Por Rangel Alves
da Costa*
Não se imagine
que o pleito eleitoral brasileiro terminará com o anúncio do vitorioso no
segundo turno. Ao anoitecer deste domingo, 26, certamente que ou Dilma ou Aécio
estará festejando a consagração popular, mas consciente que nada ainda
terminou, pois um pleito maior e mais difícil se aproxima. Após a posse começa
o embate entre o novo governante e o povo, seja seu eleitor ou não. De um lado
estarão as promessas e de outro as exigências ao cumprimento.
E então surge
um aspecto de maior relevância: O povo pode vencer o eleito em pouco tempo,
bastando que este passe a governar sem o aval dos compromissos assumidos,
negando seu próprio projeto de governo ou relegando as grandes aspirações
populares. Já o eleito terá que suportar uma disputa de quatro anos, procurando,
a cada dia, mostrar que é realmente merecedor de aceitação. Enquanto o povo tem
o dom de logo rechaçar a postura do eleito, este terá a árdua missão de, desde
o início, mostrar que o rumo que está tomando não é diferente daquele caminho
prometido.
A disputa do
terceiro turno começa, pois, a partir da posse. Diferentemente do que ocorreu
no primeiro turno, onde as desconstruções, as mentiras e os confrontos pessoais
deram o tom da disputa, e no segundo, quando os dois escolhidos chegaram à
arena armados até os dentes para confrontos diretos, rancorosos e deselegantes,
o terceiro turno ocorrerá no âmbito das cobranças. Será a vez de o povo se
alçar de candidato e buscar derrotar a antiga prática do esquecimento e da
inversão dos discursos.
As inversões
dos discursos, dos compromissos assumidos e dos projetos defendidos em
campanha, sempre prevaleceram ao longo da história política brasileira.
Tornou-se praxe que o marketing político, ou o mero jogo de fantasiamento do
candidato e venda de ilusões, sempre tenha se sobreposto à discussão e
enfrentamento das realidades e a efetiva busca de soluções para os tantos
problemas que afligem o país. Por isso mesmo que depois da posse o governante
começa a enfrentar grandes dificuldades. E o passo seguinte, diante da
impossibilidade de governar segundo o prometido, é se mostrar como outro
totalmente diferente daquele da campanha.
A verdade é
que nenhum governante respeita a própria palavra, nenhum eleito termina o
mandato tendo cumprido ao menos um terço de suas promessas. O protelamento das
medidas urgentes e necessárias é um mal também histórico. Por consequência,
todo governante se reifica após a posse, se arvora do direito de tudo ser e
acaba agindo por pura conveniência. E isso é muito perigoso quando encontra
quem o cobre com firmeza do outro lado. E tal cobrança, diante da situação de
fragilidade ou dependência que geralmente acaba abarcando os outros poderes,
somente o povo poderá fazer.
Em tal
perspectiva, de poder do povo sobre o próprio governante, logo o qualifica como
rival difícil de ser derrotado no terceiro turno. O eleito tem o poder, tem o
mandato à mão para cumprir segundo seus objetivos de governo, mas devendo
sempre ter o cuidado de não conflitar sua gestão com os interesses legítimos da
sociedade. Ou se amolda aos anseios e clamores sociais ou estará fadado a ser
negado até mesmo por aqueles que o apoiaram. Ao menos assim deveria acontecer,
eis que somente o povo para impor ao mandatário um governo que não se distancie
das promessas e compromissos assumidos.
A afirmativa
que ao menos assim deveria acontecer implica também em dizer que nunca acontece
assim. Ora, todo e qualquer candidato chega numa campanha já sabendo que deve
prometer o máximo porque o povo assimila tudo que o que for prometido, mas
depois, com o comodismo que lhe é peculiar, acaba tudo esquecendo. Na maioria
das vezes, seria até impossível cumprir metade da cesta de bondades. Mas mesmo
assim promete mundos e fundos. E depois, quando toma posse, pouco ou nada faz
e, o que é pior, passa a desconhecer o próprio povo.
Mas basta que
a sociedade diga que está de olhos abertos para o governante começar a temê-la.
Não há nada que mais aflija um mandatário que um povo cobrando, puxando a sua
rédea. A sociedade brasileira não gosta muito de fazer cobranças ou exigir
posturas que lhe sejam benéficas, tendendo muito mais a pactuar com os
esquecimentos e desacertos, mas ainda assim tem tudo para dominar a disputa e
sair vencedora. Basta que faça ver ao eleito deste domingo que um mandatário
maior da nação governa é para o povo e não para partidos, grupos ou na defesa
de interesses pessoais.
De qualquer
modo, o terceiro turno envolverá apenas o vitorioso deste domingo e o povo, e
num pleito que se iniciará após a posse. A partir daí a disputa poderá ser do
governante contra o povo, deste contra aquele, ou até mesmo num pacto onde os
dois comunguem suas forças em nome da nação. Mas cabe ao governante evitar que
haja qualquer confronto. Agindo segundo as aspirações da população,
transmitindo confiança à sociedade e governando com seriedade e pauta
desenvolvimentista, certamente que o povo abraçará sua causa.
Por fim,
tenha-se que aquela frase tão corriqueira em campanha, dizendo que a vitória do
candidato será o povo no poder, é plenamente aplicável no embate entre
sociedade e governante. Eis que o povo, a qualquer momento, poderá exigir o
poder. Que, aliás, sempre lhe pertenceu.
Poeta e
cronista
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