Por Rangel Alves
da Costa*
Sertanejo que
se preza jamais se esquece de suas raízes matutas, interioranas. E comigo não
acontece diferente. Nascido em Nossa Senhora da Conceição de Poço Redondo, na
aridez sergipana do Sertão do São Francisco, no mesmo rincão onde Lampião
tombou lá pelos idos de 38, vivo catando motivos para reviver tudo na memória.
Desde muito
que arrumei o embornal e peguei a estrada, mas nunca me acostumei na capital.
Anda e vira e me vejo caminhando por aquelas veredas espinhentas, cortando
estrada debaixo do sol, proseando com velhos e bons amigos debaixo de pé de
pau. E recordo a sua lua, o seu amanhecer, o que ainda resta do canto da
passarinhada, cada canto repleto de toda e tanta história.
Quanta coisa
boa e bonita há no meu sertão. Mesmo a modernidade que tudo faz para apagar os
costumes e as tradições de um povo, ainda assim não consegue destruir de vez a
riqueza cultural sertaneja. Não mais como antigamente, mas pelos rincões mais
distantes ainda há o som da sanfona, o forró pé-de-serra, a sertanejada chinelando
por cima do barro batido.
Até pouco
tempo havia o forró de Miltinho, onde os apreciadores do autêntico pé-de-serra
dançavam até o raiar do dia. Mas o desaparecimento do amigo deixou uma lacuna
incomparável na tradição forrozeira. E o seu forró era o que praticamente
restava da cultura sanfoneira um dia tão presente no sertão sergipano. E
forrozeiros famosos como Zé Goití, Dudu, Agenor da Barra e Zé Aleixo. Não
podendo esquecer o cantador mais aclamado na região: Zelito de Pão de Açúcar.
No silêncio da
distância onde vivo me chega a voz de Zelito. E tudo como se eu estivesse
presenciando sua cantoria em algum salão sertanejo, com o forró se derramando em
suor. E ouço aquela canção nordestina que proclamo como o mais belo e singelo
dos forrós: Chorando por alguém. Sucesso na sanfona e voz de Sebastião do Rojão
(letra de Cícero Constâncio e Sebastião do Rojão), Zelito cantarolava assim:
Olhe eu não
posso ver ninguém chorar
Porque vem
logo uma vontade em mim
Quem foi que
disse que não chora por amor
Pois os meus
olhos já chegaram ao fim
Ai quem me
dera eu ver hoje
Quem eu vi
ontem ao meio-dia
Se eu não
visse a pessoa inteirinha
Pois mesmo
assim o retrato me servia
Eu não posso
ver ninguém chorar...
Ai quem me
dera eu ter asas
Para voar o
dia inteiro
Para provar
que te amo de verdade
O meu amor só
por ti é verdadeiro
Eu não posso
ver ninguém chorar...
Eu só te peço
que volte pra casa
Não viva assim
no meio da rua
O teu chinelo,
teu vestido, teu benzinho
Tá tudo em
casa que ainda é tua
Ai, eu não
posso ver ninguém chorar
Porque vem
logo uma vontade em mim...
Juro que
entristeço quando ouço essa canção forrozeira. Avisto e ainda ouço Zelito
tocando seu pandeiro e cantarolando a vida e veia de meu sertão nas festas de
agosto de antigamente. Sei que é apenas um forró, porém daqueles tão autênticos
que só mesmo rebuscando em baús para relembrar de tempos quando o sertão era
feliz e não sabia.
Sim, uma letra
simples, sem qualquer rebuscamento poético, apenas um cantador chorando sua
saudade por alguém que ama, mas de uma força expressiva sem igual. E como vem
uma tristeza em mim...
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Se você gosta de ler histórias sobre "Cangaço" clique no link abaixo:
http://blogdomendesemendes.blogspot.com



Nenhum comentário:
Postar um comentário