Por Rangel Alves
da Costa*
Parece mesmo
que nada mais acontece de novo. Ao amanhecer e lançar os olhos sobre os
impressos noticiosos sempre encontro jornais velhos, escritos já carcomidos
pelo tempo, letras cansadas de se repetirem nas folhas entristecidas. A data é
daquele dia, daquela manhã, mas tudo envelhecido e desde muito já conhecido. E
tantas vezes os olhos já consumiram tanto aquelas notícias que o interesse e o
senso crítico não se aguçam mais.
Estranho que
assim ocorra, porém acontece com os jornais que são deixados na minha e na sua
porta, que amanhecem nas bancas ou são levados por mãos esperançosas de algo
novo. Nada de novo encontrará. E se naquele dia não houver circulação não
haverá qualquer motivo para deixar de tê-los à mão enquanto sorve o primeiro
gole de café ao alvorecer, pois basta ir ao baú dos escritos e de lá retirar
qualquer diário ou periódico, mesmo com data de dez ou vinte anos atrás.
A data pode
ser antiga, que o jornal tenha circulado num tempo em que a notícia escrita era
o primeiro contato visual do homem com as informações bombásticas, as manchetes
sensacionalistas, as chamadas suntuosas dos meandros do poder, as tantas
tragédias do dia a dia, mas ainda assim tudo aquilo que poderia ser encontrado
no último número de um jornal. E assim porque nada acontece de novo que já não
tenha acontecido no passado, nada surge com tamanha novidade que já não tenha
sido novo antigamente. E tudo se repetindo, sempre, num ciclo de acontecimentos
que apenas aprimoram suas práticas. Mudam somente os nomes dos envolvidos.
Verdade que o
tempo produz suas próprias notícias, eis que cada período histórico com sua
própria feição, com acontecimentos refletindo aquele momento. Do mesmo modo,
verdade que os mesmos acontecimentos não se repetem no mesmo contexto de causa
e efeito. Contudo, a visão geral do acontecimento é o mesmo. E tanto é assim
que muitas vezes o leitor até diz a si mesmo que já leu algo parecido em algum
lugar, que aquele acontecimento não lhe parece estranho. Acaso uma manchete
diga que a violência no trânsito está aumentando, tudo parecerá notícia apenas
requentada. E também constantemente lida.
Assim acontece
porque o novo na informação diz respeito apenas aos envolvidos, à dimensão do
acontecimento e ao interesse que desperta. No mais, apenas uma notícia já
tantas vezes repetida. Por exemplo, quantas manchetes sobre tragédias aéreas,
eclosão de guerras e revoltas, golpes militares, surgimento de epidemias,
desastres naturais e mortes já foram dadas? Desde os primeiros jornais
impressos e assim continua.
São muitos
outros exemplos neste sentido. Quando teve início a primeira grande guerra
mundial os jornais noticiaram em manchetes quase gritando. Assim também com a
segunda guerra, e do mesmo modo com as guerras modernas. Quer dizer, a eclosão
de uma guerra não é mais novidade para ninguém, importando saber apenas o
contexto em que ela se dá, quais os envolvidos, os objetivos e as possíveis
consequências.
Quem está
acostumado a ler jornais certamente dirá que já perdeu a conta de quantas vezes
teve de se deparar com notícias envolvendo chacinas, estupros, assassinatos,
roubos, corrupções, prisões de autoridades, derrotas e vitórias políticas,
enfim, tudo aquilo que um jornal sempre noticia na primeira página. E assim
ocorreu também na década de 30, 40 e assim por diante. Por muito tempo um
jornal paulistano (Notícias Populares) fez fama como aquele que se fosse
espremido escorreria sangue, e assim porque especializado em noticiar tragédias
humanas. E o noticiário de hoje certamente faz escorrer o vermelho pela
sarjeta.
Logo se vê,
então, que os fatos são os mesmos, geralmente com maior gravidade, apenas se
repetindo noutro contexto. As atrocidades praticadas por ditadores já ganharam
quantas manchetes de jornais, bem como a situação de miséria humana nos países
africanos, a devastação e o sofrimento causados pelas secas nos sertões
nordestinos e os problemas da infância abandonada? Desde quando os jornais
noticiam acerca da inflação, do desemprego, da violência, dos graves problemas
sociais no Brasil e no mundo?
Tudo parece,
pois, se repetir. E se repete. A violência ontem, a violência hoje; a fome
afligindo ontem, a fome consumindo hoje; as ilicitudes administrativas de
ontem, as improbidades de hoje; as mesmas corruptas práticas políticas, só
mudando o nome do parlamentar. Como uma sentença do Eclesiastes, nada acontece
de novo debaixo do sol. Daí que os jornais de hoje são os jornais de ontem e as
notícias impressas mudam apenas nomes e circunstâncias, como se os textos
fossem copiados de antigamente.
Contudo, se as
notícias ruins, tragédias e bizarrices se repetem tanto e com maior gravidade,
o mesmo não ocorre com aquelas manchetes prazerosas, desejadas, que causam
contentamento ao leitor. Mas ainda assim na mesma pontualidade de outros
tempos. Então logo se percebe que o mundo e a vida humana especializam-se cada
vez mais em produzir infortúnios e não tem demonstrado nenhuma preocupação em criar
fatos novos que sejam esperançosos e alvissareiros para todos.
O jornalista
apenas transcreve o fato, dissemina a informação, mas cabe ao homem ser dono da
própria notícia. E o que o ser humano anda fazendo que os jornais não informam
seus grandes feitos no dia a dia? Alguma coisa está muito errada. E não é no
jornal antigo nem no de hoje, mas naquele que faz o sangue escorrer ou o
coração entristecer a cada manchete.
Poeta e
cronista
http://blograngel-sertao.blogspot.com.br/2014/11/jornais-velhos.html
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