Por Rangel Alves
da Costa*
São muitas as
frases no sentido de afirmar ser a morte a única certeza da vida e do ser
humano. Com efeito, tem-se a morte como implacável destino humano. A tudo o
homem pode vencer, seja doença, sofrimento ou os inesperados da existência, mas
não encontra saída senão se convencer que a morte não lhe resguarda outra coisa
que não o seu chamado. Daí que os pensadores ora concebem a morte ora como
inevitabilidade ora como algo sempre indesejado tanto para si como para o
outro.
Dizem os
autores: “Tudo o que sei é que devo morrer em breve; mas o que mais ignoro é
essa mesma morte, que não saberei evitar” (Blaise Pascal). “Cumpriu sua
sentença. Encontrou-se com o único mal irremediável, aquilo que é a marca do
nosso estranho destino sobre a terra, aquele fato sem explicação que iguala
tudo o que é vivo num só rebanho de condenados, porque tudo o que é vivo,
morre” (Ariano Suassuna).
Também são
muitas as frases acerca da dor e da inaceitabilidade da morte. “Todas as
decepções são secundárias. O único mal irreparável é o desaparecimento físico
de alguém a quem amamos” (Romain Rolland). “De vez em quando a eternidade sai
do teu interior e a contingência substitui-a com o seu pânico. São os amigos e
conhecidos que vão desaparecendo e deixam um vazio irrespirável. Não é a sua
'falta' que falta, é o desmentido de que tu não morres” (Vergílio Ferreira).
Na verdade,
ninguém aceita a morte. O fato de dizer que sendo destino a morte lhe cairia
normal, não significa que não aja espanto quando tal fato acontece com uma
pessoa amada. Mesmo que seja vista como sina inevitável, há uma luta constante
para que o seu relógio se desnorteie no tempo e o calendário deixe de passar.
A morte é
simplesmente dor, agonia, sofrimento, angústia, espanto maior. Em muitas
situações, quando a enfermidade é incurável e a família e amigos – e mesmo a
pessoa – já tenham a certeza que não demorará o instante da despedida, ainda
assim a partida será permeada de sofrimento. Sabe-se que ela é inevitável, que
ela não passará nem um dia a mais para acontecer, mas a sua simples ocorrência
motiva dores indescritíveis em quem se despede.
Diferentemente
da perda de importância que os fatos vão tendo quando se tornam costumeiros ou
são esperados para acontecer, com a morte ocorre exatamente o contrário. Quanto
mais sua ocorrência mais dor, quanto mais seu surgimento mais sofrimento,
quanto mais faz inesperada visita mais abre um fosso na alma. Tanto assim que
as pessoas costumam sofrer quando da partida de desconhecidos, de pessoas que
sequer já haviam sido avistadas. E tal acontece pelo despertar pesaroso que
provoca nos sentimentos.
Talvez não
seja a morte em si, mas a sua sensação que provoca tanto temor e pavor. Sendo
um fato de vida, algo que chegará para todos, certamente deveria ser mais
compreendida e acolhida. A morte é aceita, pois inevitável, mas o que atormenta
é o fato de morrer, a sensação de perda, a forçada despedida, a ausência que o
outro terá na sua vida. Desse modo, não é o fechar os olhos que provoca a dor e
o sofrimento, mas a certeza de que aqueles olhos jamais serão avistados,
sentidos, compartilhados no olhar.
Tanto assim
que a morte é fato que acaba em si mesma. Ou seja, uma vez acontecida, não há o
que se fazer. Contudo, são as consequências do fato que acabam dilacerando
corações, fragilizando almas, deteriorando todo o ser vivente. Porque com a
morte vem a dor da saudade, vem a recordação sempre entristecida, vem a agonia
da relembrança, vem o inevitável desejo de ter aquele novamente ao seu lado.
Portanto, os
cemitérios são lugares entristecidos não porque ali estejam em sono eterno os
entes queridos, mas pelo que é despertado na mente, na alma, nos sentimentos. O
choro, a lágrima, a aflição, não é pelo fato da morte. Mas tão somente pela
ausência. Ou pela certeza de que jamais será abraçado e chamado de pai, mãe,
filho, irmão, amigo. E também pelo retrato que se eterniza na parede do
coração.
Poeta e
cronista
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