(*) Rinaldo
Barros
Juro que
tentei entrar no espírito da Páscoa, com seus símbolos da chegada de uma nova
vida, e disseminar esperanças de renovação para todos. Todavia, a análise do
atual cenário que se nos apresenta não permitiu. Senão, vejamos melhor como
estamos hoje no Brasil e no mundo.
Ninguém
conseguiu “desentupir as veias do sistema financeiro, vítima de trombose",
conforme a descrição de Christine Lagarde, a ex-ministra francesa de Economia e
atual presidente do FMI.
O noticiário
vem sendo o mesmo nos últimos meses: crise financeira, bolsas despencando,
bancos e megaempresas indo à bancarrota, desindustrialização, pacotes
governamentais tentando injetar estabilidade na economia, no patropi e em
diversos outros países. Sempre do ponto de vista do capital. Sempre.
Nada sobre o
futuro do trabalhador, nem sobre a redução das margens de lucro (spread) dos
bancos, nem sobre a redução das despesas do governo.
Ainda não
ouvimos uma palavra, uma análise, um gesto que possa sinalizar uma ação de busca
às reais causas da turbulência econômica. Está evidente que a roupa não carece
de mais remendos.
Há que se
pensar - com sentido de urgência - em uma nova roupa com que se possa vestir a
economia. Uma roupagem que abrigue os muitos milhões de miseráveis do Brasil e
do mundo.
Um traje que
seja desenhado com as linhas da dignidade humana.
O atual
sistema político e financeiro do é, sob qualquer ângulo que se analise,
insustentável. Um sistema que reproduz um padrão de desigualdade brutal,
vitimando milhões de seres humanos, condenando a maioria da população a uma
existência física abaixo da linha da pobreza. Escondida pela propaganda.
Para comprovar
isso, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) denuncia: a
soma da renda das 500 pessoas mais ricas do mundo supera em muito a dos 400
milhões mais pobres.
Em outras
palavras, apenas um multimilionário ganha mais do que 1 milhão de pessoas!
Esta
constatação serve na medida como epitáfio de um mundo impossível de ser mundo,
um mundo constantemente a desafiar o mais comezinho bom senso sobre o que nos
reserva o futuro.
A produção
mundial segue de vento em popa e carrega consigo o estigma real das
desigualdades sociais. Basta que entendamos que atualmente, 80% da produção
industrial do mundo são absorvidos por apenas 20% da população que vive nos
países mais ricos do hemisfério Norte.
Enquanto a
fome é distribuída indiscriminadamente, o bem-estar continua privilégio de uns
poucos.
Assuntando cá
no meu canto, tentei, então, me convencer que a crise verdadeira é a crise que
fará o mundo mergulhar em uma tomada de consciência jamais tentada, é a crise
de valores humanos universais. Crise da ética.
Meu anseio por
um mundo melhor ressurgiu tão intenso que - ingenuamente – vislumbrei a utopia
que ainda é possível construir um mundo sustentável, que nada foi em vão. Um
reencantamento, sem dúvida.
Mas, para
botar os pés no chão, inventei de fazer um rápido passeio pela juventude
contemporânea, passando pelas rádios, TVs e revistas, conferindo as grades de
programas destinados às gerações do futuro.
Fiquei
impressionado. Um festival de nada com nada. Cabeças vazias pontificando aqui e
ali. O único culto a unir diversas faixas de idade, mas dentro do intervalo de
13 a 30 anos, é o culto à beleza-padrão, à saúde física, à beleza dos rostos e
dos corpos. A maior vitrine que temos de há quantas anda a nossa juventude pode
ser conferida 24 horas por dia (nos canais pagos) e nos horários nobres diários
(nos canais abertos) através de programas tipo Big Brother Brasil. Com altos
índices de audiência.
Ali (re)
conhecemos o pobre linguajar de nossos jovens, a sem cerimônia no uso e abuso
de palavras de baixíssimo nível, num clima de muito sexo sem amor, o excesso de
gírias, caras e bocas e a falta de conteúdo para defender qualquer que fosse o
ponto de vista, acerca de qualquer tema ou assunto.
Sem nem levar
em conta o tsunami de corrupção que assola o patropi; o choque de realidade me
levou ao temor de que nossa sociedade seja suicida, e que o nosso futuro pode
ser a barbárie.
Resumo da
ópera: se um dos objetivos de qualquer geração é moldar o processo decisório
dos anos à nossa frente, não temos muito a comemorar nem para abastecer nossa
carga de esperanças em um mundo melhor, mais humano, saudável e, sobretudo,
habitável.
Em plena
Páscoa, cansado de tanto “ver triunfar as nulidades”, só vejo desencanto.
Não perguntem
por quem os sinos dobram. Toquem os sinos da indignação pela inimaginável
miséria presente nos campos, vilarejos e periferias das metrópoles brasileiras.
(*)
Rinaldo Barros é professor – rb@opiniaopolitica.com
Enviado pelo professor, escritor e pesquisador do cangaço José Romero Araújo Cardoso
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