Por Rangel Alves
da Costa*
No pêndulo da
vida ninguém sabe onde estará no momento seguinte. Quem se acha segurando
estrelas poderá desabar por cima da própria sombra. Tudo tão volúvel e instável
que sempre será um erro arrogar-se de ser além ou mais importante que qualquer
coisa ou pessoa. Eis que a corda que estende também puxa de volta.
Uma verdadeira
epidemia assola egos, vaidades, egoísmos, soberbas. Fronteiras delimitam o
lugar daquele que tem, que pode e manda, daquele que é visto como qualquer
coisa – ou nada – no terreno chão da inferioridade. E a soberba arrogância cega
e desmemoria aquele que se acha importante demais.
Ledo engano
encomendar nuvens e tapetes voadores. Um erro o endeusamento sem que carregue
sobre si a virtude da humildade. Deus, na sua grandeza infinita, se junta aos
fracos, padecentes, humildes e sofridos, e a todos abraça como irmãos
merecedores de suas dádivas. E qual será o homem nascido sobre a terra que pode
se arvorar de ser mais que os outros apenas porque vive em meio a futilidades?
Gente há que
realmente não gosta de gente, principalmente se a outra gente for
economicamente frágil, pobre, desvalida. Por razões interesseiras, muitas vezes
é forçada a engolir o outro e até mostrar a maior amizade do mundo.
Gente há que
faz da arrogância, do trato submissivo e do pisoteamento, formas corriqueiras
de tratamento. O outro é simplesmente tratado como um verme desprezível, como
cão sarnento, como um zé-ninguém. E não raro que evite ao máximo estar diante
da ralé social.
Gente há que
precisa de gente, que sobe às alturas pelas costas da população carente, que se
encastela no poder pelo querer do povo, mas ainda assim nem olha para baixo
quando está lá em cima. E no alto chuta a escada depois da subida.
Há muita gente
assim. Muito mais do que se possa imaginar. Por trás da vileza comportamental
sempre há uma coroa e um reinado de ilusão. Há um tipo de alucinação
transformadora que faz esquecer o passado e renegar toda raiz e toda história.
O passado sempre é apagado acaso possa relembrar que um dia foi gente comum, de
carne e osso e precisão.
Gente há que
sobe um patamar na profissão e já começa a olhar seus subordinados com
indiferença. Gente há que assume um mandato letivo e passa a fazer de seu
eleitor um desconhecido. Gente há que faz da riqueza e do poder um muro alto
limitando o que é e o que os outros não são.
Gente há que
só recebe pelo nome de quem o procura, que manda dizer que nunca está, que tudo
faz para não se avistar com pessoas pobres, necessitadas, que desejem implorar
algum benefício. E há também aqueles que limpam as mãos após forçadamente
apertar a mão de uma pessoa do povo.
Uma gente
assim desconhece totalmente o que seja humildade, ou conhecendo faz valer seu
lado mais desumano para desconhecê-la. E passando todo garboso sem sequer
cumprimentar um velho amigo do passado, deste teve que ouvir: Hoje pensando que
é flor armada de espinho, mas amanhã terá o mesmo caminho.
Por não dar
atenção, certamente o soberbo não prestou atenção no significado daquelas
palavras. E não seria difícil de entendê-las. O ser humano, de igualdade
natural, vivendo no mesmo mundo de todos, se engana ao imaginar superior aos
demais. Ao final, o exemplo maior da vida chegará o mesmo destino que a todos
aguarda.
Por outro
lado, muitos jamais abdicam da humanização do seu ser. Por mais que cresçam,
vençam na vida, se tornem ricos e poderosos, continuam vendo a realidade com o
mesmo olhar de tempos passados, quando eram apenas uns entre seus iguais. O
velho amigo sempre será relembrado e abraçado, o seu povo e o seu lugar sempre
estarão presentes na sua memória.
Mas o que é a
humildade que tantos fogem de sua conceituação. Nada mais é que a virtude de se
reconhecer como ser humano igual aos demais. É a qualidade que determinadas
pessoas têm de se manter no nível dos outros. Há um reconhecimento de que
ninguém é superior ou melhor que ninguém, e por isso mesmo todos devem ser
tratados com respeito, amizade, simplicidade e honestidade.
Ser humilde é
a sensação de não ter abandonado as virtudes interiores, de continuar com os
mesmos sentimentos outrora reconhecidos e valorizados pelos seus. Neste sentido,
a humildade sempre remete a uma situação anterior e uma consequente mudança
comportamental. Quem é humilde não apaga de seu coração nada que um dia
conviveu, aprendeu e amou.
Ser humilde é
pacificar-se consigo mesmo. A humildade se regozija do seu bondoso e
compreensivo jeito de ser e conviver. Nada agrada mais ao coração que
compartilhar a vida com o próximo, com o irmão, com aquele conhecido de outros
tempos. Purifica a alma toda vez que lança o olhar e a mão àquele que encontra
pelos caminhos da vida.
Certamente que
não há adornos nem floreios na humildade. Mas ela de nada disso precisa.
Sacia-se tão somente em fazer moradia no coração humano que ao outro reconhece
na grandeza do que é: um sempre igual.
Poeta e
cronista
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