quarta-feira, 25 de março de 2015

AS CHUVAS DE OUTONO

Por Lucivânio Jatobá

Elas chegaram,   antecipadamente anunciadas por um forte calor e pela direção Nordeste assumidas pelos ventos, ao território potiguar, neste ano de 2015. De súbito, os céus,  quase que permanentemente azul por imposição de um anticiclone inclemente, assumem uma coloração acinzentada e ficam atapetados por enormes nuvens cúmulo-nimbos. Logo, esses gigantescos “flocos de algodão celestial”  se desfazem em pesados aguaceiros de caráter convectivo, enchendo os rios temporários e alimentando com água os solos rasos sertanejos. São as chuvas de outono.
                
As chuvas de outono, na parte centro-setentrional do Nordeste, área-core do trópico semiárido brasileiro, decorrem dos avanços  meridionais de um importante e imponente sistema atmosférico, conhecido no jargão climatológico como Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). Trata-se de uma faixa de baixas pressões atmosféricas para a qual convergem os fluxos  dos alísios de Nordeste e de Sudeste, caracterizada pelos elevados índices de umidade atmosférica e pela presença constante de nuvens de notável desenvolvimento vertical. Esse sistema  migra para o norte ou para o sul do Equador geográfico, de acordo com a marcha aparente anual do Sol na Eclíptica.  Sua migração extrema para o sul ocorre exatamente no outono.

Há anos em que essa migração para o sul é  mais enérgica. E´ nesse momento que a ZCIT , que não respeita as imposições orográficas, ultrapassa  facilmente  a chapada do Apodi e penetra pelos principais vales fluviais do sistema hidrográfico potiguar.  Percebe-se a presença da ZCIT  quando os céus, mesmo à noite, ficam iluminados    pelos raios e pelos estrondos  imensos  das trovoadas, que fazem lembrar o início de um cataclisma que se anuncia, mas que não se consuma.
                
A ZCIT é fortemente influenciada pelas temperaturas das águas do Atlântico norte e do Atlântico sul. Nos anos em que as águas do Atlântico norte estão mais fria do que o normal,  na faixa de latitudes correspondentes ao Senegal e Cabo Verde, os alísios de Nordeste adquirem mais energia, com o fortalecimento impressionante do Anticiclone dos Açores,  e, no embate com os alísios de Sudeste, conseguem, para a alegria do sertanejo, impelir para o sul a massa de nuvens que acompanham a ZCIT. As chuvas, mesmo com a lamentável, às vezes, irregularidade  espacial,  fazem brotar, logo o feijão e o milho  plantados pela agricultura familiar, no dia consagrado a São José. Ao largo das plantações renasce a flora agonizante das caatingas, parafraseando um pouco Euclides da Cunha.
                
O ano de 2015 promete...  Promete,  pelo menos no que tange  ao regime de chuvas de outono. O Atlântico Norte está anomalamente  frio, ao contrário do ano de 2014, quando a situação era inversa.  O quadro pluviométrico,  que começou a dar sinais vitais, é animador. O sertanejo fixa o olhar no horizonte e renova as esperanças. A dinâmica da natureza se revela favorável  `as atividades agrícolas.


Lucivânio Jatobá é Geógrafo, Professor de Geografia da Universidade Federal de Pernambuco.

Enviado pelo escritor, professor e pesquisador do cangaço José Romero Araújo Cardoso.

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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