Por Rangel Alves
da Costa*
Considerando-se
que o indivíduo ao nascer já caminha para a morte, bem como tal percurso pode
ser abreviado ou mais alongado, e ainda que a cada instante da existência o
organismo vai se deteriorando, surge uma inevitável e polêmica indagação: Há
vida antes da morte?
A resposta a
tal questionamento pressupõe, antes de outras considerações, que se obtenha o
entendimento acerca de outra questão: O que é a vida? Antes de possível
análise, necessário dizer que o conceito de vida normalmente considerado nada
mais é que um abstracionismo, uma divagação inexata, podendo significar tudo e
nada ao mesmo tempo.
Neste sentido
é que se fala em vida boa, e que não é o mesmo que vida longa, também se
diferenciando de vida existencial. Do mesmo modo, a vida enquanto viver possui
conotação diferente de vida enquanto presença. E daí em diante. Basta sentir a
diferença quando alguém fala em vida no sentido espiritual, existencial, e vida
no sentido de realidade.
Mas o que
seria mesmo a vida? Para muitos, nada mais é que o percurso existencial que vai
do nascimento até a morte; para outros é a condição biológica que permite com
que o homem se desenvolva até perecer; e ainda outros afirmam ser a vida o
simples ato de estar vivo, de existir.
Certamente que
o conceito de vida possui implicações outras de cunho filosófico, religioso e
científico, dentre outros aspectos. Contudo, seria percorrer um caminho longo
demais e ainda assim ser inconcluso. Por isso mesmo não será preciso ir muito
longe para encontrar uma resposta que se ajuste à indagação proposta: Há vida
antes da morte?
Num primeiro
aspecto, considerando a existência como condição biológica, creio ser possível
conceituar a vida como a força que dá sustentação ao indivíduo. E tal força
pode ser fragilizada por diversos fatores, sendo o avanço da idade, a
deterioração física e as enfermidades os principais.
Mas há outro
sentido, e neste a vida corresponde ao próprio indivíduo enquanto ser. Assim,
seria correto afirmar que vida é a condição existencial a si mesma imposta pelo
vivente. Ou seja, é o processo instituído pelo próprio homem para cumprir sua
passagem terrena. Isto porque o fato de existir nenhuma significação terá sem a
definição do que se almeja.
Nesta última
concepção, pressupondo que a vida repousa na pedra bruta da existência, e por
isso mesmo necessita ser moldada para ser vivida, logo se tem que estará na
dependência de cada indivíduo não só a sua qualidade interior de vida como a
abreviação da existência.
É, pois, a
partir destes dois sentidos que se poderá novamente indagar: Há vida antes da
morte? Antecipo uma conclusão: a cada segundo após o nascimento, a pessoa já
está percorrendo seu caminho inverso. E ainda outra: nenhum ser vivente está
completamente vivo.
A vida é menos
vida a cada segundo, a cada passo da existência; tanto mais adquirido fisicamente
mais amortecido biologicamente; tudo aparentemente perfeito para encobrir o que
internamente está sendo desfeito. Nada mais que outono é a vida. Uma estação
que vai desfolhando até se deixar levar pela ventania maior.
Ora,
compreensível que seja assim. Ao sair do útero a vida já começa a ser
fragilizada. O crescimento saudável e a robustez física não significam
integralidade da vida, no sentido de conformidade orgânica e biológica. Eis que
as células vão morrendo aos poucos, imperceptivelmente, o indivíduo vai se
fragilizando sem perceber. E morrendo lentamente.
Daí que o
jovem já perdeu muito de sua constituição originária; o adulto, imaginando-se
saudável, já está completamente tomado de mudanças orgânicas que o torna
vulnerável a todo tipo de enfermidade; e na velhice a degradação absoluta,
ainda que a compleição física faça surgir a ilusão de algum vigor.
E não se deve
esquecer o fato de que tantos se incubem de apressar o passo rumo ao fim. O
viver desregrado, os vícios e as drogas, o experimento dos pequenos venenos
existenciais, tudo isso vai apressando a perda do que ainda resta como sopro
animador da existência.
Então, há vida
antes da morte? Sim, mas jamais a vida intacta, completa, na perfeição
imaginada. Apenas uma ilusão emoldurando o ser. O passo se tornando cansaço, a
feição se transformando em marcas, os sintomas confirmando tristezas e agonias.
Eis que tanto somos, mas tão frágeis somos, que nada somos.
A exata
dimensão da vida pode ser comparada ao fósforo e à vela, ou a chama que se
acende num e noutro. O nascimento está na força da chama do fósforo após ser
aceso; e vai morrendo ao acender a vela, que é o percurso da existência. E esta
flameja até que o sopro do próprio homem permita ou se finde num instante
qualquer.
Poeta e
cronista
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