do nascimento? Fica nu apenas aquele que tira a roupa?
Neste último sentido, toda questão da nudez se volta apenas para o vestir, para
a não transgressão da convenção social, para o não mostrar as partes íntimas.
Creio que o
senso moralista que firmou o vestir como regra e a nudez como exceção – quando
deveria ser precisamente o contrário -, procurou não preservar o corpo humano
das vistas dos outros, mas apenas e tão-somente esconder aquilo que seria
absurdo que a pessoa deixasse à mostra: os órgãos genitais, o sexo, as
vergonhas, as partes baixas. Talvez porque achem que não façam parte do corpo,
mas daquele paraíso tentador e pecaminoso.
Mas nada
impede que os olhos avistem a nudez no corpo que bem entender, ainda que
vestido em roupa de aço. Já que imaginar não é proibido, então a nudez está em
todo lugar, principalmente naquela que passa faceira e pedindo que a olhem como
se estivesse sem roupa. Faz diferença?
(*) Meu nome é
Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no
município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito
na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também
História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou
autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e
"Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas
Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em
"Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros
contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e
"Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada
sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão -
Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do
Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor:
Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e
cronista
e-mail:
rac3478@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
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