segunda-feira, 24 de novembro de 2014

ESPINHOS BENDITOS

Por Clerisvaldo B. Chagas, 23 de novembro de 2014. - Crônica Nº 1.309

Vamos hoje passar a palavra ao saudoso escritor santanense, Raul Monteiro.


“No verão os campos dos nossos sertões, por natureza áridos, tornam-se nus e causticantes. O solo pedregoso, fica exposto à inclemência dos raios solares, que ali raramente sofrem interferência, deveras providencial, de nuvens que passeiam no firmamento atenuando os rigores caloríficos da estiagem.

Aqui e ali se alteiam paradoxalmente, no espaço cinzento da paisagem, as verdes copas de juazeiros e quixabeiras, que, como uma bênção de Deus, dão com prodigalidade, sombra, flores e frutos, num verdadeiro desafio ao sol intenso e constante, que cresta os outros vegetais, notadamente arbustos e gramíneas.

As aves e os pequenos animais salvam-se com frequência, não apenas da insolação, mas também da fraqueza extrema e da morte por inanição, graças à presença dessas árvores. Elas resistem milagrosamente ao martírio da seca, parece que em favor dos gados mirins, que por sua vez dão leite e carne aos também sofridos donos ou proprietários.

Faz gosto vermos esses vegetais frondosos, que embora espinhentos, são um refrigério na vida agoniada da miunça leiteira. É que, como as abelhas bravias que defendem no tronco oco das árvores antigas o mel de sua produção, os espinhos desses vegetais impedem que a mão predatória do homem desfaça a fonte da salvação que deles brota, durante a seca em prol da criação pequena, composta de ovinos e caprinos.

No campo sensório de todos nós, há também aridez e desertos.  E há igualmente (graças de Deus), juazeiros e quixabeiras da salvação, verdadeiros oásis que são uma afirmação inequívoca da presença de Deus na Natureza.

Aqui, a aridez desértica é representada pela indiferença dos que veem, mas não sentem o sofrimento alheio, ao passo que a alma humana movida pela compaixão e pelo atendimento, configura o refrigério das árvores que abrigam os pequenos animais e as aves que as procuram.

É a força suprema de Deus, expressa na Natureza aos nossos olhos”.

(MONTEIRO, Raul Pereira. Espinhos na estrada. Campina Grande, Caravela, 1999.)


Se você gosta de ler histórias sobre "Cangaço" clique no link abaixo:

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

Nenhum comentário: