Por Rangel Alves
da Costa*
Todo cuidado é
pouco na hora de quase tudo. No que pretenda fazer, e até quando estiver
pensando, todo cuido é pouco.
Todo cuidado é
pouco na hora de nascer e de morrer. É bom não se esquecer de chorar o quanto
puder ao vir à luz, deixando um bom desconto para os tormentos que sofrerá mais
tarde; e ao morrer, através dos outros, como demonstração que passou pela vida
em sofrimento, mas ainda conseguiu realizar o possível para deixar saudades.
Todo cuidado é
pouco na hora do sorriso e da alegria. Nada em demasia, já disse uma tia. A
mesma que sempre se enchia de tristezas e aflições depois que passava os
instantes de furor e descomedimento. Depois das lições, apenas sorri sem
gargalhar, e sente alegria numa normalidade branda. Todo mundo acha que está
circunspecta quando está apenas voltada para a felicidade interna.
Todo cuidado é
pouco na hora de abrir a porta. A janela foi feita para dar segurança e certeza
ao sair, ao colocar os pés do lado de fora, ao andar. Quem abre a porta sem
antes ter visto o tempo, a rua ou o que está diante da porta, corre sempre o
risco de encontrar o que jamais desejou para aquele momento ou dia.
Todo cuidado é
pouco na hora de beijar. O beijo é gesto de afeto, de carinho, de amizade; é
sinal de estima, amor, de proximidade. Mas apenas isto. E não há que confundir
o beijo como asfixiamento, lambuzação, sucção ou desentupimento. Beijar requer
sentimento e a força para transmitir no toque do lábio uma palavra doce.
Todo cuidado é
pouco na hora do sexo. E não se fala aqui no sexo mundano, pulando o muro,
adúltero, mas no sexo cotidiano, no enlace amoroso normal. E como o ato faz
parte dos desejos humanos, nada mais lógico que o desejo e a vontade também
comandem o instinto e o corpo na hora da busca do prazer no outro. Do contrário
nenhuma resposta do outro será obtida, e porque nenhuma pergunta do querer foi
feita.
Todo cuidado é
pouco na hora de fazer amizades. É preciso sempre ler a palavra da sabedoria
para saber que a beleza da flor não lhe garante a verdadeira beleza na flor. Do
mesmo modo aquele que chega com sorriso afável nem sempre merece a mesma
confiança que o sério e prudente. A mão que lhe será negada pelo que fantasia
amizade, será a mesma mão estendida por aquele que sabe o momento de amparar.
Todo cuidado é
pouco no jeito de ser, no vestir, no se sentir mais paramentado, enfeitado e
importante que os outros. A Bíblia ensina que: Não andeis cuidadosos quanto à
vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao
vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento,
e o corpo mais do que o vestuário? Olhai para as aves do céu, que nem semeiam,
nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não
tendes vós muito mais valor do que elas? E qual de vós poderá, com todos os
seus cuidados, acrescentar um côvado à sua estatura? E, quanto ao vestuário,
por que andais solícitos? Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não
trabalham nem fiam; E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória,
se vestiu como qualquer deles (Mateus 6:25-29).
Todo cuidado é
pouco com tanta saudade que sente, com demasiadas lembranças e recordações. O
amor, a falta, o desejo do reencontro ou a dor pela ausência, são portas
abertas sempre esperando algo chegar, até o que não pode mais retornar. Mas não
se pode esquecer que tudo tem o seu tempo, tudo acontece num instante e no
outro já surge uma nova realidade. E porque nada se eterniza, deixai essa
lembrança do outro apenas como uma boa carta guardada. E somente a leia quando
estiver perto de encontrar novamente, na vida ou na morte.
Todo cuidado é
pouco com o esbanjar orgulho, vaidade e egoísmo. Lembre que tu és pó e ao pó
haverá de retornar. E muitas vezes pó que procura atingir os olhos dos outros,
turvar seus caminhos, mas que de nenhuma valia será ao encontro do vento mais
brando. E é neste momento que todo falso brilho do indivíduo esvoaça pelo ar.
Por isso mesmo
que todo cuidado é pouco. Com tudo nada vida, todo cuidado ainda será pouco.
Poeta e
cronista
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