quarta-feira, 6 de maio de 2015

O PROCESSO DE DESERTIFICAÇÃO NO SEMIÁRIDO: UMA BREVE ANÁLISE

Por José Romero Araújo Cardoso[1] e Marcela Ferreira Lopes[2]

Conforme enfatizado pela Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação, desertificação é entendida como um processo de degradação das terras das regiões áridas, semiáridas e sub-úmidas, resultante de diferentes fatores, encontrando-se entre esses as variações climáticas e as atividades humanas, estando ligados a esse conceito as degradações de solo, fauna e recursos hídricos (Cf. Mendes, 1997).

No Brasil, as áreas semiáridas e sub-úmidas do Nordeste Brasileiro são as mais suscetíveis à Desertificação, pois possuem condições edafoclimáticas ímpares. De acordo com o Plano Nacional de combate à Desertificação, cerca de 181.00 km2, correspondente a 20% da área semiárida da região Nordeste, encontram-se inseridos nesse acelerado processo.

Predominam no semiárido Nordestino solos das classes Bruno Não-Cálcico, Litólico e Planossolo, rasos e sujeitos à erosão, com cobertura vegetal de caatinga hiperxerófila, adaptada às condições ambientais rigorosas.  Esse fenômeno recente vem despontando como desafio premente, tendo em vista que as secas periódicas que vem assolando a região tem agravado consideravelmente a situação ambiental extremamente preocupante, tendo em vista que a explicação de Milton Santos para o conceito de região ter sido vendido como um edifício estável, sobretudo no que concerne à natural, aplica-se com rigor para o semiárido nordestino.

A crise deflagrada no início dos anos 80 do século passado, quando do advento da praga do bicudo, a qual responsabilizou-se pela queda lastimável da produção algodoeira, responsabilizou-se, em grande percentual, pelo início do esvaziamento do campo no semiárido Nordestino (Cf. Mendes, 2003).

É reconhecido o relativo sentimento telúrico que o homem sertanejo nutria pela terra e por tudo que a ela pertencia. Quando da convivência no campo, havia certo respeito pelo bioma e pelos ecossistemas que a integravam, não obstante sabermos que diversas espécies animais e vegetais estão em processo de extinção graças à caça predatória e ao desmatamento criminoso.

Abandonando-a, a terra ficou à mercê dos interesses do capital. Apenas meio de acumulação é o que vem sendo enfatizado na relação forjada sob a égide do atendimento as mais imediatas exigências de um processo que não respeita a fragilidade do semiárido.

A antropização excessiva foi-se definindo como principal protagonista no ensejo da utilização das terras na zona rural, impactando-as formidavelmente enquanto premissa ao fomento para o processo de desertificação que vem se consumando como paisagem, diferenciada de épocas pretéritas.
            
Diversos núcleos de desertificação surgiram enquanto produto das atividades humanas indiscriminadas, estando entre essas o desmatamento, as queimadas e o sobrepastejo de caprinos e ovinos. Os mais preocupantes núcleos de desertificação encontram-se em Irauçuba, localizado no noroeste do Estado do Ceará, o qual abrange uma área de aproximadamente 4.000 km². Inclui os municípios de Irauçuba, Forquilha e Sobral; Cabrobó, localizado no Estado de Pernambuco. Totaliza uma área de 5.960 km². Abrange os municípios de Cabrobó, Belém do São Francisco e Floresta; Seridó, está localizado na região centro-sul do Estado do Rio Grande do Norte e centro-norte da Paraíba. Abrange área de aproximadamente 2.341 km². Envolve diversos municípios em torno de Parelhas (RN) e Gilbués, localizado no Estado do Piauí. Ocupa uma área de aproximadamente 6.131 km2. Envolve os municípios de Gilbués e Monte Alegre. Recentemente, o Raso da Catarina (BA) também vem apresentando processo de desertificação (Cf. Accioly).

O desmatamento indiscriminado, intuindo abastecer olarias com material lenhoso retirado da caatinga vem penalizando consideravelmente os núcleos de desertificação localizados em Irauçuba e no Seridó, enquanto a mineração tem relação direta com esse processo em Gilbués.

Nas áreas de agricultura irrigada, casos do vale do São Francisco, vale do Jaguaribe e vale do Assu, a desertificação tem relação direta com a salinização. A área do núcleo de Cabrobó, próxima ao São Francisco, vem se destacando devido a isso.

Animais astutos e bem adaptados às condições mesológicas do semiárido, caprinos são criados em todos os Estados Nordestinos, invariavelmente de forma ultra-extensiva. Isso ocasiona impactação formidável.  A participação desse rebanho no processo de desertificação vem sendo acelerada consideravelmente, tendo em vista o percentual de participação do Nordeste, sobretudo o semiárido, no conjunto nacional.

Na região oeste potiguar, a exploração petrolífera também se destaca no que tange à responsabilidade para a desertificação do semiárido. O Prof. Dr. Benedito Vasconcelos Mendes implementou pesquisa que resultou na recuperação de áreas degradadas pela técnica do “inóculo”. O lócus da implementação da pesquisa foi na localidade Canto do Amaro.

Embora obtendo sucesso na implementação da técnica do “inóculo”, não houve respeito do capital para com a natureza, pois a descoberta de novo lençol petrolífero levou a Petrobras a devastar a área recuperada assim que houve necessidade de dinamizar a produção.

Desafio extraordinário, articulado ao ensejo das estratégias de transição para o século XXI, a desertificação no semiárido vem se concretizando como a mais espetacular demonstração da irresponsabilidade antrópica para com biomas frágeis e suscetíveis a mudanças catastróficas.

Bibliografia:

ACCIOLY, L. J. O. Degradação do solo e desertificação no Nordeste do Brasil. Disponível em .< http://www.diadecampo.com.br/zpublisher/materias/Materia.asp?id=22136&secao=Arti>. Acesso em 21 de abril de 2015.
BRASIL. Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca. Disponível em .< http://www.mma.gov.br/gestao-territorial/combate-a-desertificacao/convencao-da-onu>. Acesso em 21 de abril de 2015.
MENDES, B. V.; ALCÂNTARA, A. Q.; XAVIER, I. D. Recuperação de áreas degradadas pela “técnica do inóculo”. Mossoró/RN: Igramol, s.d.
MENDES, B. V. Biodiversidade e desenvolvimento sustentável do semi-árido. Fortaleza: SEMACE, 1997. 108 p.
_____________, . Reflexões sobre o Nordeste. Mossoró: Fundação Vingt-Un Rosado, 2003. 90 p. il. (Coleção Mossoroense. Série C, 1358).
[1] José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-Adjunto IV do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista em Geografia e Gestão Territorial (UFPB) e em Organização de Arquivos (UFPB). Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UERN).
[2] Marcela Ferreira Lopes. Geógrafa-UFCG/CFP. Especialista em Educação de Jovens e Adultos com ênfase em Economia Solidária-UFCG/CCJS. Graduanda em Pedagogia-UFCG/CFP. Membro do grupo de pesquisa (FORPECS) na mesma instituição.

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