Por: Rangel Alves
da Costa(*)
Bem poderia
dizer, minha negra linda, como dito por Sulamita no Cântico dos Cânticos: Sou
negra e formosa, ó filhas de Jerusalém, como as tendas de Cedar, como as
cortinas de Salomão...
Olhos de lua e
pele na beleza da noite. Negra, negra linda. E por mais dizer: a mulher sem véu
e na pureza cristalina da ternura.
Um dia ela
passou por mim; outro dia eu passei por ela. Espero ansiosamente o dia que haja
um encontro sem que ela venha e eu vá, mas de dois que caminham sabendo o que
desejam encontrar.
Não possui
olhos de lua não. Seu brilho depende do estado de espírito, do sorriso na alma,
do contentamento a que se entrega. Na última vez que a vi, seus olhos possuíam
um brilho encantadoramente diferenciado. Será que quer namorar comigo?
Não, negra
linda, não me queira ainda como namorado não. E não antes que eu escreva os
poemas que preciso eternizar, não antes que eu busque mil flores no jardim,
jamais antes que eu faça uma serenata debaixo de sua janela. E também não antes
que me faça merecedor do seu amor.
Tenho pensado
muito em você, negra linda. Gosto de avistá-la com a ventania desgrenhando seu
cabelo levemente encaracolado; gosto de vê-la mordendo a maçã e ficar com batom
da fruta nos lábios; gosto quando olha a paisagem do entardecer e sorridente
abre os braços.
Negra linda,
minha negra. Já percebi que gosta de usar adornos e bijuterias, mas tudo tão
simples e bonito que parecem artesanalmente feitos para o seu jeito de ser.
Miçangas, colar de conchas, pluma de avestruz como brinco, uma flor no cabelo.
Por que tanto
gosta de andar descalça, saltitante em cima das pedras nuas? Ah, se essa rua,
se essa rua fosse minha, eu mandava, eu mandava ladrilhar, com pedrinhas, com
pedrinhas de brilhantes...
Encomendei uns
presentinhos e acho que haverá de gostar. Estou esperando uma concha de mar sem
segredos, uma rede bonita de corda de caroá, uma garrafa trazida pelas águas e
com uma carta de amor bem antiga, uma folha ainda com o orvalho, uma cuia de
araçá bem docinho.
Mas queria
mesmo presenteá-la com um pedaço de nuvem, um buquê de estrelas, um jardim de
primavera, um sol no meio da noite, uma lua cheia antes do entardecer. Tudo
isso você bem merece.
Ontem passei
por aí e joguei por sua janela um papelzinho embrulhado. Procure-o se não
encontrou ainda. Encontre, pois é um poema escrito enquanto a chuva caía e eu
imaginava você debaixo dela, dançando a alegria da vida.
Açaí amora sem
roupa
bela nudez de
mulher
minha negra
linda
e seu jardim
florido
me fazendo
faminto
me fazendo
sedento
ávido por
beijar a fruta
no virgem
pomar
doce sabor de
desejo
um suave
saborear
mel que na
boca festejo
gosto sublime
de amar.
Eis, negra
linda, o que consegui escrever e chamei de poema. Não sei se vai gostar ou não,
mas tenho certeza que ficaria bem melhor se eu o declamasse como um segredo,
bem pertinho de sua face.
Mas também
corria o risco de apenas dizer “te amo”.
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e cronista
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