Por Rangel Alves
da Costa*
Uma das
características de Sergipe é a abundância de água na capital e região
metropolitana, vez que ladeados por extenso litoral, e a seca que devasta
grande parte do estado o ano todo, principalmente após os limites sertanejos.
Mas tal contraste deu uma reviravolta surpreendente desde o último sábado.
Com efeito,
desde o último final de semana que a seca se deslocou da região sertaneja e se
instalou em Aracaju e arredores, e com todas as feições das estiagens mais
desoladoras: falta de chuvas, calor terrível e principalmente a ausência de
água nas torneiras. Não há água para lavar, cozinhar, tomar banho, para
qualquer coisa.
Tudo começou
quando a tubulação trazendo água da Adutora do São Francisco para o
abastecimento da capital e região metropolitana se rompeu com a queda de uma
velha ponte que servia de sustentação para canos. A ponte estava tão velha e
sem qualquer tipo de manutenção que bastou que algumas pessoas e quatro animais
passassem por cima para que sua estrutura inteira desabasse.
O resultado dessa
tragédia aquífera redundou no desabastecimento da capital e região, deixando
milhares de residências sem um pingo d’água sequer. Como a tubulação destruída
abastecia cerca de 70% da população, os problemas logo começaram a surgir. E a
solução emergencial encontrada não foi das melhores, pois ao invés de garantir
o mínimo abastecimento acabou provocando pinga pinga nas torneiras que tinham
sua situação normalizada.
Assim
aconteceu porque parte da capital recebe 30% de águas de outra adutora, a do
Rio Poxim, e a Deso (estatal de abastecimento de água em Sergipe) resolveu que
tal montante seria redistribuído para as regiões com desabastecimento, em forma
de rodízio. O problema é que ao redistribuir as águas perderam a força e mal
chegaram às torneiras. Quer dizer, o problema generalizou-se e acabou deixando
em difícil situação quem tinha água garantida.
Tal situação
vem se alastrando desde sábado e as melhores previsões sinalizam uma solução
apenas para os próximos dez dias, ou mais, pois uma nova adutora terá de ser
construída. Enquanto isso as autoridades se preocupam apenas em apontar
culpados pelo ocorrido. E, logicamente fugindo de suas responsabilidades de
cuidado e manutenção, cuidam de culpar os quatro cavalos que passavam pela
estrutura quando ela desabou.
As explicações
e justificativas das autoridades são absurdas. Uma ponte, ainda que velha, e
com destinação exclusiva para a passagem de tubulação de adutoras, jamais
poderia ter desabado pelo simples fato de que não ter suportado o peso de
quatro cavalos magros. Desabou porque não recebia qualquer manutenção, porque
os canos estavam velhos e enferrujados demais, porque só se pensa em fazer
alguma coisa quando a tragédia já aconteceu.
O resultado
está aí. Mais de um milhão de pessoas está sem água para qualquer situação de
vida, os pratos e banheiros continuam sujos, as roupas imundas estocadas, os
corpos suados e malcheirosos, o pavor entre todos. E nem São Pedro veio em
auxílio aos aracajuanos, pois as chuvas costumeiras dos finais de semana sequer
apareceram. Não chove, não pinga, não há outra solução que não se submeter aos
aproveitadores de água mineral.
Enquanto o
sertão, ainda que com pouca água, toma banho, bebe, lava e faz o asseio da
casa, a capital paga o preço do descaso governamental. Como tudo muda na vida,
a seca também parece ter mudado de lugar. A única diferença é que ao invés de
pastagens secas e paisagens desoladas, o que se tem são o asfalto enfumaçando e
pessoas sem saber o que fazer. E olhando para o alto em rogos implorando uma
nuvem d’água.
Segundo as
próprias autoridades, a situação vai demorar a ser resolvida. Quer dizer, a
seca continuará por tempo indefinido. E por isso mesmo já tem gente querendo
fazer a migração inversa: deixar a estiagem malcheirosa da capital e bandear
para os lados do sertão.
Poeta e
cronista
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