Por Rangel Alves
da Costa*
Instigante a
afirmativa de Oscar Levant: “Há uma fina linha entre genialidade e loucura. Eu
apaguei essa linha”. Não só Levant, mas muitos outros parecem ter dissipado
essa linha tênue entre a extraordinária capacidade mental e anormalidade de
conduta. Edgard Allan Poe, tantas vezes considerado como louco, certa vez
escreveu: "Resta saber se a loucura não representa, talvez, a forma mais
elevada de inteligência".
Mas a loucura
não presume inteligência, nem esta a insanidade. Talvez, isto sim, a
inteligência não perca suas qualidades e dotes de inventividade com a loucura.
Verdade é que muitos passam a expressar seus dotes artísticos quando já são
considerados loucos e tratados como tal. Arthur Bispo do Rosário - interno por
mais de cinquenta anos na Colônia Juliano Moreira - é exemplo de como a loucura
pode ser vista como porta para a expressão maior do ser.
Não se pode
alegar, contudo, que somente a insanidade do ex-boxeador e biscateiro
possibilitou o surgimento de seus dotes artísticos. Tais dotes poderiam muito
bem já estar presentes ainda na normalidade da vida. E o mais correto é que se
pense assim. Não creio que a insanidade, ao modificar as formas de agir, pensar
e se expressar, traga no seu bojo um artista com profunda e definida concepção.
Outro aspecto
relevante diz respeito ao cenário criado pela loucura e que o louco utiliza
para expressar sua arte. Certamente que a insanidade requer o surgimento de um
mundo próprio, de um espaço intimista onde as vazões da mente possam fluir sem
exigências ou impedimentos. E muitos loucos, no cotidiano das instituições
psiquiátricas, acabam transformando em arte tudo aquilo que encontram quase sem
serventia.
Os dotes da
criatividade, entretanto, não são frutos apenas dos laivos de mentes
distorcidas, afetadas psicologicamente. A Psicologia haverá de explicar que há
uma predisposição anterior ao estado de loucura que, ao invés de ser apagada,
vai sendo aprimorada pela consciência insana. E se torna arte porque flui com
mais liberdade, sem formalismos estéticos, espelhando apenas o impulso criador
que tem maior vazão em estado de desequilíbrio mental.
Tais aspectos
confrontam a afirmação de Levant, vez que esta implica em reconhecer a
confluência da genialidade e da loucura em apenas alguns seres humanos. E estes
reconhecidos muito mais como gênios do que como loucos. Para muitos, Einstein
ainda é visto como um louco, mas a grande maioria apenas como alguém de
genialidade superior. Ademais, se de gênio e louco todo mundo tem um pouco,
então continua havendo uma distorção no reconhecimento da genialidade, pois a
loucura se impõe muito mais em meio à sociedade.
A afirmação de
Levant impõe uma necessária indagação: a genialidade provoca a loucura ou
aquela é consequência dos próprios desnorteamentos mentais? A força criativa
pode ultrapassar limites tais que a mente humana se verá incapacitada de distinguir
entre o normal e a anormalidade. Noutro aspecto, a mente ativada em excesso,
tomada de impulsos atípicos, provoca alucinações tais que acabam produzindo
feitos realmente geniais.
Diz Ulrich
Kraft em texto intitulado “Sobre Gênios e Loucos”, que uma lista interminável
de artistas célebres, parte deles portadores de graves transtornos psíquicos,
parece confirmar o ponto de vista do filósofo grego (Platão, que afirmou
existir uma loucura divina propulsora da criatividade). Vincent van Gogh, Paul
Gauguin, Lord Byron, Liev Tolstói, Serguei Rachmaninov, Piotr Ilitch
Tchaikóvski, Robert Schumann - o célebre poder criativo de todos eles caminhava
lado a lado com uma instabilidade psíquica claramente dotada de traços
patológicos. Variações extremas de humor, manias, fixações, dependência de
álcool ou drogas ainda hoje atormentam a vida de muitas mentes criativas.
Todos os nomes
citados se enquadrariam no contexto exposto por Levant. Ora, são genialidades
reconhecidas e cujos limites entre loucura e genialidade não podem ser
avistados. E neste aspecto, nos parece a identificação pelo prestígio que
acabaram adquirindo. Enquanto a outra parte da humanidade, por falta de
reconhecimento, continua apenas como louca.
Poeta e
cronista
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