sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

O QUE ESCREVER PARA SER LIDO (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

O QUE ESCREVER PARA SER LIDO

Verdade é que não é fácil escrever, e muito menos ser lido. E não é fácil escrever se o que se pretende na escrita é algo compromissado com três aspectos principais: um texto gramaticalmente aceitável, uma ideia que justifique uma leitura e, finalmente, alcançar o leitor.

Produzir um texto gramaticalmente aceitável implica em, ao menos, não incorrer em erros grosseiros de concordância, de grafia, de impropriedade vocabular, de acentuação. Ao menos isso. Não significa, contudo, que o texto tenha de ser um primor na utilização das normas da língua-padrão.

Um texto que justifique uma leitura pode, muito bem, ser escrito sem atenção às exigências da gramática normativa. O que importa, aqui, é o conteúdo, a ideia representada, o que o escritor criou como pano de fundo. Ora, uma boa história, uma crônica atraente, se perfaz pelo que está expresso e não pela forma de expressão. Do contrário se teria Guimarães Rosa como uma aberração da língua.


Por sua vez – e talvez seja o aspecto mais difícil para quem escreve -, surge o alcance do leitor como objetivo maior de qualquer escrita. Um texto gramaticalmente primoroso, porém técnico e burocrático demais, nem sempre alcançará um grande número de leitores. Estes, infelizmente, na maioria das vezes não estão nem aí para o cultismo ou o conceptismo textual, mas simplesmente para a atratividade que o mesmo provoca.

Daí que não adianta – se o que se pretende é alcançar um número razoável de leitores – buscar a todo custo ser um autor de linguagem e gramática primorosas e tentar impor um texto acadêmico, quando o leitor anseia por uma leitura graciosa, alegre, com linguajar cotidiano, contendo situações rotineiras.

Portanto, não é fácil querer ser lido sem adequar sua escrita às aspirações dos leitores. Há de observar-se que os textos voltados para sites literários possuem características diferenciadas daqueles voltados para os livros ou jornais. Dificilmente alguém chega em busca de um tema específico. Comumente lança o olhar sobre as últimas publicações e vai clicando no texto de nome agradável, chamativo ou com tema recorrente ou sensacionalista.

Outra verdade é que o esforço para produzir algo que instigue à leitura poucas vezes é recompensado. Por mais que o esforço de quem escreve seja descomedido, buscando por todas as formas repassar linhas inteligentes e coerentes, ainda assim estará à mercê do tipo de leitor que de repente lance o olhar sobre o texto.

Muitas vezes um texto é escrito e reescrito, recortado, acrescido, remendado, até que enfim o autor chegue a um termo considerado bom. E isso é processo de dias, de noites em claro, de muitas horas solitárias diante da velha máquina ou do teclado do computador. Mas no instante seguinte, assim que o texto é publicado, ninguém dá qualquer importância.

Isso é terrível para quem tanto se esmerou para produzir algo que merecesse uma leitura, uma apreciação crítica, um comentário elogiável talvez. Ou mesmo um deslavado deboche. E mais doloroso ainda quando o texto foi original, não cuidou de bobagens, tratou de temas relevantes, contou uma história bonita, enfim, tudo tinha para ser apreciado.

Ora, o que mais entristece o escritor compromissado não é o número de leituras nem as críticas que possam ser feitas, mas simplesmente perceber que as banalidades literárias são infinitamente mais apreciadas do que um texto que, por exemplo, abordou acerca da solidão como fonte de criatividade literária ou sobre o memorialismo como base da ficção.


Mas não precisa escrever um texto profundo, permeado por ideias difíceis de entendimento para a maioria dos leitores. Crônicas inteligentes, textos que abordem assuntos cotidianos deveriam ser mais lidos, mais apreciados. Mas não. O que se vê é que muitas vezes o escritor nem sabe mais o que escrever para alcançar qualquer tipo de público. E eis o maior dilema: rebaixar a qualidade de sua escrita para ser lido?

Rebaixar a qualidade do que escreve, quando muitas vezes nem sabe a qualidade do que escreve, seria reduzir à insignificância a capacidade criativa. Um passo importante seria se imaginar como alguém que é capaz de criar e escrever cada vez melhor. Contínuo aprimoramento, eis o toque de Midas.

Talvez o presente texto alcance somente um ou outro leitor. Não importa. A egolatria de quem escreve sempre lhe servirá como maior conforto. Se quem escreve não cultua o que produz não haverá mais razão para tecer a primeira linha.
  
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.


Poeta e cronista
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