Por: Rangel Alves
da Costa(*)
PEQUENOS AFETOS
O afeto é
sentimento de doce pronúncia e de imensa significância para quem recebe e para
quem transmite afeição. Gesto tantas vezes simples, despojado, porém de
indescritível beleza quando
verdadeiramente expressado.
Ter afeto é
gostar, é querer bem, é sentir carinho por outra pessoa; o afeto se expressa no
sentimento de ternura e amizade para com o outro. Daí a afeição ser o cuidado e
a dedicação para que tal sentimento seja compreendido e acatado no coração,
reconhecendo aquele gesto amável ou benevolente.
Contudo - e
infelizmente -, nem todas as pessoas são capazes de transmitir afetos
verdadeiros. Do mesmo modo, nem todos sabem compreender e corresponder as
afeições recebidas. Nem externa nem internamente, o que é mais conflitante.
Expressar
afeição não requer receita nem preparo. O
sentimento afetuoso está em cada um, é instintivo do ser humano, já está
enraizado no coração mais ou menos generoso que a pessoa tem. Quanto a isso,
não depende de classe social, de sexo, de idade, de poder econômico ou de qualquer
outra coisa.
A arte do
afeto é a arte do humano, da humanização, da valorização do próximo. Só é
afetuoso quem estima e aprecia o outro, quem o reconhece indistintamente; só
consegue mostrar verdadeira afeição aquele que pelo outro é reconhecido como portador
de cordialidade no coração.
Mas é muito
fácil ser afetuoso. Está ao alcance de todos o amável cumprimento, a saudação
cordial, a demonstração da saudade sentida pela ausência, o abraço afável e o
aperto de mão, a palavra amiga e confortante dita quando do encontro. Tudo
mundo é capaz de ser assim e agir assim.
Um sorriso
sincero de satisfação é exemplo maior de afeto. Todo mundo admira ser
reconhecido, relembrado, saudado, valorizado pelo outro amigo. Não há indivíduo
consciente que não se encha de admiração quando o amigo lhe chega querendo
saber se está precisando de alguma coisa, como está a família, se todos estão
com saúde e paz.
Os gestos de
afeto são inumeráveis. Entretanto, apenas um pode fazer surtir o efeito de
todos. Num dado momento, num inesperado instante, aquele que se achava
esquecido é relembrado e festejado pelo outro. E não há instante de magia maior
que um conforto ou um reconhecimento num momento que parece ser de
esquecimento. Ou de dor.
Já convivi e
ainda convivo com muitos instantes assim. Porque geralmente estou distante de
meu berço de nascimento, minha abençoada Nossa Senhora da Conceição do Poço
Redondo, toda vez que coloco o pé na terra sagrada sou recebido e reconhecido
com inestimável afeição. Só eu sei o quanto me enche de orgulho e graça sentir
nos olhos e no semblante de cada conterrâneo o prazer pela minha presença.
Somente eu
para saber o quanto me irradia ser saudado por um e outro, ser abraçado, ouvir
palavras de carinho e amizade. E o orgulho é ainda maior quando estou diante
das pessoas mais humildes, mais envelhecidas ou que são de meus tempos ou de
outros tempos de convívio naquelas distâncias. Abraçar um velho amigo sertanejo
é fazer reacender a chama da presença eterna.
Do mesmo modo,
logo percebo a imensa satisfação quando me dirijo a cada um que, mesmo me
reconhecendo, permanece afastado por estar acanhado ou vergonhoso de se
aproximar. Os olhos brilham, o coração pulsa, o sentimento aflora. Reconheço
isso porque conheço a sinceridade de meu povo, de meus bons amigos de Poço
Redondo. Do mesmo modo pressinto o cumprimento falso de quem mente a si mesmo.
Queria não
viver tão distante para que o afeto presencial não ressurja apenas de vez em
quando. Mas a saudade que sinto tem a mesma força do diálogo, do abraço, do
compartilhamento. E isso também é imensa e verdadeira afeição.
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e cronista
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