Material do acervo do historiógrafo e pesquisador Rostand Medeiros
Marco Archer, o Curumim, em foto
de 1979 – Foto de José Vital
Ao realizar uma pequena pesquisa
na internet em relação à morte por fuzilamento do carioca Marco Archer Cardoso
Moreira eu comecei a me interessar pela trajetória esportiva deste homem. Mas
percebi que pouco se falou dessa fase de sua vida. Sem dúvida a mais positiva e
que lhe daria certamente um destino muito mais interessante do que a morte na
Ilha de Nusakambangan, na Indonésia.
O Jovem Homem Pássaro
Apesar de nascido no Rio de
Janeiro, Marco Archer é descendente de uma tradicional e respeitada família
amazonense. Entre seus antepassados constam os irmãos Agnaldo e Henrique Archer
Pinto, que na década de 1930 criaram em Manaus o periódico “O Jornal”, durante
décadas um dos principais veículos da mídia impressa do Amazonas. Inclusive
existe na capital manauara a tradicional Corrida Pedestre Henrique Archer
Pinto, que em 2015 estará na sua 60º edição.
Primeiro
voo de asa delta no Brasil, em 1974.
Marco Archer era filho de
Carolina Archer Pinto, moravam no bairro de Ipanema e na adolescência ele
começou a se interessar por um esporte que fazia poucos anos despontava nos
céus cariocas.
Em julho de 1974 um francês
chamado Stephan Dunoyer de Segonzac decolou do Cristo Redentor pendurado
numa asa e pousou na praia de Botafogo, fato que chamou muita atenção na época
e é considerado o primeiro voo de asa delta realizado no Brasil.
Em 7 de setembro daquele mesmo
ano, saltando da Pedra da Agulhinha, na praia de São Conrado, Rio de Janeiro,
Luís Cláudio Mattos se tornou o primeiro brasileiro a voar neste tipo de
equipamento. Para este pioneiro tudo começou como uma brincadeira e ele foi o
responsável por tantos seguidores da asa delta, graças ao seu espírito
brincalhão e comunicativo.
A novidade chamou atenção de
outras pessoas e em 1975 foi realizado o 1º Campeonato Brasileiro de Voo Livre.
Esta competição contou com provas de permanência em voo e precisão, sagrando-se
campeão André Sansoldo e vice-campeão Irencyr Beltrão, que viriam a representar
o Brasil no primeiro campeonato Mundial de voo livre, realizado na cidade de
Kossen, Áustria, em 1976.
Com o crescente número de adeptos
construiu-se uma rampa de saltosno Rio, a da Pedra Bonita. Para a manutenção e
controle deste local foi criada em dezembro de 1975 a ABVL – Associação
Brasileira de Voo Livre.
Em meio ao crescimento deste
esporte, um garoto de Ipanema com 16 anos, que tinha raízes amazônicas, começou
a voar em 1977 e o seu progresso no voo livre foi bem rápido.
Segundo reportagem publicada no
Jornal do Brasil, página 17, edição de quinta feira, 18 de outubro de 1979,
Marco Archer já era apresentado pela reportagem como “Instrutor de voo”,
considerado pelos colegas como “um dos mais experientes no esporte” (mesmo
tendo apenas aos 18 anos) e era detentor do recorde brasileiro de permanência
no ar, com 7 horas e 10 minutos de voo ininterruptos.
Talvez pela pouca idade quando
começou a voar em 1977, recebeu dos outros pilotos o apelido de “Curumim”,
termo utilizado em Tupi-Guarani para criança.
Campeão Pan-americano
Mas a trajetória vitoriosa de
Archer na asa delta não era sem percalços.
A reportagem do Jornal do Brasil
de 18 de outubro de 1979 não tratava de alguma vitória de Curumim, mas de um
acidente que ele havia sofrido em um penhasco perto da Pedra da Agulhinha.
A queda ocorreu por volta das dez
e meia da manhã e Archer ficou no local por três horas, até que um helicóptero
da Secretaria de Segurança chegou ao local. Como ele estava sem ferimentos de
maior gravida (a não ser um pequeno corte na testa), a tripulação lhe passou um
cabo de aço e ele foi levado pendurado até a Praia de São Conrado. Na época
Mauricio Figueiredo, o piloto da aeronave, comentou que aquele havia sido seu
resgate mais difícil, pois ventava muito e ele posicionou o helicóptero muito
próximo as pedras.
Mesmo com o susto e o tempo de
espera pelo resgate Curumim não se abalou e, segundo a reportagem, no mesmo dia
voltou a saltar da Pedra Bonita. Essa vontade de voar naquele momento tinha uma
razão especial – Archer estava fazendo parte da equipe brasileira que iria
disputar o 1º Campeonato Pan Americano de Asa Delta, a ser realizado na
Colômbia.
Além de Curumim a equipe
brasileira contava com os pilotos Carlos Alberto Dourado, Bento Berenguer, José
Carlos Brant e Euclides Herzog.
O campeonato foi realizado no
Parque Nacional de Neusa, onde a equipe passou por vários problemas em meio a
muita chuva, frio, alojamento precário e comida de péssima qualidade.
Mas tudo valeu a pena.
Segundo outra reportagem do
Jornal do Brasil (1º Caderno, página 27, edição de quarta feira, 14 de novembro
de 1979) os cinco brazucas se sagraram os primeiros campeões pan-americanos de
voo livre. Fecharam o campeonato com 4.755 pontos, superando a forte equipe
norte-americana que fechou a sua participação com 4.435 pontos.
Evolução do piloto Bento
Berenguer – Foto de Mucio Scorzelli – www,facebook.com
No retorno ao nosso país, segundo
o Jornal do Brasil, não houve descanso para a equipe campeã. Os cinco seguiram
para São José do Barreiro, cidade paulista próxima a Serra da Bocaina onde
nesta bela localidade eles iriam participar do “Campeonato dos Mestres”.
E o lugar era fantástico. No
final da década de 1970, o prefeito Josias de Marins Freire, conhecido como Sr.
Dego, acreditando no potencial do município para o turismo e conhecendo os
atributos da Serra da Bocaina, incentivou a prática do voo livre. Logo duas
rampas foram abertas a quase 1.700 m de altitude e a Bocaina passou a ser
conhecida como “O Ninho das Águias”.
Marco Archer, o Curumim, era um
dos melhores pilotos de asa delta do país, estava vivendo toda a efervescência
e o crescimento do voo livre no Brasil. Crescimento que se consagraria com o
título que veio no Mundial de 1981, no Japão, onde o carioca Pedro Paulo Guise
Carneiro Lopes, o Pepê, foi o grande campeão.
Mas, segundo uma reportagem
realizada em 2005, foi após voltar deste campeonato na Colômbia que o voo de
Curumim começou a perder o rumo.
Melhor Ter Ficado “Nas Nuvens”
O jornalista Renan Antunes de
Oliveira entrevistou Marco Archer como enviado especial do Jornal JÁ,
quando o instrutor de voo se encontrava detido em uma prisão na Indonésia.
Em 2004 Archer foi preso ao
tentar entrar naquele país com 13,5 quilos de cocaína escondidos nos tubos de
uma asa delta. A droga foi descoberta pelo raio-x no Aeroporto Internacional de
Jacarta e enquanto os guardas desmontavam a asa ele conseguiu fugir do
aeroporto. Duas semanas depois acabou preso novamente. As leis da
Indonésia contra crimes relacionados a drogas estão entre as mais rígidas do
mundo e contam com o apoio da população.
Na entrevista a Oliveira o
instrutor Archer afirmou que na Colômbia foi “mordido pela mosca azul do
narcotráfico: sacou como ganhar dinheiro fácil. Alguém no hotel lhe deu uma
caixa de fósforos com cocaína”.
Não sei em que período da década
de 1980, Marco Archer foi gradativamente ampliando sua ação como traficante,
mas segundo o jornalista Oliveira ele prosperou no ramo. Informou que com
o dinheiro do tráfico viajou para vários países, conquistou muitas mulheres e
manteve apartamentos em três países, de três continentes diferentes – Holanda,
Estados Unidos e Indonésia, este último imóvel na Ilha de Bali.
Nesse meio do caminho, em 1997,
ao realizar um voo livre Archer caiu. Sofreu várias fraturas, ficou bem machucado
e quebrou vários dentes. Teve que ser transferido para Cingapura, país vizinho
a Indonésia, onde passou por um caro tratamento. Fez vários implantes
dentários, ficou um tempo em cadeira de rodas e voltou para se recuperar em
casa.
Mas este não seria o único
infortúnio do período. Em 2000 seu irmão Sérgio morreu de overdose. Ele era
viciado em drogas e costumava bater na mãe para conseguir dinheiro e manter seu
vício.
Não tenho detalhes do tratamento
feito por Archer, mas os jornais noticiaram que após ele se recuperar no Rio de
Janeiro, saiu desta cidade com destino ao Peru para comprar cocaína em parceria
com um financiador norte-americano. Do Peru seguiu para Manaus e de lá até a
Indonésia. Afirmou que realizou esta ação ilegal (depois de sete anos do
acidente em Bali) para pagar uma parte da dívida contraída no hospital de
Cingapura. Como não conseguiu pagar o débito integralmente, era constantemente
cobrado. Diante da situação partiu para a fracassada tentativa de tráfico de
cocaína para a Indonésia.
Em 2011, provavelmente devido a
todas as agruras passadas pelos filhos com as drogas, sua batalhadora mãe
Carolina Archer Pinto faleceu de câncer.
Marco Archer passou mais de 10
anos tentando evitar sua execução no corredor da morte indonésio. Finalmente,
na madrugada de domingo, 18 de janeiro de 2015, ele foi fuzilado em
Nusakambangan.
É bobagem o que vou comentar, mas
ao conhecermos um pouco da história de Marco Archer no voo livre, acredito que
seria muito melhor para ele ter continuado “nas nuvens”.
http://acritica.uol.com.br/noticias/Neto-amazonense-brasileiro-condenado-Indonesia_0_1282071790.html
http://www.blogdacidadania.com.br/2015/01/marcos-archer-e-o-expresso-da-meia-noite/
1º Campeonato Brasileiro de Voo Livre 1º Campeonato Pan Americano de Asa Delta ABVL - Associação Brasileira de Voo Livre Aeroporto Internacional de Jacarta Amazonas Asa Delta Bento Berenguer Brasil Carlos Alberto Dourado Carolina Archer Pinto Cocaína Colômbia Corrida Pedestre Henrique Archer Pinto Cristo Redentor Curumim Euclides Herzog Fuzilamento Henrique Archer Pinto Ilha de Bali Ilha de Nusakambangan Indonésia Ipanema José Carlos Brant Luís Cláudio Mattos Manus Marco Archer Cardoso Moreira Parque Nacional de Neusa Pedra Bonita Pedra da Agulhinha Peru Praia de São Conrado Rio de Janeiro Stephan Dunoyer de Segonzac Traficante Voo Livre
http://tokdehistoria.com.br/2015/01/24/marco-archer-de-jovem-campeao-de-asa-delta-a-traficante-de-drogas-fuzilado-na-indonesia/
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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