Por Rangel Alves
da Costa*
O amor mudou?
O amor de hoje é diferente daquele de outrora? O amor esperado já não pode ser
mais encontrado? O amor perdeu seu romantismo ou sua essencialidade
sentimental? O amor ainda existe? Talvez alguns achem tais perguntas fáceis de
responder. Outros certamente refletirão com mais vagar sem encontrar respostas
satisfatórias.
Contudo,
antecipo uma resposta, ainda que intimista: O amor não mudou, quem mudou foram
as pessoas. O amor não mudou, o que se modificou foi a forma de amar. O amor
não mudou, o que se transformou foram os sentimentos a ele devotados. O amor
não mudou, o que se modificou foi a forma de pensar na sua existência. O amor
não mudou, mas sim a expressão do amar.
Mas o amor do
passado não é o mesmo do presente? Certamente que sim, mas apenas
conceitualmente, e não na sua essência. Por definição, de modo conceitual, o
amor sempre será visto como expressão de afeto, carinho e compartilhamento. Num
sentido relacional, sempre será tido como a pretensão surgida entre duas
pessoas para comungar e dividir os mesmos sentimentos amorosos, objetivando
enfim uma comunhão futura.
A conceituação
acima, entretanto, possui características que raramente são encontradas no
presente. Ao passado cabe a visão do amor romântico, sentimental, afetuoso,
lírico e poético. Mas por que assim mesmo era que ele se expressava. Numa
expressão popular, era um amor verdadeiro, compromissado, vivenciado a dois e
sofrido e chorado também a dois. A pessoa reconhecia-se amada e retribuía
fazendo com que o outro se dedicasse ainda mais àquele sonho bom.
Somente no
passado é possível encontrar singelas expressões amorosas. E pequenas coisas
que, aliás, poderiam muito bem ser feitas no presente. Mas os modernos parecem
sequer ter tempo para pensar no outro. Daí que somente o passado exemplifica a
grandeza do amor, de ser amado, de fruição plena da indescritível magia. A bem
dizer, até a saudade de antigamente era tão verdadeira que as lágrimas nasciam
diretamente no coração.
Os de mais
idade talvez se recordem das cartas amorosas, dos bilhetinhos, das flores
deixadas à janela. Recados enviados através de amigas, beijos lançados no ar
para seguir numa direção, nomes talhados no tronco da árvore, maçã do amor como
presente secreto. Aquela música romântica cantada ao passar nas proximidades, a
roupa mais faceira para encantar coração, o Toque de Amor descendo pelos
cabelos, o Charisma inebriando o encontro. Você me ama? Nem precisava
perguntar, pois o sentimento era indisfarçável.
E até um amor
difícil de ser suportado. Ora, os beijos praticamente eram roubados, os abraços
difíceis de serem sentidos. Carícias mais íntimas só nos escondidos. E assim
porque havia vigilância familiar constante. Mocinha que vivia de beijos e
abraços era logo falada. Daí que os pais chamavam o moço a casa, colocavam duas
cadeiras na varanda e ali os dois sentavam sob o olhar atento da mãe ou mesmo
do pai. Beijar só depois da aliança de compromisso. E até o noivado uma série
de impedimentos. E assim continuava até o dia do casamento. E por que os
apaixonados suportavam tudo isso? Por amor, simplesmente.
Muitos acham
um conservadorismo exacerbado, injustificável até. Mas com o passar dos anos e
a abertura da varanda da moralidade, o que se viu então foi um desandar de
tudo. Por consequência, aquele amor que exigia tanto sacrifício foi se
banalizando de tal modo que hoje em dia não se fala nem mais em namorar, mas
ficar. E este “ficar” não se diferencia em nada da vulgaridade, da facilidade,
da promiscuidade, de um jogo de entrega que não se contenta enquanto não se
tornar devassidão.
Desde muito
que é difícil avistar casais de namorados caminhando de mãos dadas, passeando
pelas praças, dialogando nos sombreados de um entardecer. Desde muito que a
mocinha não se põe à janela ansiosa pela chegada do namorado, não escreve um
poema para o amado ou abre a página do diário para escrever: Querido diário,
hoje sou a pessoa mais feliz do mundo. Amo e tenho a certeza de ser amada. Como
é bom sentir tamanha felicidade nascida do amor.
Aquele
conceito do amor continua existindo, mas somente no papel. Não há mais amor
verdadeiro que seja calmo e paciente. Não há mais amor que vá sendo construído
a dois até que edifique a plena certeza do que desejam. E um exemplo a ser
dado: Hoje o sexo se mistura a tudo. Parece que o sexo se transformou em
degustação. Primeiro prova-se, depois confirma o desejo ou não. E em tal
contexto, há que se falar em amor?
Como afirmado,
o amor verdadeiro é paciente, sabe esperar. E ele se resguarda feliz e contente
por um simples motivo: quer ter a eternidade ao lado de quem tanto ama.
Portanto, o amor não mudou. Ele está no coração e no sentimento de cada um. E
vive triste e magoado com o que andam fazendo em seu nome.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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