
Universidade Federal do Rio
Grande do Norte – UFRN, Mestranda.
Em 15 de novembro de 1889 foi
instaurada a República no Brasil. Apenas dois dias após esse acontecimento, em
17 de novembro de 1889, foi proclamada a República no Rio Grande do Norte, que
ocorreu de forma tranquila, “como se fosse a transmissão formal de cargo de um
partido a outro, [...] e não uma mudança radical de um regime político para
outro” (BUENO, 2002: 104).
No momento da proclamação da
República no Rio Grande do Norte, o personagem de destaque foi Pedro Velho de
Albuquerque Maranhão. Em torno de sua figura ocorreu a tentativa de fazê-lo
referencial, torná-lo o exemplo do homem que lutou pelo povo
norte-rio-grandense para a vitória da causa republicana. Sua imagem, assim como
no caso dos participantes do 15 de novembro, foi exaltada em livros e jornais,
e seu nome foi dado a ruas, praças e instituições (CASCUDO, 1956). Fundou o
Partido Republicano no Rio Grande do Norte em janeiro de 1889, e criou um
jornal – A República, órgão oficial do novo partido – que começou a ser editado
em julho do mesmo ano (LINDOSO, 1992). Assumiu o governo do Rio Grande do Norte
provisoriamente em 1889, e voltou ao mesmo cargo em 1892.
Agora no poder, Pedro Velho
procurou consolidar mecanismos que dessem a ele e à sua família domínio sobre o
Partido Republicano do Rio Grande do Norte e sobre o próprio Estado. Esse
partido será, por mais de vinte anos, uma propriedade exclusiva da família
Albuquerque Maranhão. Dessa maneira, podemos afirmar que Pedro Velho inaugurou
a oligarquização republicana no Rio Grande do Norte (BUENO, 2002). Pedro Velho
de Albuquerque Maranhão, além de ter aberto as portas do governo estadual para
ele e os membros da sua família, também o fez para seus partidários, isso
porque, segundo suas próprias palavras, era necessário “apartar o sangue” e indicar
alguém de fora do seu círculo familiar, porém de confiança, para conservarem-se
no poder (LINDOSO, 1992). E conseguiram, por meio da alternância de cargos
políticos, ser presença constante no poder do Estado até pelo menos 1914. Anais
do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2011 2
Esse apanhado geral dos
acontecimentos que marcaram a cena política do país e, consequentemente, do
Estado no final do século XIX e início do século XX, são importantes, pois o
período histórico abordado aqui, assim como alguns usos do poder e atos
praticados por parte da oligarquia Albuquerque Maranhão, tem seu pontapé
inicial justamente nesta fase de implantação do regime republicano, e se
desenvolverá por várias décadas a frente.
A partir de estudos e pesquisas
desenvolvidos sobre essa organização familiar, visualiza-se a força e
influência política de uma oligarquia que governou o Estado a partir de 1889,
bem como enxerga-se os reflexos do poder e influência política dos Albuquerque
Maranhão impressos em diferentes lugares espalhados pela cidade do Natal.
Ao caminhar em alguns dos
principais bairros da cidade, como Ribeira, Cidade Alta e Petrópolis, por
exemplo, é possível constatar, através de uma breve observação das praças,
prédios, ruas, bustos e estátuas, que existe uma intrínseca relação entre os
monumentos e edificações presentes nos citados bairros e os membros da família
Albuquerque Maranhão que estão imortalizados através delas. Pode-se mencionar o
caso dos espaços e monumentos dedicados a Pedro Velho de Albuquerque Maranhão,
Augusto Severo e Alberto Maranhão; Irmãos, membros de uma mesma geração e de
uma única família. Numa observação mais aprofundada, desta vez na bibliografia
ou nos jornais, nos deparamos com um novo fato: boa parte dessas obras foram
idealizadas ou executadas durante o governo de um membro dessa família,
notadamente no de Alberto Maranhão, que se tornou governador do Estado com
apenas 26 anos, beneficiado por uma reforma da Constituição do Rio Grande do
Norte em 18981. As reformas realizadas em Natal durante os governos de Alberto
Maranhão acompanharam um momento em que a elite local assimilava o espírito da
vida moderna no início do século XX. Era forte o desejo desse grupo de colocar
Natal no fluxo da modernidade do período, “alterando suas ruas, construindo
novos espaços; [mudando] as pessoas, nos seus modos de ser, nas formas de se
comportar e se divertir nas ruas, nas praças, nos jardins públicos, no teatro”
(ARRAIS et al, 2008:12, grifo nosso).
1 O governador Alberto Maranhão
esteve no poder por duas vezes: de 1900 a 1904 e de 1908 a 1914.
O professor Itamar de Souza
(1989) em A República Velha no Rio Grande dos Anais do XXVI Simpósio Nacional
de História – ANPUH • São Paulo, julho 2011 3
Norte (1889 – 1930) salienta a
obstinação desse oligarca de dar destaque aos membros da sua família. Citando
algumas características básicas do segundo governo Alberto Maranhão, o referido
autor nos informa que este “procurou imortalizar os membros ilustres da
oligarquia apondo seus nomes em municípios, repartições públicas, monumentos e
praças [...]” (SOUZA, 1989: 129, grifo nosso). Tal fato pode ser confirmado
quando constatamos que foi durante o governo de Alberto Maranhão, em 1909, que
o busto de seu irmão Pedro Velho foi inaugurado no então Square Pedro Velho
(atual Praça das Mães). A Praça Pedro Velho foi idealizada por Alberto Maranhão
para receber esse busto. A ideia era que ele ficasse provisoriamente no Square.
Mas, essa “provisoriedade” durou quase 50 anos. O busto só fora transferido
para a tal praça no ano de 1956, num dia “apressado e tumultuoso” que reuniu a
presença civil, militar e estudantil, durante o governo de Sylvio Piza Pedroza,
sobrinho-neto de Pedro Velho (CASCUDO, 1956).
Outro irmão do governador Alberto
Maranhão imortalizado através dos monumentos foi Augusto Severo. Este ganhou,
em maio de 1913, uma praça com seu nome e uma estátua de bronze, por ocasião do
décimo primeiro aniversário da sua morte. Esta praça, chamada anteriormente de
Praça da República, já foi um dos mais importantes endereços de Natal. Nesta
área da cidade, encontra-se o Teatro Alberto Maranhão e o antigo prédio do
Grupo Escolar Augusto Severo. Os melhores e mais luxuosos hotéis ficavam
circunscritos nesse logradouro, além do cinema, o Polytheama. A Estação
Ferroviária também estava na Praça Augusto Severo. O porto de Natal fica bem
próximo dela. Essa praça era o primeiro local visto pelos passageiros que
desembarcavam na cidade.
Quanto ao próprio Alberto
Maranhão, este criou, no município de Nova Cruz/RN, um grupo escolar com seu
nome. Na cidade do Natal, já existia uma rua homônima. O teatro - importante
espaço de socialização e cultura - à época de seu governo, se chamava Carlos
Gomes. Mas, em 1957, o então prefeito de Natal, Djalma Maranhão, alterou o seu
nome para o que conhecemos até hoje: Teatro Alberto Maranhão.
Segundo o professor Renato
Peixoto (2010: 190, grifo nosso), Anais do XXVI Simpósio Nacional de História –
ANPUH • São Paulo, julho 2011 4
As construções que diziam e
explicitavam a cidade de Natal passaram, na verdade, a articular uma unidade a
partir do imaginário que então se precisava tornar comum a todos. […]
A Natal republicana foi
construída ao lado da antiga […] e sobre essa nova cidade se inscreveram
topônimos que espelhavam a manifestação do novo imaginário, inscrevendo também
sobre ela a organização familiar natalense.
A implantação do regime
republicano (e, consequentemente, a consolidação do poder dos Albuquerque
Maranhão) acabou por instalar nas elites norte-rio-grandenses um desejo de
reorganização da cidade, como se esse novo sistema político trouxesse o
despertar do progresso, tirando o Estado da sua posição de “esquecido”. A
partir desse discurso, Alberto Maranhão remodelou a capital potiguar - símbolo
de atraso e falta de ordem - vinculando o nome de sua família a uma cidade nova
e moderna, alcançando o imaginário popular, dando visibilidade aos feitos e aos
membros da sua estirpe. Através da sua espacialização e monumentalização na
cidade do Natal, percebe-se a tentativa de perpetuação da memória de uma
família que teve um papel significativo na política norte-rio-grandense no
final do século XIX e até segunda década do século XX. Tais modificações
ocorreram especialmente durante os governos de Alberto Maranhão que, através
dessas práticas, “[procurou] ocupar os espaços emocionais no coração de seus
correligionários” (SOUZA, 1989: 130, grifo nosso). Foi no transcurso de seus
governos que se deu um forte impulso de modernização e desejo pelo novo por
parte das elites que acreditavam que “o regime republicano […] teria aberto as
portas da cidade de Natal ao dinamismo do século XX” (ARRAIS et al, 2008: 28)
e, dentro dessa perspectiva, o então governador, utilizando-se dos espaços e
monumentos, aproximou-se do imaginário, levando-nos a inferir que “Natal não
[foi] verdadeiramente urbanizada, mas construída” (PEIXOTO, 2010: 190, grifo
nosso).
A edificação de monumentos
cívicos e históricos foi uma constante a partir da segunda metade do século XIX
e boa parte do século XX, à medida que a construção da identidade nacional
exigia a evocação do passado histórico baseada em feitos e fatos que tinham
como destaque os "filhos ilustres" da nação ligados, em sua maioria,
aos setores dominantes da sociedade. Assim, por meio da edificação de
monumentos, Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo,
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objetivava-se construir uma
"memória da nação" (ORIÁ, 2001: 2). A produção dos espaços e
monumentos da cidade era uma realização saída da estrutura estatal. Nesse
contexto, os recursos públicos eram investidos em obras que conferissem a
cidade uma imagem adequada aos valores de modernização que se desenvolviam no
início do século XX.
De acordo com o período
histórico, e com a oportunidade e conveniência das elites políticas dominantes,
era necessário construir um novo imaginário político e se apoderar do controle
dos meios que formam e guiam a imaginação coletiva, impregnando as mentalidades
com novos valores. Tal fato concorda com as palavras de Baczko (1985) que nos
diz que, especialmente o poder político, se rodeia de representações coletivas,
e este tem, como importante lugar estratégico, o domínio do imaginário e do
simbólico. Os monumentos ocupam um lugar muito importante dentro desse quadro,
visto que, como símbolos, introduzem “valores, modelando os comportamentos
individuais e coletivos” (BACZKO, 1985: 311). Dessa maneira, o novo poder
fortalece a sua legitimidade. Para Baczko (1985: 310) “qualquer instituição,
designadamente as instituições políticas, participa […] de um universo
simbólico que a envolve e constitui seu quadro de funcionamento”.
Pode-se perceber esse interesse
pelo domínio do simbólico no governo de Alberto Maranhão evidenciado na
espacialização e monumentalização da sua família. Desde seu primeiro governo,
Alberto Maranhão fez diversas homenagens aos seus parentes. Seu pai, seu sogro,
seus irmãos e ele mesmo, tiveram seus nomes dados a ruas, praças, instituições
públicas e municípios, além de ter criado um feriado (12 de maio) em homenagem
ao seu irmão Augusto Severo. Dessa maneira, Alberto Maranhão buscou imortalizar
a memória de um grupo social que teve grande notoriedade em momentos
significativos da política potiguar. Para alcançar tal objetivo, utilizou-se de
práticas modernizantes inserindo “Natal num conjunto de ideias, valores e
sentimentos que se espalhavam por todo o Globo, entre o final do século XIX e o
início do século XX” (ARRAIS et al, 2008: 23). Suas práticas não foram
incomuns, visto que, as memórias são construções dos grupos sociais e são estes
que determinam o que deve ser lembrado e as formas pelas quais serão lembrados.
As práticas de Alberto Maranhão
não passaram despercebidas, sendo alvo de Anais do XXVI Simpósio Nacional de
História – ANPUH • São Paulo, julho 2011 6
críticas por parte da oposição
que não deixava escapar a oportunidade de censurá-lo. Na inauguração do
“Hospital da Caridade Jovino Barreto”, por exemplo, o jornal da oposição,
Diário do Natal, falou sobre a escolha do nome do novo estabelecimento:
A denominação do Hospital de
Caridade [...] foi substituído, agora, pelo de Hospital Juvino Barreto, em
homenagem ao falecido sogro do Dr. Alberto Maranhão. [...]
João Maria, sim, devia
denominar-se o hospital de caridade de Natal. Juvino Barreto, não. É uma
engrossa aos vivos, como engrossa são também aquelas inscrições que se leem
sobre as portas das enfermarias do novo hospital — Enfermaria Santo Alberto,
Enfermaria Santa INEZ. [...]
Já temos praça Pedro Velho,
monumento Pedro Velho, Vila Pedro Velho, Praça Augusto Severo, Vila Augusto
Severo, Avenida Augusto Lira, Avenida Alberto Maranhão, Avenida Amaro Barreto,
Avenida Juvino Barreto, e agora, mais Hospital Juvino Barreto e Enfermaria
Santo Alberto e Santa Inez.
Oh! gente vaidosa! (MEDEIROS,
1959)
A 'vaidade' do governador, assim
como as práticas políticas da oligarquia Maranhão – como, por exemplo, o
controle dos cargos administrativos e postos de comando - foram alvos de
embates entre estes e os grupos contrários, que buscavam alcançar o poder que
naquele instante era ocupado pela “Família do Tesouro” (SOUZA, 1989: 126) 2.
2 O autor menciona a expressão “a
Família do Tesouro” como sendo usada pela oposição para se referir aos membros
da família Albuquerque Maranhão, visto que esta encontrava-se “[...] bem
arrumada nos melhores e mais importantes cargos”.
O momento da montagem da nova
estrutura política do Estado no início do regime republicano não poderia ser
tranquilo, visto que, as situações conflituais entre os poderes concorrentes
estimulam a invenção de novas técnicas de combate pelo domínio do imaginário.
Pleiteando o mesmo posto, esses poderes visam à constituição de uma imagem
desvalorizada do adversário, buscando invalidar a sua legitimidade. Do outro
lado, exaltam o poder cuja causa defendem, através de representações
engrandecedoras a fim de obter o maior número possível de adesões (BACZKO,
1985). Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho
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Diante de todo o quadro exposto
até então, algumas questões fundamentais podem ser pensadas. A primeira
perpassa sobre a discussão da luta entre os poderes concorrentes mencionada no
parágrafo anterior; reflete se a espacialização e monumentalização do grupo
familiar abordado aqui foi ou não, uma prática comum a outros grupos ou
exclusiva deste. A segunda, diz respeito à escolha dos espaços e monumentos
para uma tentativa de perpetuação da sua memória. A reflexão em tais pontos é
fundamental para um estudo aprofundado do tema, visto que a leitura crítica dos
monumentos históricos permite-nos compreender as lutas simbólicas travadas
entre os grupos sociais na construção do imaginário, que pode ser visto como
uma tentativa de transformar elaborações mentais em coisa material ou palpável
(MICELI, 1989), fazendo da memória “um meio de os sujeitos do presente se
reconhecerem nos fatos do passado” (ALBUQUERQUE JR, 2009: 93), prolongando-o
“para o presente e, quem sabe, fazer dele também o futuro” (ALBUQUERQUE JR,
2009: 95).
Temas que abordam
memória/imaginário e o papel que os monumentos desempenham dentro da construção
dos espaços (e o contexto histórico em que estes são produzidos) também
precisam ser levados em conta na discussão desse importante estudo, visto que
cada sociedade traz consigo uma definição do homem, ao mesmo tempo que se dota
de uma ideia de imaginação. Todas as épocas tem sua modalidade específica de
imaginar, reproduzir e renovar o imaginário. Desde a Antiguidade, o homem faz
uso de “suportes” de memória, saindo do plano mental, passando para o material.
À pedra e ao mármore era acrescentado “um caráter de publicidade insistente,
apostando na ostentação e na durabilidade dessa memória lapidar e marmórea” (LE
GOFF, 1990: 373). Quando as cidades se constituíram como organismos políticos
conscientes da sua força, quiseram exaltar seu prestígio, valorizando sua
origem e seus fundadores. Os monumentos foram, dessa maneira, instrumentos
eficazes para se alcançar tal objetivo, contribuindo assim para a construção do
imaginário, pois transmitiam a ideia de grandiosidade dos personagens
retratados e dos seus “grandes feitos”. Com a Revolução Francesa e sua vasta
produção simbólica (festas cívicas, bandeira tricolor, a Marselhesa, a imagem
feminina), formou-se um exemplo de instalação de um novo imaginário social que,
através de seus símbolos, cultos e ritos, traduzia e guiava o fervor coletivo,
consolidando um novo consenso estabelecido, com base numa nova organização
social. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho
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Os monumentos não possuem apenas
fins estéticos, são dotados de sentido político e devem ser entendidos tanto
como representações materiais que integram a paisagem construída, como textos
de fácil leitura que transmitem mensagens simbólicas. No final do século XIX e
início do século XX, cidades europeias e americanas ganharam diversos
monumentos. Boa parte dessas construções participavam de um processo e de um
discurso de remodelação e embelezamento dos espaços urbanos das cidades. Tais
construções podem ser consideradas representações materiais de processos
econômicos, sociais e políticos desse período - marcado por grandes
transformações. Os monumentos objetivavam alcançar o espaço imaginário e o
fortalecimento de identidades, glorificando o passado e as histórias heroicas,
legitimando as práticas políticas vigentes no momento de sua produção,
justificando ações, provando que aqueles que ocupam o poder não agem
aleatoriamente.
Segundo Carvalho (1990), a
manipulação do imaginário social é muito importante em momentos de redefinição
de identidades coletivas. Falando sobre a escolha dos monumentos para se
alcançar o imaginário popular de diferentes classes ou graus de instrução, o
referido autor afirma que: É por meio do imaginário que se
pode atingir não só a cabeça mas, de modo especial, o coração, isto é, as
aspirações, os medos e as esperanças de um povo. É nele que as sociedades
definem suas identidades e objetos, definem seus inimigos, organizam seu
passado, presente e futuro (1990: 10, grifo nosso).No caso específico do Rio Grande
do Norte, o interesse pelo domínio do imaginário e, consequentemente, a sua
manipulação, podem ser notados desde a produção historiográfica tradicional até
as edificações erguidas na capital. Falando sobre as condições de produção das
construções espaciais identitárias no Rio Grande do Norte, Peixoto (2010: 169,
170) informa que essas devem ser entendidas enquanto esforços Anais do XXVI
Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2011 9
Que fizeram parte de uma
estratégia destinada a consolidar o poder de uma 'organização familiar' nova
que enraizou seus interesses no aparelho do Estado apenas a partir das
condições tornadas possíveis pelo advento da República. [...] Como essa história
foi produzida e construída diretamente pelos integrantes da nova organização
familiar ou por elementos agregados a partir de certas instituições legitimadas
ou prestigiadas no processo, seus eventos, personagens e processos derivam de
escolhas e eleições capazes de legitimar o novo arranjo político.
A história local passou a ser
produzida diretamente pelos integrantes da nova organização familiar que
dominava o poder, legitimando a nova organização política do Estado. Isso fica
claro, por exemplo, quando constatamos que foi um membro da família Albuquerque
Maranhão – Augusto Tavares de Lyra – que se tornou o primeiro historiador do
Rio Grande do Norte, e aqueles que lhe sucederam acabaram por receber sua
influência, repetindo temas e interesses defendidos por ele (PEIXOTO, 2010).
A partir da análise do discurso
de modernização vigente no final do século XIX e início do século XX, período
em que as elites locais assimilavam o espírito da vida moderna, e associando
esse contexto à espacialização e monumentalização promovidas durante os
governos de Alberto Maranhão, pode-se concluir que suas preocupações
voltaram-se para o domínio de um novo espaço, o visível, de leitura mais fácil,
alcançando o imaginário popular, chegando aos seus corações, não ficando
restrito ao campo dos discursos, com seu alcance reduzido a uma parcela mínima
da população.
Segundo Baczko (1985), o
dispositivo imaginário promove a adesão a um sistema de valores e intervém nos
processos de interiorização pelos indivíduos, modelando os comportamentos. Para
obter o controle da vida coletiva, o imaginário social é uma peça eficaz no
exercício da autoridade e do poder, visto que, exercendo um poder simbólico,
reforça-se a dominação pela apropriação dos símbolos.
Dentro desse quadro de luta no
campo ideológico, consolidando e fortalecendo poderes, Le Goff (1990: 426,
grifo nosso) assevera que
A memória coletiva foi posta em
jogo de forma importante na luta das forças sociais pelo poder. Tornarem-se
senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das
classes, dos grupos, dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades
históricas. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo,
julho 2011 10
Analisando as práticas dos
Albuquerque Maranhão, pode-se enxergar as ideias acima expostas de maneira
clara. Tanto na historiografia quanto nos espaços e monumentos, percebe-se a
tentativa de perpetuação de uma memória familiar, objetivando fortalecer e
justificar seu poder, tornando-os assim, senhores da memória
norte-rio-grandense.
Partindo de um discurso
modernizador, de confiança no progresso técnico e científico e de um forte
desejo de mudança capaz de dar a capital potiguar a expressão que ela não teve
durante todo o século XIX, os membros dessa organização familiar, conscientes
da eficácia dos monumentos, utilizaram-se deles para imprimir na cidade sua
marca e seu nome, imortalizando-se, espacializando-se e monumentalizando-se nas
novas construções e transformações que a paisagem da cidade sofria, atendendo
aos anseios vigentes à época de seu domínio. Ao analisarem-se as práticas
discursivas dos Albuquerque Maranhão, seu contexto histórico e suas condições
de produção, percebem-se como estas foram moldando os espaços da cidade do
Natal objetivando a construção e perpetuação de uma memória, notando-se o forte
interesse pela dominação do espaço imaginário, refletido no espaço urbano da
cidade do Natal.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ALBUQUERQUE JR, Durval Muniz de.
A Invenção do Nordeste e Outras Artes. 4. ed. rev. São Paulo: Cortez, 2009.
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BUENO, Almir de Carvalho. Visões
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CASCUDO, Luis da Câmara. Vida de
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LE GOFF, Jacques. História e
Memória. Campinas: Ed. UNICAMP, 1990. Anais do XXVI Simpósio Nacional de
História – ANPUH • São Paulo, julho 2011 11
LINDOSO, José Antônio Spinelli.
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sob o título Da Oligarquia Maranhão à Política do Seridó; O Rio Grande do Norte
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MEDEIROS, Tarcísio. Ontem,
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Acesso em: setembro 2010.
ORIÁ, Ricardo. A História em
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Acesso em: agosto 2010.
PEIXOTO, Renato Amado.
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SOUZA, Itamar de. A República
Velha no Rio Grande do Norte (1889 – 1930). Brasília: Senado Federal, 1989.
Enviado pelo pesquisador José Edilson de Albuquerque Guimarães Segundo
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