domingo, 18 de agosto de 2013

Abolição de Mossoró na visão presunçosa de Bruno Balbino

D. Amélia Dantas de Souza Melo Galvão, esposa do grande abolicionista Romualdo Lopes Galvão.

Sérgio Ricardo da Mata, Helena Miranda Mollo e Flávia Florentino Varella (orgs.). Anais do 3º. Seminário Nacional de História da Historiografia: aprender com a história? Ouro Preto: Edufop, 2009. ISBN: 978-85-288-0061-6

Da epopeia à manipulação do fato: um balanço historiográfico sobre a Abolição da escravatura em Mossoró-RN Bruno Balbino Aires da Costa*

Esse artigo visa discutir a produção historiográfica sobre a abolição da escravidão em Mossoró-RN analisando os discursos construídos sobre o referido fato histórico percebendo o lugar social dos historiadores, ou seja, de onde falam e por que falam, uma vez que “toda pesquisa historiográfica se articula a um lugar de produção sócio-econômico, político e cultural” (CERTEAU, 2007: 6) e as relações de poder que possibilitaram o surgimento dessa escrita. Nesse sentido, analisaremos dois autores e suas respectivas obras, a saber, Raimundo Nonato e Emanuel Pereira Braz. O primeiro se caracteriza por ser memorialista e o segundo historiador de formação acadêmica. As obras de Raimundo Nonato, analisadas aqui, são frutos de comemorações e conferências realizadas na referida cidade e que tratam sobre a temática da abolição em Mossoró, enquanto a obra de Emanuel Pereira Braz é vinculada a uma produção acadêmica (dissertação) versando também sobre o feito abolicionista.

A presente discussão nos interessa devido à contribuição que julgamos dar a compreensão em torno da produção historiográfica sobre a abolição da escravidão em Mossoró-RN. Este tema nos atraiu desde o momento em que nos deparamos com um imaginário presente na comunidade local que transforma Mossoró, na Terra da Liberdade. Esta mentalidade encontra-se nos discursos políticos, nos discursos dos memorialistas, na literatura, e, na produção historiográfica local. Esses discursos orientam urbanisticamente, culturalmente e politicamente toda a cidade para um local onde a liberdade é uma de suas principais características e que formam a identidade da própria cidade.

Esta identidade da cidade se encontra alicerçado nas comemorações do dia 30 de Setembro1, na literatura, nas escolas, no feriado, na paisagem urbana através da nomenclatura dos bairros como: Abolição 1, 2 , 3 e 4, Redenção, 30 de setembro(hoje Vingt Rosado), Liberdade 1 e 2, nos estabelecimentos comerciais como: shopping Liberdade, na rádio local denominada de Libertadora, na estátua da Liberdade entre 1* Aluno do Programa de Pós-Graduação (Mestrado) em História e Espaços da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
1 Data alusiva ao dia em que a cidade de Mossoró aboliu a escravidão em 1883. Outras marcas que encontramos não só no atual cenário urbano, mas também no campo das ideias, ou seja, nas produções historiográficas em torno do referido fato histórico que permitiram criar e ao mesmo tempo preservar na memória social dos mossoroenses nomes relacionados a abolição da escravatura e a identidade da cidade.

Além dos mecanismos criados pelo poder público nas esferas urbanísticas, nas festas cívicas, no feriado, percebemos uma vasta produção historiográfica sobre os eventos históricos da cidade de Mossoró. “A Historiografia e a memória escrita passaram a se confundir como mitos, que se tornaram substratos para construções de monumentos e batismos de ruas, avenidas, povoados, auditórios” (NETO; 1997:150) ganhando na cidade “outras formas de linguagem: a dos monumentos e a das festas cívicas, projeções imagéticas e ritualísticas de uma determinada maneira de concepção da história\memória”(Ibid:72).

O marco da produção historiográfica e memorialista sobre a cidade advêm com a criação da Coleção Mossoroense em 1949. O período que marca o final da década de quarenta e os primeiros anos da década de cinquenta do século XX em Mossoró, é caracterizado pela importância que o poder político dá à cultura e a História local. Nesse sentido, a prefeitura de Mossoró, através do prefeito Dix-sept Rosado (1948-1950), cria o Museu Municipal e o Boletim Bibliográfico reunindo pesquisas, contribuições de escritores locais e, sobretudo, a divulgação de documentos de arquivos, atas da Câmara Municipal de Mossoró, contribuições sobre genealogias regionais, etnografia e o folclore. Para representar esse resgate cultural e histórico da cidade de Mossoró, o prefeito Dix-sept, convoca o seu irmão Vingt-un Rosado, para dimensionar a questão cultural e histórica da cidade. Vingt-un cria em 1949 a Coleção Mossoroense que através de suas publicações “uma historiografia aparece exaltando os heróis do passado, os pioneiros e construtores da cidade”, ( FELIPE, 2001: 91) bem como os feitos memoráveis de Mossoró. Nesse sentido, a Coleção Mossoroense não só valorizou os ‘principais’ eventos históricos de Mossoró, mas a partir deles construiu a identidade da própria cidade. Mossoró passa a ser nomeada como cidadela do pioneirismo e da liberdade. A Historiografia e a memória como ritos de recordação

Todo o debate em torno desse artigo paira na relação entre a escrita da história e a memória. Embora ambas sejam antagônicas no nível conceitual, uma vez que a memória “ é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no presente” ( NORRA, 1993:9) e que “sacraliza as recordações” ( CATROGA, 2001:39) a historiografia se constitui como uma “uma reflexão sobre a produção e a escrita da História” ( SILVA, 2006:189 ) e como “operação intelectual crítica, que desmistifica e laiciza as interpretações de modo a convencerem que a sua representação do passado é verdadeira”( POMIAM apud CATROGA: 39 )-, podemos fazer uma aproximação entre essas duas noções.

Ambas se constituem como “representações do passado fazendo o trabalho do luto e pagando as dívidas do presente em relação ao que já não é”( RICOUER apud CATROGA: 44). A historiografia se encontra com a memória no sentido de funcionar como “fonte produtora (e legitimadora) de memórias e tradições, chegando mesmo a fornecer credibilidade cientificista a novos mitos” ( Ibid, p.50 ). Tal asserção nos permite enxergar que assim como a memória, a historiografia produzida sobre a Abolição em Mossoró reinventa novos mitos e maneiras de representar o passado. Tanto Raimundo Nonato como Emanuel Braz, mesmo partindo de perspectivas diferentes, constroem nas suas narrativas novos meios de perceber o passado seja exaltando-o ou tentando desmistificando-o. Ambos tecem modos de recordar tomando ritos diferentes de apresentar a narrativa; a memória ritualiza através de um jogo construído através da memória coletiva e a historiografia realiza um trabalho de sepultamento exorcizando a morte introduzindo-a no discurso. ( CERTEAU, 2007:107).

A Abolição como apoteose

O primeiro título que analisaremos é produzido em 1983, o ano da homenagem ao centenário da abolição da escravidão em Mossoró. Seu autor, Raimundo Nonato, é autorde vários livros sobre a História de Mossoró, tais como: Lampião em Mossoró (1955 ), Terra e Gente de Mossoró (1967), Escola Normal de Mossoró (1973 ) dentre outros. A obra que estudaremos intitulada de História Social da Abolição em Mossoró (1983 ) aponta desde os primórdios da história mossoroense até as mudanças urbanísticas que acontecem na cidade durante o centenário da abolição. a abordagem sobre a temática é caracterizada pelo uso intensivo de palavras como: batalha, epopeia, glória, humanismo. E liberdade. A cidade de Mossoró é tratada como heróica, um lugar onde “a humanidaderespirava livre, como se despertasse de um pesadelo secular!” (NONATO, 1983:113).

Em todo o livro, a idéia de liberdade é trabalhada como se os libertadoresmossoroenses fossem predestinados a terem uma atitude progressista diante da desumanidade que fomentava um conflito com os senhores de escravos da nação, transformando assim, em uma verdadeira batalha pela humanidade:

Naquela data alvissareira, desencadeava-se a luta dos libertadores contra a reação esboçada pelos senhores de escravos, que nos vários pontos da Nação tentavam provocar desordens e perturbar a segurança pública, [...] para manter um estado servil de exploração de pessoas escravizadas pela força do dinheiro de uma gente desumana que tratava aqueles infelizes como bestas, simplesmente como animais irracionais. (Idem)

Além disso, há uma idéia de “solidariedade” por parte da elite rural mossoroense, da maçonaria, dos comerciantes e dos dirigentes da sociedade Libertadora Mossoroense, em que todos se encontravam unidos para a extinção da escravatura (Ibid:129). A data do dia 30 de setembro é tratada pelo autor como justificadora do orgulho mossoroense inspirado na liberdade dos seus ancestrais. É importante ressaltar que o ano do lançamento do livro está inserido no contexto da comemoração do centenário da abolição em Mossoró (1983), um período que ressalta a saga dos heróis abolicionistas através da construção de obras públicas como o Pantheon dos Abolicionistas e a realização de grandes festejos e comemorações por se tratar de uma marca importante para a história de Mossoró. Raimundo Nonato descreve assim esse momento:

A razão das festas, que a cidade de Mossoró promove todo o ano por determinação do seu Governo, de instituições e do seu povo, este ano comrenovado brilhantismo, na data do centenário da Abolição dos Escravos em Mossoró, ocorrido a 30 de setembro de 1883. (NONATO, 1983: 145-146)
O autor destaca ainda a importância desses festejos em Mossoró comparando o dia da libertação dos escravos com os elementos mitológicos buscados na Grécia Antiga como os deuses do Olimpo:

O que se passou em Mossoró, naquele dia e ano, foi um verdadeiro festival dos deuses do Olimpo, que pelos seus representantes tinham tomado conta da cidade, já então transformada no mais belo espetáculo cívico capaz de ser iluminada pelo arco-íris da liberdade, que era uma entidade nova que surgia nos céus de Mossoró. (Idem).

Raimundo Nonato narra à abolição da escravatura mossoroense como um ato heróico, humano, solidário. Em seu livro O Movimento Abolicionista de Mossoró e sua repercussão Internacional lançado em homenagem ao 10° aniversário da ESAM através da conferência na II noite de cultura em 1976, o referido autor faz um levantamento da História da abolição no Brasil buscando aspectos econômicos no início da colônia através da trajetória da transição da servidão indígena até a escravidão africana culminando nas leis que iniciaram o processo rumo à abolição que são: a lei do fim do tráfico, a lei Rio Branco, Ventre-livre, Lei do sexagenário e por fim a Lei áurea. Para ele, Mossoró estava predestinada a vivenciar a abolição da escravatura por ser uma cidade de tradição abolicionista , por possuir uma economia autônoma e possuir homens de idéias progressistas, como declara o texto abaixo:

E por que Mossoró?

A História-a grande mestra da vida- se encarregaria de responder à interrogação: Porque a cidade possuía uma tradição e uma mentalidade abolicionista. Porque dominava um círculo de autonomia econômica, estruturada numa poderosa ação de intercâmbio, que circulava através de seu comércio, o mais importante da região. Curioso é acentuar-se que, neste setor, militavam figuras de estanceiros ilustres- homens de idéias novas, egressos do Velho Mundo- todos perfeitamente integrados nos problemas da sua vida social, política e econômica. (NONATO, 1977:121).

É interessante destacar a concepção de história do autor que fundamenta sua análise tomando a história como mestra da vida indicação presente desde os romanos como o ‘historiador’ Cícero. A História para Raimundo Nonato deveria sempre trazer uma lição, uma continuidade na tradição, ensinando e cristalizando o passado;
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As ideias abolicionistas para o autor perpassavam por toda a cidade, inclusive no pensamento do povo, “o fato consagrador da vitória da campanha abolicionista, tomaria proporções de um movimento incontrolável, nascido da própria consciência do povo, e que logo se estenderia até a cidade de Mossoró.” (Ibid: 20) É preciso destacar que o autor ao se referir “do povo” expressa uma homogeneidade em que todos os Mossoroenses tiveram alguma participação do evento da abolição. Contudo, é preciso perceber que o processo de abolição do cativeiro em Mossoró se expressou em setores restritos da sociedade mossoroense como os intelectuais influenciados pelas idéias abolicionistas vindas do Ceará que chegavam até em Mossoró por meio da Maçonaria “24 de junho”. Sendo assim, a tentativa do autor em promover o ‘povo’ como participante do evento abolicionista revela seu interesse em trabalhar o fato histórico mossoroense como se fosse um feito que envolvesse toda a cidade de Mossoró. Outros segmentos da sociedade mossoroense também foram responsáveis por essa mentalidade ‘libertadora’ como os intelectuais, a maçonaria, a escola e o jornal.e acima de tudo isso, porque Mossoró havia aquilo que se chamava de agentesde opinião pública que agitavam o movimento, a exemplo do jornal, das associações de pensamento, da maçonaria, da escola, das bibliotecas, instituições que sedimentavam as idéias da abolição, irradiadas de um núcleo polarizador dos homens de cultura, bacharéis, jornalistas e poetas, todos portadores de alta formação humanística, cuja história está registrada no livro de ouro das memórias da cidade. trabalha sobre o fato no Ceará citando apenas Acarape e depois cita Mossoró como sendo a segunda cidade do Brasil no sentido de um outra província a libertar os escravos. Por fim, o autor aponta as repercussões do ato abolicionista de Mossoró no Ceará e também no internacional. (Ibid:21)

Para Raimundo Nonato o congraçamento das idéias abolicionistas fez de Mossoró “a SEGUNDA CIDADE DO BRASIL a fazer a libertação total dos seus escravos, fato verificado com cinco anos da antecipação da assinatura da Lei Áurea, a 13 de maio de 1888” (Idem ). Entretanto, o autor lamenta que a importância da abolição da escravidão em Mossoró não foi encarada com uma certa representatividade diante do Imperador D. Pedro II se comparado ao tratamento destinado a cidade de Acarape no Ceará.

Assim, enquanto cita-se, no Ceará, o telegrama do velho Imperador, felicitando a Sociedade Libertadora pelo seu sucesso alcançado no ATO do Acarape, em Mossoró, pelo feito de 30 de setembro, a manifestação de D. Pedro II fez-se ouvir, apenas numa mensagem de escassa sensibilidade e apagado afeto humano, transmitida pelo Conselheiro Lafayette, no resumo de 3 palavras do mais seco e rígido protocolo: - “Sua magestade agradece”. (Ibid:22 )

Segundo o autor a falta de interesse e de representação do evento por parte do Imperador se deu pelos dizeres que o abolicionista Almino Afonso, encarregado de mandar o telegrama avisando a Majestade, enviou ao ministro Lafayette: “Mossoró fez a Abolição dos escravos mesmo contra a vontade de vossa Magestade.”(Idem)
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Enquanto que a cidade cearense de Acarape foi lembrada com orgulho passando a constituir o capítulo da História da Província e também como um dos assuntos registrados na imprensa local, como nota alta no calendário das Comemorações cívicas do Ceará, no Rio Grande do Norte o 30 de setembro não teve o mesmo brilho, uma vez que nunca foi “devidamente exaltado por outros agentes da opinião pública, pois sua maior divulgação foi alcançada, fora das fronteiras do Estado, através dos jornais de Fortaleza, do Recife e do Rio de Janeiro” (Ibid:23). Uma das questões levantadas porRaimundo Nonato é que muitos historiadores do Rio Grande Norte como: Tavares de Lyra, Rodolfo Garcia, Tobias Monteiro e Rocha Pombo não deram credibilidade ao referido fato histórico mossoroense. Somente Luís Câmara Cascudo em seu livro História do Rio Grande do Norte (1955) é que se têm as primeiras narrativas em torno do processo da abolição da escravatura em Mossoró e sua importância para a história local.

Para ‘compensar’ essa omissão em que os primeiros historiadores potiguares tiveram ao se tratarem da libertação dos cativos em Mossoró, mas que “mais cedo ou mais tarde, alcançaria notoriedade”(Ibid:25), é que Raimundo Nonato busca encontrar a valorização do evento abolicionista através dos noticiários dos jornais do Ceará no período da abolição e também da obra “Os últimos tempos da escravidão no Brasil” do historiador norte-americano Robert Conrad2 transcrevendo essas passagens dos jornais cearenses e os trechos da obra de Conrad em seu livro O Movimento Abolicionista de Mossoró e sua repercussão Internacional (1977)

E sabe-se, então, que, estudiosos do problema vindos de outras áreas mais distantes, de Estados importantes e até do estrangeiro realizaram trabalhos cuja divulgação põe em relevo o papel da campanha dos abolicionistas de Mossoró, pelo seu significativo espírito de pioneirismo e de solidariedade. (Ibid: 25) 2 O livro do autor norte-americano Robert Conrad “Os últimos tempos da escravidão no Brasil” retrata a trajetória do fim da abolição no ceará referindo-se também sobre a abolição em Mossoró. p.27;

É interessante destacar a necessidade que o autor tem em dar o status de grandiosidade à libertação dos escravos, buscando encontrar no estrangeiro a valorização do feito mossoroense. Nesse sentido, o grande objetivo das obras de Raimundo Nonato é buscar na História, nos jornais, nos documentos, nas atas, subsídios para o enaltecimento do processo abolicionista em Mossoró.

A Criação do fato como manipulação da História Raimundo Nonato escreve suas obras para enaltecer e valorizar através da memória os feitos de Mossoró através da libertação dos escravos antes mesmo da lei Áurea. Entretanto, a obra de Emanuel Pereira Braz intitulada A Abolição da escravatura em Mossoró: pioneirismo ou manipulação do fato (1999) escrita no final da década de noventa busca uma revisão sobre o evento da abolição em Mossoró. Através de uma investigação minuciosa das primeiras atividades econômicas até o surto da economia mossoroense na segunda metade do século XIX o autor conclui que em Mossoró não se exigia uma grande concentração de escravos. Nesse sentido, o escravo caracterizava-se mais com um “agregado de terras, como um dos seus objetos de ostentação, do qual podia valer-se nos momentos de dificuldades financeiras”(BRAZ, 1999:122 ). Com o fim do tráfico externo de cativos em 1850, inicia-se o tráfico interno de escravos. Para o autor o Rio Grande do Norte, no caso da obra, a cidade de Mossoró, entraram no contexto nacional como um local onde o comércio de escravos era ativo e lucrativo através da comercialização dos escravos para as regiões dos cafezais. Isso fica claro na seguinte passagem:

Entre o final do tráfico externo e a abolição da escravidão (1888) no Rio Grande do Norte, o escravo tornou-se muito mais valioso com bem de capital do que como trabalhador, incentivado pelo lucrativo comércio de escravos que ganhou importância no Brasil como possibilidade para garantir o crescimento da produção cafeeira.(Idem)

Mas o período de longas secas permitiu que, tanto na região Norte como nas províncias do Ceará e do Rio Grande Norte, vários proprietários escravocratas vendessem seus escravos propiciando o desencadeamento de movimentos

Abolicionistas, sobretudo, no Ceará, influenciando a criação de várias sociedades próabolição, inclusive em Mossoró, com a criação da Sociedade Libertadora Mossoroense.

Emanuel Pereira analisa em sua obra as influências vindas desses movimentos abolicionistas do Ceará que chegaram até a elite de Mossoró desmistificando a idéia de pioneirismo, uma vez que “A Abolição da escravidão em Mossoró ocorreu em conseqüência do processo abolicionista que foi desencadeado a partir da vizinha província do Ceará.” (Ibid:61) A partir desse raciocínio o autor analisa como o fato histórico abolicionista foi (re)construído possibilitando a criação de um imaginário caracterizado pelo “pioneirismo” e pela liberdade sendo propagado através de festas, comemorações, inaugurações, teatros, bandeiras, hinos e obras públicas.“O fato de ter libertado os escravos cinco antes da Lei Áurea, possibilitou aos mossoroenses, as condições para que este gesto fosse perpetuado na história local com um legado a ser imitado, seguido pela posteridade.” (Ibid:123)

O referido autor discute toda uma trajetória em que o poder local através de vários mecanismos - culturais e políticos - se utilizou para constituir a abolição da escravidão como o principal acontecimento da cidade. Os diversos meios de “manipular” o evento permitem, segundo o autor, criar um imaginário no município em que Mossoró se apresenta como pioneira. O autor objetiva assim “desmistificar” o pioneirismo citando elementos econômicos como a não necessidade urgente de escravos para o trabalho na região Norte e também apontando os mecanismos de mistificação do evento abolicionista em Mossoró.

Enquanto o objetivo da obra de Raimundo Nonato se encontra em uma visão mística, progressista e heróica do referido fato histórico, Emanuel Pereira busca historicizar o processo da abolição da escravatura em Mossoró através de uma abordagem econômica da história a partir de uma perspectiva que permite entender como a valorização do evento abolicionista foi construído, propagado e mantido na memória social da população mossoroense. Para o historiador Emanuel Pereira Braz o evento da abolição em Mossoró foi propagado e consequentemente manipulado pela elite política local que se utilizou da história para respaldar as ações dos personagens políticos do presente (BRAZ, 1999:16) se apropriando e promovendo os eventos históricos da cidade para se legitimarem no poder.

REFERÊNCIAS
BRAZ, Emanuel Pereira. A Abolição da Escravidão em Mossoró: Pioneirismo ou
Manipulação do Fato. Mossoró: Fundação Vingt-Un Rosado, 1999.
CATROGA, Fernando. Memória, História e Historiografia. Coimbra: Quarteto, 2001
CERTEAU, Michel. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
2007
FELIPE, José Lacerda Alves. Invenção do Lugar: Os Rosados e o país de Mossoró.
João Pessoa: Grafset, 2001
NETO, Francisco Fagundes de Paiva. Mitologias do “país de Mossoró”. Mossoró:
Coleção Mossoroense, 1997.
NONATO, Raimundo. História social da Abolição em Mossoró. Mossoró: Coleção
Mossoroense, 1983
____.O Movimento Abolicionista de Mossoró e sua repercussão Internacional.
Mossoró: Coleção Cadernos da Caatinga, 1977
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. In: Projeto
História. São Paulo, nº 10, p. 7-28, dez. 1993.
SILVA, Kalina Vanderlei, SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos
históricos. 1. ed. São Paulo: Contexto, 2005

Enviado pelo pesquisador José Edilson de Albuquerque Guimarães Segundo

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