sábado, 1 de dezembro de 2012

DOCE E TRISTE DEZEMBRO (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

DOCE E TRISTE DEZEMBRO

Hoje é o primeiro dia desse mês que é o último do ano. Dezembro deveria ser em outubro, e este em agosto. Dez meses, dezembro; oito meses, outubro. Mas optaram por calendário diferenciado, então que assim seja.
Mas a verdade é que dezembro - este mesmo de fim de ano e que começa agora - é mês diferenciado de todos os demais. É doce, é acre; é festeiro, é solitário; é encontro, é desencontro; é comemoração, é entristecimento.
É porta fechada e janela aberta, é estrada e sua curva ao longe, é vermelho da tarde que vai sombreando até surgir o amarelado da lua, é um outono desfolhado para o surgimento das reluzentes folhas das novas estações. É um velho com semblante de criança, alguém cansado da estrada e que de repente começa a voar.


Certa vez um velho bardo das brumas do tempo escreveu: “Os anos são vidas sempre renascidas. Nasce janeiro, criança; morre velho, dezembro. Mas antes de morrer já vai renascendo, e quando vai fechando os olhos para o seu fim, eis que as luzes despertam chamando o novo menino à vida”.

Dezembro é mês da alma, do espírito, do ser em toda sua profusão. Em nenhum outro período o ser humano possui maior capacidade de refletir, de encontrar e reencontrar-se consigo mesmo, de meditar sobre alicerces e realizações, de se olhar no espelho da vida e do tempo.

Não há um ser humano que não sinta um aspecto diferente no ar, no tempo, no vento. Surge uma melancoliazinha boa, um entristecimento suportável, uma serenidade que vai acalmando os ânimos, um senso mais humanista em cada coração endurecido ou petrificado.

Em grande parte das pessoas acontece assim, e a outra parte deveria se juntar ao solidário momento. Não há oportunidade mais propícia para que cada um faça revelar seu lado afetuoso e sentimental, mostrando ao próximo que o ser da luta é também é também o do compartilhamento.

Verdade é que as pessoas deveriam aproveitar mais as possibilidades que o mês oferece. Sim, virão as festas, as compras, as reuniões com os amigos, as brincadeiras de amigo secreto, as mesas tantas vezes fartas. Mas nem só de festa nem de pão vive o homem. E o período chama a desejar muito mais.

E desejar principalmente prestar contas dos próprios atos, abrir o diário da realidade, não temer em lançar o olhar sobre as ações praticadas. Porque não plantou pedras nem semeou espinhos, certamente buscará felicidade e contentamento nas realizações. E é esta visão do positivamente realizado que conforta e alimenta o homem para os passos seguintes, para o novo ano.

Antigamente, ou num passado recente, o período era mesmo assim, entremeado de espiritualidade e reflexões intimistas. Não só os cultos religiosos, a fé renovada pela ideia de renascimento, as luzes piscando as simbologias cristãs, mas principalmente o coração mais enternecido do homem, é que transformavam esses dias num templo de serenidade e paz.

Com o ano terminando, as conquistas sendo comemoradas, as perdas transformadas em superação, então o indivíduo tinha motivos para expressar toda a sua satisfação. Comprar lembrancinhas, arrumar presépios, endereçar cartões de natal, planejar a ceia familiar, tudo se transformava num cotidiano mágico e prazeroso. Mas também doloroso, triste, muito triste.

E muito triste por diversas razões. Das janelas abertas surgem melodias mais tristes, pessoas solitárias arrumam suas pequenas árvores, mãos ajeitam na parede o calendário seguinte, uma estrela brilhosa é avistada no alto de um prédio. Não há como não saber que o natal se aproxima.


E é esta perspectiva de natal que chama à reflexão, que vai fazendo com que as pessoas comecem a pensar que certamente aquela será uma data diferente, eis que pessoas que brindaram a passagem do ano já não estarão mais ali, eis que muito mudou de ontem pra hoje, eis que a vida é uma incansável luta para chegar até o momento, o fim de ano.

E ultrapassá-lo. E justificar com ações a dádiva de permanecer.
  
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE. 

Poeta e cronista
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