Por: Rangel Alves da Costa(*)
Mesmo que não
tenha sido ação perpetrada intencionalmente, nunca o exacerbamento da violência
policial serviu tanto a propósitos políticos, como agora se verifica após a
truculência da Tropa de Choque paulistana contra manifestantes no último dia 13
de junho. Verdade é que bombas acabaram explodindo exatamente no até então
indestrutível império lulista.
Foi exatamente
a partir dessa data e como consequência da brutalidade repressora - em seguida
defendida como necessária pelo governo Alckmin -, que os grupos manifestantes
acirraram ainda mais suas disposições e passaram a empreender novos e mais
fortalecidos protestos. E estes se espalharam pelo país como fogo de pólvora em
tempo de desolação.
Mais tarde os
livros de história, na análise que farão da então denominada Revolução das
Tarifas, estamparão não mais os protestos contra as tarifas nos transportes
coletivos como elementos causais do despertar social, mas sim a brutalidade
policial como a causa principal do acirramento da luta do povo. E também pelo retumbante
estremecimento das estruturas políticas e palacianas.
Talvez tudo
não passasse de mais um protesto, de uma justa reivindicação organizada pelo
Movimento Passe Livre, se a revide policial, e da forma como foi levada a
efeito, não tomasse a dimensão que tomou. A cega brutalidade da Tropa de
Choque, investindo violentamente até mesmo contra meros transeuntes e fazendo
de algoz qualquer um que encontrasse pela frente, teve imediata repercussão
nacional e internacional, não passando despercebida pela ONU.
Após os
jornais, as redes televisivas e as redes sociais estamparem manchetes como
“Polícia Militar utiliza violência para reprimir protesto em São Paulo”,
“Manifestantes são vítimas da violência policial”, “Tropa de Choque causa
terror entre inocentes e manifestantes”. Quatro dias depois, como consequência
da brutalidade do dia 13, a manchete já mostrava outro dimensionamento dado ao
protesto, agora focando também na arbitrariedade policial: “São Paulo reúne
multidão contra tarifa de transporte e violência policial”.
Quer dizer, ao
problema das tarifas foi acrescida a violência policial. E no passo seguinte
cartazes e faixas já apontavam as indignações contra as obras superfaturadas da
copa do mundo, a PEC 37, o pastor Feliciano e sua cura gay, a falência total
dos serviços públicos, o descontrole da inflação e o alto custo de vida, a
desenfreada corrupção e a impunidade. E tantos outros motes de um povo que
passou a ver em cada protesto a oportunidade de soltar seu grito de revolta.
Por dias
seguidos, estupefatos, atabalhoados, verdadeiramente atônitos, políticos e a
governante maior silenciaram em suas tocas. Ninguém dizia absolutamente nada,
ainda que a imprensa e a população cobrassem a todo custo. Em estado de
catatonia, primeiro procuraram se refazer do susto e compreender o que estava
realmente acontecendo. Em seguida, ainda estremecidos e sem a exata noção das
motivações, acabaram buscando qualquer saída para salvar a própria pele e as
instituições que representam.
Verdade é que
de uma hora pra outra o povo fez despertar o Congresso Nacional, os governantes
estaduais e municipais, e principalmente o Governo Federal. Cada um chegou com
uma bandeja de soluções, desencavando reclamos desde muito adormecidos,
imediatamente votando projetos de interesse do povo. E sendo forçados a acatar
os desejos das ruas.
Contudo, foi a
presidente Dilma que mais se viu em apuros. Se a sua popularidade já andava
oscilando negativamente antes dos protestos, os fatos novos a colocaram numa
sinuca de bico. Antes inatacável, fortalecida pelos programas assistencialistas
que mantém, sustentada nas sombras do lulismo, de repente viu que não podia
mais negar a outra realidade que tentava esconder. Mas tudo em parte, pois
reconheceu a precariedade na saúde, na educação, nos transportes e na mobilidade
urbana, mas não tocou na ferida da economia nem reconheceu os gastos absurdos e
superfaturados com a copa do mundo.
Tentando a
todo custo salvar sua reeleição, o que a presidente fez foi prometer e prometer
muito mais, como se ainda estivesse em campanha e o seu governo jamais tivesse
se preocupado em enfrentar os problemas sociais agora surgidos. Mas agiu tarde
demais. Um governo não se faz do final para o início, voltando, mas numa
continuidade de ações.
E no último
sábado, dia 29 de junho, o Jornal Folha de São Paulo publicou pesquisa sobre a
popularidade da presidente após o início dos protestos. Se a situação já era
melindrosa, agora descambou de vez. A aprovação nacional de Dilma despencou de
57% para 30% em três semanas, com uma queda de 27 pontos. Desde que tais
pesquisas começaram a ser realizadas, um presidente jamais teve sua
popularidade reduzida tão vertiginosamente.
Tal queda, a
continuar assim, significa também o desmoronamento do império lulista. Um tiro
de bala de borracha da polícia tucana certamente afetou a fachada de vidro do
grande império. O seu soberano talvez esteja juntando os cacos para ver o que
pode salvar. Mas por enquanto continua calado. Bem ao modo de quem nunca sabe
de nada.
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e cronista
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