Por Marinalva Freire da Silva
O termo ‘pós-modernidade’ é um
modismo na língua; foi criado para fazer referência aos fatos que vêm depois, o
que significa dizer que indica uma ruptura na qual o pós-moderno passa a negar
o moderno, quando, na realidade, trata-se das modificações provocadas pela
revolução tecnológica, fruto da sociedade capitalista. Nesta fase há uma quebra
de paradigmas, uma inversão de valores.
A vanguarda é a mais importante
revolução cultural e política, rompendo com todas as convenções do passado e
ressoando na história.
Para que haja uma ruptura, faz-se
necessário que ressoe na história, ou seja, é necessário que tal fato se torne
uma referência para outras manifestações (ORLANDI, 2006) sobre que movimentos
de vanguarda guarda eclodem em uma sociedade em tramitação que passa de um
cenário agrário a um urbano.
Sousa (2001: 29) argumenta que a
pós-modernidade é uma experiência cultural, uma condição ou talvez a combinação
das duas. Nesse sentido, Lyon (apud SOUSA, 2001) considera a pós-modernidade uma
ideia de forma de crítica na mente dos intelectuais e nos meios de comunicação.
O curioso é que a pós-modernidade só pode ser
entendida com sua cumplicidade ética do
ser que estão no espaço antes preenchido pela modernidade, o que significa
dizer que os desafios que os desafios pós-modernos estão voltados para os
ideais, os valores e os símbolos da vida capitalista, como eles aparecem na
vida dos consumidores e no consumo mesmo.
Sabe-se
que a modernidade é um projeto inacabado (HABERMAS, 2000). Ele teve início
muito antes da Semana de Arte Moderna, em 1922, deu o recado do caos telúrico
através de um reflexo do futuro incerto, como o é todo futuro. É fácil
justificar este argumento, quando se toma por parâmetro a agonia cósmica do
“Eu” de Augusto dos Anjos, escritor de uma única obra, que disse para o que
veio; ele antecedeu, sim, a Semana de 1922, traçando o caminho do “absurdo”, do
caos “telúrico” a partir de “uma Sombra”, previu os acontecimentos do mundo
moderno, como as duas primeiras guerras mundiais, a era da cibernética, a
inversão dos valores humanos, as grandes descobertas científico-tecnológicas,
um marco da modernidade. Nele se encontra uma ruptura profunda, uma crise de
valores:
“Tome, Dr. ,esta tesoura,
e...corte
Minha singularíssima pessoa.
Que importa a mim que a bicharia
roa
Todo o meu coração, depois da
morte?!
(Budismo
moderno.In Eu, 2012: 76, v. 1-4)
A falta de esperança, de
perspectiva de dias melhores amargura a existência de um poeta “agônico”. Neste
espaço de angusticidade, Augusto dos Anjos quebra os paradigmas da ordem
estética, proclama o caos que assola a humanidade. Tem visão apocalíptica; transgride
a ordem da poesia, quebra os grilhões do parnasianismo, da mesmice, do modelo
enfadonho da época. Sua obra é uma ponte entre o moderno e o contemporâneo. A
aspereza de seus versos é fruto da
modernidade, é um grito que lhe estava preso na garganta – a falta de sentido
do outro, de sentido da vida, a desesperança dos excluídos, um produto do
capitalismo exacerbado, desumano, que coisifica o homem, robotiza-o; a crise
dos sentimentos, a falta de amor entre os iguais, a corrida desenfreada em
busca do ouro, levando o homem ao “vale quanto pesa”, vale pelo que tem a
oferecer, assim, constata-se ausência de alteridade, ou seja, falta a ética
cristã para se ter uma sociedade mais justa.
A modernidade trouxe à baila o
anarquismo, a vulgaridade; mas Augusto dos Anjos não optou pela vulgaridade,
não escolheu a pornografia para chamar a atenção do mundo que (se diz
civilizado) sobre a falta de esperança dos excluídos, dos miseráveis; da
injustiça social. Ele manteve uma linguagem elegante, embora desagradável ao
sabor dos parnasianos, uma linguagem carregada de uma carga semântica picante,
acre, denominado por muitos críticos literários de: o poeta do mau gosto, do
absurdo, do negro, da podridão. Sim, da podridão moral, dos valores. Augusto
dos Anjos pode ser considerado um poeta de transgressão, posto que rompesse com
a métrica rígida do parnasianismo cujo estilo era o equilíbrio, estética;
assimilou toda crise da modernidade, as guerras, os conflitos bélicos, raciais,
religiosos capitalismo selvagem, o que induz
considerá-lo contemporâneo.
Não apenas a literatura, a música
da vanguarda também rompe com a “ordem”. A partir de 1930, houve uma retomada
dos primeiros passos da chamada pós-modernidade, há um processo de ruptura, de
transformação da estética. A Semana de Arte Moderna trouxe à tona a nota
destoante de todos os equilíbrios.
A chamada pós-modernidade é uma
inversão total de valores, e Augusto dos Anjos, que não é considerado
pós-moderno, antecipou-se a essa inconformação.
Ele antecede ao período de 1922,
pois já chamava para a crise dos valores que dignificam o homem. Sim, era um
inconformado, uma voz sem eco para sua época e, quem sabe, ainda sem o “pós”
para a contemporaneidade.
A antecipação da inconformação de
1922 significa a inconformação contemporânea, pois é nesse período pré-22- que
se está vivendo hoje. Ninguém superou ainda a incerteza da modernidade, ou
seja, o homem que deveria ser o centro das atenções no universo, é posto em
último plano. É grande o caos da modernidade pela falta de sentido do outro,
cada um pensando em si, no melhor para si, descartando seus iguais como se fossem
um objeto de estimação que logo perde seu valor estimativo e torna-se
descartável, o que equivale dizer que o homem vale pelo que pode produzir, pelo
que tem a oferecer . O capitalismo “desumano”, cruel, é tão insaciável que se
apodera do sexo como o mapa de um mina
“inesgotável”. E o homem vai ficando aqui, ali, enquanto o amor, que é algo
sublime, a razão de ser da existência humana, passa o largo, sem encontrar
guarida, espaço porque o homem está ocupado com o quantum o negociável, o
rentável, com o sexo coisificado e banalizado, porque utilizado, praticamente,
em todas as estâncias da sociedade com um único objetivo- a corrida para o
ouro. E assim, o casamento e a família, enquanto instituições, estão
desaparecendo. Os filhos não são mais frutos do amor, senão de momentos de
prazer, mas que , em seguida, tornam-se indesejáveis porque vai mudar o decurso
da vida, vai atrapalhar planos que não foram traçados, mas o destino se
encarregou de fazê-los. Assim, na pós-modernidade, a maioria das crianças não
desejadas, vêm ao mundo desprovidas de amor, afeto; conforme o padrão paterno,
a muitas nada lhes faltam materialmente.
Mas e os sentimentos de afeto? Estas crescem sem o tempo dos pais, sem os
olhares necessários ao seu desenvolvimento principalmente psicológico, sem a
ajuda para dar os primeiros passos. E o mundo se encarrega da desorientação; e,
lamentavelmente, as drogas são o lenitivo da afetividade.
Que tristeza! Mas é a chamada
pós-modernidade que conduz o homem aos caminhos tortuosos. “Aqui é oportuno
conclamar Platão: “Eduquem-se as crianças e não será preciso castigar os
homens”, pois, já ensinava Rousseau que “o homem nasce bom; a sociedade é que o corrompe”. Porém, não há tempo para o
diálogo, para se ouvir o outro posto que o ter é o que importa.
Retomando, a literatura é uma
inserção na história e, como tal, reflete toda inquietação, todos os conflitos
que ocorrem a sociedade. Essa inquietação justifica-se pela inconformação
diante da exclusão, que prova ma síndrome, denominada “síndrome da
pós-modernidade”. Mas somente a posteridade é que confirmará a existência de
tão badalado movimento.
Como
é possível observar, a crise de sentido no mundo atual aparece com síndrome da modernização e da pluralização da
sociedade. Nesse sentido, Berger & Luckmann (2004:49) afirmam que a modernidade significa um aumento
quantitativo e qualitativo da pluralização, e se não for possível limitar a
interação, causada pela pluralização, por “muros” de um tipo, o pluralismo se
tornará plenamente atuante e, com isso, também uma das suas consequências: a
crise “estrutural” de sentido.
Essa
afirmação sobre a crise de sentido no mundo de hoje induz a concordar com os referidos
autores no tocante a que o pluralismo leva a um enorme
relativismo dos sistemas de valores e da interpretação.
Constata-se
que são inúmeras as contradições desta modernidade tardia que, ao sofrer
mudanças com a tecnologia, impulsionada pelo capitalismo exacerbado, que não
“permite” ao homem ser o centro do universo, colocando-o em segundo plano.
Desta forma, a maior contradição deste período denominado de pós-moderno está
assentada na base do estruturalismo, do efêmero, do prazer, do consumo exagerado
como forma de preenchimento de um vazio pela falta de sentido dos se, portanto,
este movimento de efemeridade da pós-modernidade conseguiu abalara certezas
inabaláveis, deixando o humano embevecido com o ter e esvaziado do ser.
Por
conseguinte, o grande desafio de uma política pós-moderna é esta dupla
perspectiva: de um lado, a transformação da história por um simples ato de
vontade imaginativamente, e de outro, uma total radicalidade no sentido de que
tudo é imaginativamente possível, porque, de fato, nada tem valor.
Referências
ANJOS, Augusto dos. EU e outras
poesias. Edição comemorativa dos 100
anos do EU. João Pessoa: Academia Paraibana de Letras. Senado Federal, 2012.
BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da
pós-modernidade. Tradução: Edgar Mauro Gama e Cláudia Martinelli Gama. Rio de
Janeiro: Zahar, 1998.
EVANGELISTA, João Emanuel. Elementos
para uma crítica da cultura pós-moderna. Revista Novos Rumos. São Paulo: Novos
Rumos, v. 34: 29-40, 2001.
HABERMAS, Jürgen. O discurso
filosófico da modernidade. São Paulo: Cortez, 2004.
Envaido pelo professor, escritor e pesquisador do "Cangaço" José Romero de Araújo Cardoso
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