Por: Rangel Alves da Costa(*)
DOCE
E TRISTE DEZEMBRO
Hoje é o
primeiro dia desse mês que é o último do ano. Dezembro deveria ser em outubro,
e este em agosto. Dez meses, dezembro; oito meses, outubro. Mas optaram por
calendário diferenciado, então que assim seja.
Mas a verdade
é que dezembro - este mesmo de fim de ano e que começa agora - é mês
diferenciado de todos os demais. É doce, é acre; é festeiro, é
solitário; é encontro, é desencontro; é comemoração, é entristecimento.
É porta
fechada e janela aberta, é estrada e sua curva ao longe, é vermelho da tarde
que vai sombreando até surgir o amarelado da lua, é um outono desfolhado para o
surgimento das reluzentes folhas das novas estações. É um velho com semblante
de criança, alguém cansado da estrada e que de repente começa a voar.

Certa vez um
velho bardo das brumas do tempo escreveu: “Os anos são vidas sempre renascidas.
Nasce janeiro, criança; morre velho, dezembro. Mas antes de morrer já vai
renascendo, e quando vai fechando os olhos para o seu fim, eis que as luzes
despertam chamando o novo menino à vida”.
Dezembro é mês
da alma, do espírito, do ser em toda sua profusão. Em nenhum outro período o
ser humano possui maior capacidade de refletir, de encontrar e reencontrar-se
consigo mesmo, de meditar sobre alicerces e realizações, de se olhar no espelho
da vida e do tempo.
Não há um ser
humano que não sinta um aspecto diferente no ar, no tempo, no vento. Surge uma
melancoliazinha boa, um entristecimento suportável, uma serenidade que vai
acalmando os ânimos, um senso mais humanista em cada coração endurecido ou
petrificado.
Em grande
parte das pessoas acontece assim, e a outra parte deveria se juntar ao
solidário momento. Não há oportunidade mais
propícia para que cada um faça revelar seu lado afetuoso e sentimental,
mostrando ao próximo que o ser da luta é também é também o do compartilhamento.
Verdade é que
as pessoas deveriam aproveitar mais as possibilidades que o mês oferece. Sim,
virão as festas, as compras, as reuniões com os amigos, as brincadeiras de
amigo secreto, as mesas tantas vezes fartas. Mas nem só de festa nem de pão
vive o homem. E o período chama a desejar muito mais.
E desejar
principalmente prestar contas dos próprios atos, abrir o diário da realidade,
não temer em lançar o olhar sobre as ações praticadas. Porque não plantou
pedras nem semeou espinhos, certamente buscará felicidade e contentamento nas
realizações. E é esta visão do positivamente realizado que conforta e alimenta
o homem para os passos seguintes, para o novo ano.
Antigamente,
ou num passado recente, o período era mesmo assim, entremeado de
espiritualidade e reflexões intimistas. Não só os cultos religiosos, a fé
renovada pela ideia de renascimento, as luzes piscando as simbologias cristãs,
mas principalmente o coração mais enternecido do homem, é que transformavam
esses dias num templo de serenidade e paz.
Com o ano
terminando, as conquistas sendo comemoradas, as perdas transformadas em
superação, então o indivíduo tinha motivos para expressar toda a sua
satisfação. Comprar lembrancinhas, arrumar presépios, endereçar cartões de
natal, planejar a ceia familiar, tudo se transformava num cotidiano mágico e
prazeroso. Mas também doloroso, triste, muito triste.
E muito triste
por diversas razões. Das janelas abertas surgem melodias mais tristes, pessoas
solitárias arrumam suas pequenas árvores, mãos ajeitam na parede o calendário
seguinte, uma estrela brilhosa é avistada no alto de um prédio. Não há como não
saber que o natal se aproxima.

E é esta
perspectiva de natal que chama à reflexão, que vai fazendo com que as pessoas
comecem a pensar que certamente aquela será uma data diferente, eis que pessoas
que brindaram a passagem do ano já não estarão mais ali, eis que muito mudou de
ontem pra hoje, eis que a vida é uma incansável luta para chegar até o momento,
o fim de ano.
E
ultrapassá-lo. E justificar com ações a dádiva de permanecer.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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