Por Rangel Alves da Costa*
Como já afirmei em texto anterior
(O Projeto de Lei das Organizações Sociais de Poço Redondo – uma análise), a
pretensão do prefeito de Poço Redondo com a aprovação da Lei das Organizações
Sociais é tão somente para administrar, através das entidades que serão
criadas, sem ter de cumprir as exigências legais da licitação na contratação de
serviços.
É que as organizações sociais,
consideradas como entidades sem fins lucrativos, de interesse social e
utilidade pública, estão dispensadas de fazer licitação. Significa dizer que os
serviços prestados nas áreas onde atuarão – saúde, educação, obras, assistência
social, etc. – serão contratados sem ter de cumprir todos os regramentos do
processo licitatório.
O problema é que as organizações
atuarão como se fossem a própria prefeitura, com recursos provenientes desta,
com funcionários desta, sob o comando de uma equipe escolhida pelo próprio
prefeito e sob o total controle deste. Será o prefeito mandando ou desmandando
em dois lugares: na prefeitura e nas organizações. E se não comanda com
eficiência sequer uma prefeitura, imagine-se com duas atribuições de poder.
As organizações farão os mesmos
contratos e prestarão os mesmos serviços de uma prefeitura. Só que sem
licitação. Repita-se: os contratos que hoje são celebrados pela prefeitura
passarão para as organizações, mas sem licitação. E a lei diz que um dos órgãos
que fará a fiscalização das organizações é o “Tribunal de Contas do Município”,
órgão, aliás, inexistente.
É a dispensa de licitação na
celebração de contratos que está fazendo com que o prefeito municipal tanto
tenha se empenhado para a aprovação da Lei das Organizações Sociais. Não há
outra motivação para que faça ameaças de parar o município, desempregar, fechar
serviços essenciais, senão a sede de ter às mãos – e a seu bel-prazer – um
instrumento para fazer contratos sem licitação. Alguém sabe por que é tão bom
fazer contratos sem precisar de licitações?
A verdade é que o prefeito
municipal, no afã de lançar mão de instrumento tão generoso, vai blefando a
torto e a direito. Em primeiro lugar, acaso faça o que vem dizendo, ou seja,
fechar tudo, desempregar meio mundo de gente, deixar de prestar serviços
essenciais, poderá ser objeto de impeachment. Bastaria que existisse uma
verdadeira Câmara Municipal em Poço Redondo e vereadores compromissados com o
município e não apenas apadrinhados do gestor municipal.
Acaso o prefeito aja segundo vem
propalando, estará aberto o caminho para ser denunciado na Câmara Municipal.
Denunciado pelos próprios vereadores, partidos políticos ou qualquer eleitor. A
denúncia deverá envolver uma infração político-administrativa. Ora, se até o
presente momento a prefeitura vem recebendo verbas regulares para a manutenção
dos serviços essenciais e de repente diz que nada mais será prestado se a
câmara não aprovar projeto de seu interesse, logicamente que está praticando
infração administrativa.
No momento, o posicionamento
contrário ao projeto das organizações sociais é uma questão de bom senso e de
preocupação e precaução com o próprio futuro do município. Uma administração
que se reconhece como ineficiente, mesmo com o recebimento regular de verbas e
mais verbas, não se tornará em nada mais eficiente transferindo suas
responsabilidades para as organizações sociais. O olho grande está é na
dispensa da licitação, e apenas isto.
Ninguém é obrigado a conhecer os
termos de uma lei. As leis, tantas vezes, possuem armadilhas nas suas
entrelinhas. E esta das organizações foi feita com tal formatação, perigosa
demais na sua aplicabilidade, pois contém instrumentos que concedem demasiados
poderes ao gestor municipal. Creio que aqueles vereadores que possuem
dificuldades de leitura e interpretação deveriam pedir auxílio a alguém
responsável.
Por outro lado, muito estranho
que a iniciativa de tal projeto surja já depois de tanto tempo de descalabro
administrativo e já próximo ao último ano de gestão do prefeito. Muito estranho
que haja tanto esforço e tanta ameaça no único intuito de fugir das licitações.
E também muito estranho que alguém de mínimo entendimento diga que esta lei é a
salvação da pátria. Qual pátria?
Por fim, inadmissível que um
vereador diga que apoia a lei porque esta obedece aos princípios legais. Legal
pode ser, mas não deixa de ser imoral. E de imoralidade explícita. O simples
fato de transmudar os poderes e verbas orçamentárias de uma administração
municipal para entidades que serão controladas pelo próprio prefeito, e com
dispensa de licitação nos contratos que realizar, já permite imaginar que dessa
flor não sairá bom perfume.
Advogado e escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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