Por Rangel Alves da Costa*
As civilizações, enquanto
nascedouros das sociedades humanas, existem desde os tempos mais antigos,
quando os povos unificaram suas tradições, costumes e leis primitivas, bem como
aceitaram ser regidos por lideranças. Contudo, tudo ainda muito disperso e desorganizado,
sendo muito mais de feição tribal que mesmo de grupo social unificado. Somente
com o desenvolvimento e o reconhecimento de determinadas características como
próprias de determinado povo se pode falar em civilização.
Em tal percurso, o chamado mundo
civilizado passou a denominar o estágio mais evoluído das civilizações. Nesse
estágio, o povo já pode ser claramente identificado por um governo, pela
formação social e econômica, pelos aspectos políticos, históricos e culturais.
É o estágio da identidade cultural, da evolução no próprio meio social e na
afirmação de poder perante as outras sociedades. Daí os contrastes entre as
diferentes civilizações.
O reconhecimento de uma
civilização se dá, assim, pelo estágio evolutivo do seu povo. Quanto mais a
economia, a política, a cultura, a representatividade governamental e a
sociedade evoluem mais evoluída estará a civilização. Entretanto, ainda que a
civilização tenha alcançado um alto estágio evoluído, ainda assim não será
garantia de reconhecimento nos limites conceituais de mundo civilizado.
Não há um patamar de
reconhecimento de um mundo verdadeiramente civilizado, eis que tudo em
constante aprimoramento. Pressupõe-se, contudo, que civilizada é a sociedade
que alcançou um alto grau de evolução em todos os setores, principalmente na
forma de ser, viver, pensar e agir de seu povo. Quer dizer de um estágio de
barbárie e ignorância, vai se aprimorando até alcançar um refinado contexto
social.
Supõe-se, então, que uma
sociedade civilizada já se livrou desde muito de concepções ultrapassadas,
conservadoras e limitadoras da liberdade humana. Numa sociedade assim não
haveria mais escravidão, justiça pelas próprias mãos, submissão à mulher,
desigualdade por motivos de sexo, preconceito e discriminação por qualquer
motivo, respeito às liberdades individuais e coletivas, reconhecimento do ser
humano como objeto maior de proteção. Seria ainda uma civilização pautada na
lei, com governo legítimo e democraticamente forte.
Imagina-se que uma sociedade de
alto nível civilizatório possui algumas características que a diferencia de
outros povos, principalmente pelo estágio cultural alcançado pelo sua
população. O senso de moralidade predomina sobre os desregramentos, a ética
emerge com importância nas relações sociais, o reconhecimento e a valorização
da vida própria e do próximo exsurgem como aprendizado intrínseco. Mesmo com
altos e baixos nestes aspectos, ainda assim será uma sociedade que pode servir
de exemplificação positiva perante todos os povos.
Entretanto, a realidade demonstra
que todo o percurso civilizatório relatado acima não passa de uma ilusão
sociológica ou antropológica. E assim porque as transformações existentes nas
sociedades, e que permitiram suas evoluções, não alcançaram todos os contextos
sociais da mesma forma. Houve desenvolvimento econômico, cultural, político e
social, mas a população em si, enquanto agrupamento de pessoas dotadas de
características próprias, permaneceu oscilando entre a nova e a realidade mais
primitiva, mais bestial e bárbara.
A verdade é que grande parte da
população do magnífico mundo civilizado vive contestando o próprio conceito de
civilizado. Ora, considerando que civilizado é o que é aprimorado, decente,
exemplar, educado, evoluído, em contraste com o feroz, rude, arrogante,
violento, estúpido, bárbaro, logo se tem que a dita civilização não conseguiu
moldar o caráter de muita gente. E nesta afirmação a certeza que o mundo
bárbaro, selvagem e atroz continua com moradia garantida no admirável mundo
novo.
Mas não há que fazer comparações
entre os chamados povos bárbaros, como os vândalos, godos, celtas, gauleses,
suevos e visigodos, com os cruéis do mundo novo, do mundo tão civilizado de
agora. E não porque as barbáries praticadas pelos estrangeiros da antiguidade
se justificavam pelas guerras de conquistas, pelos ataques e defesas, num tempo
onde a afirmação de um povo se dava com a vitória sobre outros povos, mesmo que
sangue tenha impiedosamente jorrado dos inocentes submetidos.
Naqueles idos, os comandados por
sanguinários como Átila, rei dos hunos, e Gengis Khan, o conquistador mongol,
eram verdadeiros anjos se comparados aos atuais terroristas da fé. Os chefes de
grupos radicais como Boko Haram, Estado Islâmico, Al-Qaeda e Talibã, são
indiscutivelmente muito mais atrozes e violentos que qualquer líder bárbaro da
antiguidade. Se houve aprimoramento civilizatório foi apenas nos instrumentos
utilizados nas práticas terroristas.
Desse modo, devem ser repensados
o conceito e percurso de mundo civilizado. Civilizar pressupõe crescer,
desenvolver, agir com novas práticas que demonstrem que o mundo aprendeu com os
erros do passado. Não pode ser tido como civilizado um mundo que se desenvolve
apenas econômica, política e culturalmente, quando grande parte de sua
população se conserva no estágio mais primitivo da violência e da barbárie. Que
mundo novo é este que aprimora cada vez mais a forma de violentar a vida?
Poeta e cronista
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