Por Rangel Alves
da Costa*
O sol possui
extensa simbologia. É renascimento e transformação, é fortalecimento espiritual
e aquecimento da alma, é iluminação e conquista. Todo mundo quer encontrar o
sol e tê-lo como premissa maior da liberdade e da existência.
Igual a todas
as pessoas, Solange também queria um sol. Necessitava de sua luz para
reaprender a viver, para conquistar a liberdade do coração, para poder abrir a
janela e de braços abertos cantar a alegria da vida.
Lindo, imenso
e radiante, era o sol de Solange. Ao menos no desejo e na imaginação, pois de
outra forma jamais era avistado o tão esperado clarão do dia.
Solange queria
um sol, mas nunca resplandecia o sol de Solange. Por quê? Ao invés de se manter
de olhos abertos, límpidos e sorridentes, ela só olhava pra cima com olhos
nublados.
Tentando
avistar o sol de olhos nublados, chorosos, lacrimejantes, ao invés de encontrar
o azul iluminado sempre se deparava com horizontes escurecidos, espaços
nublados e instantes tempestuosos.
O sol de
Solange vivia entre nuvens, ainda que brilhoso e festeiro lá em cima. O sol de
Solange vivia escurecido, ainda que mais afogueado que labareda. O sol de
Solange vivia na penumbra eterna, ainda que alimentando a vida com sua luz.
Não havia
muita diferença entre a noite de negrume fechado e o sol de Solange. O céu sem
noite de lua ou o dia sem brilho de sol era tudo igual. Solange só não fazia
chover porque já avistava o mundo envolto em tempestades.
Que terrível
situação a de Solange, pois querendo avistar o sol e jamais conseguindo. Não
tinha problemas de visão nem qualquer outra enfermidade que a impedisse de se
manter com olhos bem abertos. Mas sua angústia a tudo embaçava.
Não só
angústia como uma enxurrada de sofrimentos. Lacrimejantes, os olhos mais
pareciam janelas gotejadas de pingos de chuva. Encharcados de lembranças e
recordações, desejos e impossibilidades, os olhos se transformava num véu de
desesperança. E não havia sol que pudesse ser avistado.
Quantas
pessoas existem como Solange? Quantos seres simplesmente não conseguem fruir do
brilho resplandecente do sol? Quantos olhos continuam avistando nuvens
escurecidas e tempos nebulosos em plena luz do dia? Quantas pessoas desejam
avistar o mesmo sol de Solange?
O sol de
Solange e o sol de muitos, sempre escondido. O sol de Solange e a
impossibilidade de tantos de reencontrá-lo a cada amanhecer. O sol de Solange e
a borrasca tempestuosa impedindo de avistar além das tormentas da alma.
Jamais
avistará a grandeza do sol o olhar que já mira o alto tomado de sombras. Jamais
encontrará os raios do sol o olhar que nada avista além da escurecida paisagem
da angústia e da aflição. Jamais enxergará a beleza da manhã, do dia e do
entardecer, o olhar que nunca sai das sombras escurecidas.
Quem abre uma
janela para o entristecimento não encontra qualquer ânimo para o encantamento
com a luz do dia. Quem se debruça na janela do padecimento sequer sente o calor
do sol ou a sua força alimentando a alma. Quem nega a importância do sol ou o
desconhece por não conseguir avistá-lo, certamente nem a lua poderá encontrar.
O que faz a
alma esconder o sol, o que faz o espírito esconder o sol, o que faz o ser
desconhecer o sol, o que faz a vida renegar todo sol? Talvez a falta de coragem
para abrir a janela já de olhos abertos. Sem lágrimas, sem tristeza, sem
nebulosidade em tudo.
Assim que
Solange jogar fora o seu lenço encharcado e fizer da janela uma paisagem de vida,
logo sentirá o calor que se aproxima e lhe invade. E ao olhar para o alto e
sentir-se abraçada pela imensa luz, então sentirá que a felicidade também é um
raio de sol.
Poeta e
cronista
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