sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

PÓS-MODERNIDADE OU RUPTURA?[1] - Na contramão da alteridade-

Por Marinalva Freire da Silva
                                                           
O termo ‘pós-modernidade’ é um modismo na língua; foi criado para fazer referência aos fatos que vêm depois, o que significa dizer que indica uma ruptura na qual o pós-moderno passa a negar o moderno, quando, na realidade, trata-se das modificações provocadas pela revolução tecnológica, fruto da sociedade capitalista. Nesta fase há uma quebra de paradigmas, uma inversão de valores.

A vanguarda é a mais importante revolução cultural e política, rompendo com todas as convenções do passado e ressoando na história.

Para que haja uma ruptura, faz-se necessário que ressoe na história, ou seja, é necessário que tal fato se torne uma referência para outras manifestações (ORLANDI, 2006) sobre que movimentos de vanguarda guarda eclodem em uma sociedade em tramitação que passa de um cenário agrário a um urbano.  
   
Sousa (2001: 29) argumenta que a pós-modernidade é uma experiência cultural, uma condição ou talvez a combinação das duas. Nesse sentido, Lyon (apud SOUSA, 2001) considera a pós-modernidade uma ideia de forma de crítica na mente dos intelectuais e nos meios de comunicação.

 O curioso é que a pós-modernidade só pode ser entendida  com sua cumplicidade ética do ser que estão no espaço antes preenchido pela modernidade, o que significa dizer que os desafios que os desafios pós-modernos estão voltados para os ideais, os valores e os símbolos da vida capitalista, como eles aparecem na vida dos consumidores e no consumo mesmo.

Para reforçar o que foi dito no parágrafo anterior, Sousa (2001: 39) refere que a pós-modernidade não se faz à custa da economia capitalista e sem esgotamento pelos anos 70.  É o neoliberalismo que, teoricamente, justifica a crise do método capitalista pela intervenção do Estado na manipulação do mercado.

Nessa linha de raciocínio, enfatiza-se a ideia de que o homem é um ser de necessidades e desejos, que, para serem satisfeitos, necessitam de recursos. Na concepção de Sousa (2001), é o equilíbrio entre fatores de produção e consumidores e aspiração da pós-modernidade: mercado perfeito. 
            
É oportuno destacar que a evolução tecnológica vivenciada no século XX ocasionou grandes modificações na sociedade. Tais modificações foram na maioria, desencadeadas pela cultura de massa com os meios de comunicação, resultando conceitos e manipulando ao agir de milhões de pessoas. O consumo e suas implicações constituem o fenômeno que merece especial atenção, tendo em vista que este é a mola propulsora da chamada ‘pós-modernidade’. A mídia do consumo humano que virou uma necessidade vital na atual sociedade, oportunizando uma enorme inversão de valores, a partir da educação primária – a do lar. A estética “es+ética” responde pela coisificação do ser humano. O homem vale quanto “pesa”, quanto tem de material, em detrimento de todo seu potencial.

A espiritualidade foi posta à margem da sociedade. Em nome dessa exacerbada necessidade de consumir, o homem afasta  de sua frente seus iguais “impiedosamente”, aqui se faz referência ao grau de violência que assola a sociedade contemporânea, tudo em busca  do ter, pois é muito bom ter, melhor ainda é ter e ser, mas não sendo possível ambos, o último é muito importante porque nele estão inseridos os valores espirituais que faz o homem ser diferente dos irracionais.

Segundo Freud (apud BAUMAN, 1998: 8), a civilização se constrói sobre uma renúncia ao instinto, pois a modernidade impõe grandes sacrifícios à sexualidade e agressividade do homem.  O anseio de liberdade, portanto, é dirigido contra formas e exigências particulares da civilização ou contra esta como um todo.
            
Prosseguindo, Freud, já referido, argumenta:

[...] os prazeres da vida civilizada [...] vêm em um pacote fechado com os sofrimentos, a satisfação com o mal-estar, a submissão com a rebelião. A civilização – a ordem imposta a uma humanidade naturalmente desordenada – é um compromisso, uma troca continuamente reclamada e para sempre instigada a se negociar. O princípio de prazer está aí reduzido à medida do princípio de realidade e as normas compreendem essa realidade que é a medida do realista. ‘O homem civilizado trocou um quinhão das suas possibilidades de felicidade por um quinhão de segurança’.

Entretanto, na concepção de Bauman (1998: 91), dentro da estrutura de uma civilização concentrada na segurança, mais liberdade em nome da segurança significa mais mal-estar:

Nossa hora, contudo, é a da desregulamentação. Princípio da realidade, hoje, tem de se defender no tribunal da justiça onde o princípio de prazer é o juiz que a está presidindo. ‘A ideia de que há dificuldades inerentes à natureza da civilização que não se submeterão a qualquer tentativa de reforma’, parece ter perdido sua prístina obviedade. A compulsão e a renúncia forçada, em vez de exasperante necessidade, converteram-se numa injustificada  investida desfechada contra a liberdade individual.

FRANÇOISE Choy (apud REZENDE, 1997: 24) refere:

[...] a sociedade moderna produz as metrópoles, conturbações, cidades industriais, grandes conjuntos habitacionais, mas fracassam na ordenação desses locais; a cidade está sempre em movimento, um movimento que é impossível de ser percebido na sua totalidade e que não tenha talvez um sentido comum.

O que se entende, produz o caos, a desordem, a falta de espaço, o aglomerado humano desordenado. Mas, é inegável que a sociedade moderna industrial é essencialmente urbana,  constitui-se por assim dizer, os territórios do sagrado e do profano. No que um se revela, no outro, se esconde, às vezes  nos confundimos. Nesse pensar, ainda na concepção de Rezende (1997: 25):

[..] os caminhos para a cidade moderna não passaram apenas pelas trilhas da industrialização, tendo em vista que não houve essa relação de necessidade absoluta. A modernidade tem suas ligações intrínsecas com a modernização e o espaço físico desta, sua concretude acelera a modernidade, alarga os sentimentos dos que se dizem progressistas.

Diante do exposto, as grandes cidades representam, por conseguinte, forte tensão entre o moderno e o tradicional. E a pós-modernidade, segundo Lyotard (apud  SOUSA, 2001:118), faz referência à mudança de uma época para outra, surgindo uma nova tecnologia e transmissão de informações.  Contudo, urge definir-se o perfil do que se chama pós-modernidade.    

Tipologia de pós-moderno

As discussões em torno da realidade presente dão a noção de que as mudanças e os novos problemas vividos pela humanidade significam ou indicam uma situação histórica sem precedentes, configurando a própria crise da modernidade, tornaram-se praticamente um lugar comum. É consensual o envolvimento e a crise da modernidade. Neste compreender, destaca-se o pensamento pós-moderno que surgiu na década de 1970 nos países capitalistas industrializados, no início dirigido à tematização das questões estéticas e arquitetônicas.

Como o próprio tema sugere, o pensamento pós-moderno se afirmaria como expressão intelectual de uma nova ordem societária que se está formando em contraposição à modernidade em crise. Em outros temas seria a expressão teórica e cultural de uma nova situação sócio-histórica: a condição pós-moderna.

O pensamento pós-moderno instauraria uma nova modalidade de racionalidade e de cultura, que seria a expressão de um conjunto de transformações econômicas, sociais e políticas, produzindo uma mudança qualitativa nas instituições da sociedade moderna. Desse modo, o pensamento pós-moderno significaria, ao mesmo tempo, uma crítica e uma ruptura com a modernidade, com implicações que atingem desde a vida cotidiana até a produção de conhecimento social.

Na discussão atual sobre pós-modernidade, constata-se uma grande confusão e indefinição quanto ao seu significado e à sua abrangência conceitual (Veja-se: EVANGELISTA, 2001; LYOTARD, 1978; ROUANET, 993; SUBIRATS, 1991). A noção de pós-moderno possui as aplicações mais diferenciadas:

Nessa linha de raciocínio, Lukács (1968; 1974) se expressa que ora aparece tratando da estética (na arquitetura, na literatura ou na pintura), outras vezes,  referindo-se aos fenômenos abrangentes da esfera cultural (inflexões temáticas epistemológicas da ciência e da filosofia) e ainda podendo pretender dar conta de mudanças estruturais que teriam ocorrido ou estariam ocorrendo, no conjunto da sociedade, da economia, da política e da cultura.

Percebe-se, pois, que não há consenso, tampouco se o pós-moderno representa uma continuidade ou uma ruptura com o modernismo, constitui-se um estilo ou uma periodização histórica; se é revolucionário e inovador ou  uma domesticação do modernismo; se consiste numa crítica ou numa integração à política neo-conservadora hegemônica  no mundo ou, ainda, se se configura uma reestruturação  radical da sociedade ou se é exatamente a lógica cultural do capitalismo avançado (LUKÁCS, 1974).

Teoricamente, do ponto de vista estático, político e ideológico, a ambiguidade  ou a ambivalência constitui uma das características mais salientes do pensamento pós-moderno. Entre outros traços da contemporaneidade pós-moderna, o princípio esvaziador do mundo e da sociedade moderna é sistemático de modo a ver-se o seguinte: Estar-se-iam processando a desreferencialização do Real, a desmaterialização da Economia, a destatização da filosofia, a despolitização da Sociedade e a dessubstancialização de Sujeito. (EVANGELISTA, 2001).

Tudo o que existe estaria marcado pela efemeridade, pela fragmentação, pela indeterminação, pela descontinuidade, pelo seletismo das diferenças e pelo caos paradoxal.

O cotidiano constitui, por conseguinte, o espaço onde se encontram condensados esses traços definidores da pós-modernidade através da publicidade, que invadiu todos os espaços da vida do homem pela estetização dos objetos de consumo, a  erotização e a personalização das mercadorias. Numa palavra, a realidade social de desmaterializou e passou a ser o signo que transformou o cotidiano na vivência imediata de simulacros, instaurando-se a hiper-realidade pela generalização da informação e da simulação na sociedade informatizada de massas.

Augusto dos Anjos e a pós-modernidade

A modernidade é um projeto inacabado (HABERMAS, 2000). Ele teve início muito antes da Semana de Arte Moderna, em 1922, deu o recado do caos telúrico através de um reflexo do futuro incerto, como o é todo futuro. É fácil justificar este argumento, quando se toma por parâmetro a agonia cósmica do “Eu” de Augusto dos Anjos, escritor de uma única obra, que disse para o que veio; ele antecedeu, sim, a Semana de 1922, traçando o caminho do “absurdo”, do caos “telúrico” a partir de “uma Sombra”, previu os acontecimentos do mundo moderno, como as duas primeiras guerras mundiais, a era da cibernética, a inversão dos valores humanos, as grandes descobertas científico-tecnológicas, um marco da modernidade. Nele se encontra uma ruptura profunda, uma crise de valores:

“Tome, Dr. ,esta tesoura, e...corte
Minha singularíssima pessoa.
Que importa a mim que a bicharia roa
Todo o meu coração, depois da morte?!

(Budismo moderno.In Eu, 2012: 76, v. 1-4)

A falta de esperança, de perspectiva de dias melhores amargura a existência de um poeta “agônico”. Neste espaço de angusticidade, Augusto dos Anjos quebra os paradigmas da ordem estética, proclama o caos que assola a humanidade. Tem visão apocalíptica; transgride a ordem da poesia, quebra os grilhões do parnasianismo, da mesmice, do modelo enfadonho da época. Sua obra é uma ponte entre o moderno e o contemporâneo. A aspereza de seus versos  é fruto da modernidade, é um grito que lhe estava preso na garganta – a falta de sentido do outro, de sentido da vida, a desesperança dos excluídos, um produto do capitalismo exacerbado, desumano, que coisifica o homem, robotiza-o; a crise dos sentimentos, a falta de amor entre os iguais, a corrida desenfreada em busca do ouro, levando o homem ao “vale quanto pesa”, vale pelo que tem a oferecer, assim, constata-se ausência de alteridade, ou seja, falta a ética cristã para se ter uma sociedade mais justa.

A modernidade trouxe à baila o anarquismo, a vulgaridade; mas Augusto dos Anjos não optou pela vulgaridade, não escolheu a pornografia para chamar a atenção do mundo que (se diz civilizado) sobre a falta de esperança dos excluídos, dos miseráveis; da injustiça social. Ele manteve uma linguagem elegante, embora desagradável ao sabor dos parnasianos, uma linguagem carregada de uma carga semântica picante, acre, denominado por muitos críticos literários de: o poeta do mau gosto, do absurdo, do negro, da podridão. Sim, da podridão moral, dos valores. Augusto dos Anjos pode ser considerado um poeta de transgressão, posto que rompesse com a métrica rígida do parnasianismo cujo estilo era o equilíbrio, estética; assimilou toda crise da modernidade, as guerras, os conflitos bélicos, raciais, religiosos capitalismo selvagem, o que induz  considerá-lo contemporâneo.

Não apenas a literatura, a música da vanguarda também rompe com a “ordem”. A partir de 1930, houve uma retomada dos primeiros passos da chamada pós-modernidade, há um processo de ruptura, de transformação da estética. A Semana de Arte Moderna trouxe à tona a nota destoante de todos os equilíbrios.

A chamada pós-modernidade é uma inversão total de valores, e Augusto dos Anjos, que não é considerado pós-moderno, antecipou-se a essa inconformação.  Ele  antecede ao período de 1922, pois já chamava para a crise dos valores que dignificam o homem. Sim, era um inconformado, uma voz sem eco para sua época e, quem sabe, ainda sem o “pós” para a contemporaneidade.

A antecipação da inconformação de 1922 significa a inconformação contemporânea, pois é nesse período pré-22- que  se está vivendo hoje. Ninguém superou ainda a incerteza da modernidade, ou seja, o homem que deveria ser o centro das atenções no universo, é posto em último plano. É grande o caos da modernidade pela falta de sentido do outro, cada um pensando em si, no melhor para si, descartando seus iguais como se fossem um objeto de estimação que logo perde seu valor estimativo e torna-se descartável, o que equivale dizer que o homem vale pelo que pode produzir, pelo que tem a oferecer . O capitalismo “desumano”, cruel, é tão insaciável que se apodera do sexo  como o mapa de um mina “inesgotável”. E o homem vai ficando aqui, ali, enquanto o amor, que é algo sublime, a razão de ser da existência humana, passa o largo, sem encontrar guarida, espaço porque o homem está ocupado com o quantum o negociável, o rentável, com o sexo coisificado e banalizado, porque utilizado, praticamente, em todas as estâncias da sociedade com um único objetivo- a corrida para o ouro. E assim, o casamento e a família, enquanto instituições, estão desaparecendo. Os filhos não são mais frutos do amor, senão de momentos de prazer, mas que , em seguida, tornam-se indesejáveis porque vai mudar o decurso da vida, vai atrapalhar planos que não foram traçados, mas o destino se encarregou de fazê-los. Assim, na pós-modernidade, a maioria das crianças não desejadas, vêm ao mundo desprovidas de amor, afeto; conforme o padrão paterno, a muitas  nada lhes faltam materialmente. Mas e os sentimentos de afeto? Estas crescem sem o tempo dos pais, sem os olhares necessários ao seu desenvolvimento principalmente psicológico, sem a ajuda para dar os primeiros passos. E o mundo se encarrega da desorientação; e, lamentavelmente, as drogas são o lenitivo da afetividade.

Que tristeza! Mas é a chamada pós-modernidade que conduz o homem aos caminhos tortuosos. “Aqui é oportuno conclamar Platão: “Eduquem-se as crianças e não será preciso castigar os homens”, pois, já ensinava Rousseau que “o homem nasce bom; a sociedade  é que o corrompe”. Porém, não há tempo para o diálogo, para se ouvir o outro posto que o ter é o que importa.
   
Retomando, a literatura é uma inserção na história e, como tal, reflete toda inquietação, todos os conflitos que ocorrem a sociedade. Essa inquietação justifica-se pela inconformação diante da exclusão, que prova ma síndrome, denominada “síndrome da pós-modernidade”. Mas somente a posteridade é que confirmará a existência de tão badalado movimento.

Síndrome da confluência contemporânea

Vive-se, sim, uma modernidade tardia transformada, mas inacabada. Como viver na pós-modernidade  se até o presente não houve a “efeméride pós-moderna”?
            
Nessa linha de pensamento, Connor (1998: 11) argumenta:

Há afirmação frequente de que só se pode obter e aproveitar o conhecimento sobre coisas de alguma maneira acabadas ou encerradas. Por isso, a reivindicação de que se conhece o contemporâneo é vista muitas vezes como uma espécie de violência conceitual, uma fixação das energias fluidas e informes do agora urgente, mas tenazmente presente numa forma apreensível e exprimível, através dos atos fundamentais e irrevogáveis de seleção crítica.

Para que existisse a pós-modernidade, repetindo-se, a semana de 1922 deveria ter sido chamada “Semana da efeméride arte pós-moderna”, o que não ocorreu mesmo a modernidade, além de tardia, trata-se de um período inacabado.

Sabe-se que a sensibilidade moderna sente-se inconformada, inquieta, com a situação sócio-econômica. Porém, se essa inquietação faz parte da pós-modernidade, então deve ser tratada numa semana de perspectiva da pós-modernidade. Daí surge o questionamento: A Semana de 1922 é moderna ou efeméride pós-moderna? Há, sim, inquietações paralelas à crise da contemporaneidade. Mais uma vez retoma-se Augusto dos Anjos para recordar que ele previu esta tão propalada pós-modernidade, o caos social, o desequilíbrio dos sentimentos humanos, a falta de sentido.
            
É mister destacar que os autores de 1945 eram fechados em temas. A literatura dos anos 1945-1950 está totalmente direcionada aos aspectos sócio-políticos. Cite-se o sociólogo Gilberto Freyre com sua “casa grande & senzala”, tema focado no social, um alarde de pós-modernidade (?), já bem ratificada por Augusto dos Anjos, que confirma uma modernidade antecipada, uma tentativa de ajustar-se aos autores contemporâneos. Pode-se confirmar, com outros estudiosos, que a literatura sob a ótica augustiana é messiânica.
            
O que dizer de João Ubaldo, com seu “Sorriso de lagarto”?- Ele quebra os paradigmas dos que defendem a pós-modernidade, pois sua autonomia no “eu” lírico é um terço moderno não perceptível antes; nele tem-se uma modernidade com liberdade, sem repressão. Mesmo assim, não se pode definir a pós-modernidade a partir do discurso de João Ubaldo que, com muita convicção, afirmou que sabia de antemão ser o detentor do Nobel de Literatura 2002. É algo messiânico? – Deixou o questionamento   para reflexão do leitor.
            
Para contextualizar a pós-modernidade, segundo Connor (1998), faz falta ao homem a descoberta das características da cultura modernista e da modernidade.

Faz falta ao homem descobrir as características da cultura modernista e da modernidade em geral, pois, somente a partir destas será possível compreender claramente a modernidade. Ontem e o hoje moderno não dá ao homem o passaporte para chegar ao agora da pós-modernidade, tendo em vista que algo ainda está por fazer, por ser concluído.

Os conflitos sociais e políticos que assolam o mundo moderno são responsáveis pela exclusão social, pela fome, pelas guerras, enfim, pelo caos que domina e/ou desordena a sociedade atual. Os homens afastam-se dos iguais quando deveriam unir-se, juntar suas forças pela construção de um mundo melhor, então, poder-se-ia chamar período pós-moderno, se houver recuo dos conflitos, redução da violência, das injustiças sociais, em busca de entendimento para uma melhor qualidade de vida. Mas, somente o amor modifica o mundo porque transforma o coração do homem. E sonhar é preciso.

Alguns escritores dos anos 1950-1960 já falavam em pós-modernidade, na concepção de Connor (1998: 13), somente a partir dos anos 1970, quando começaram a guardar força as afirmações desse fenômeno social e cultural são heterogêneos entre algumas disciplinas acadêmicas e áreas culturais, na filosofia, na arquitetura, nos estudos sobre o cinema e assuntos literários.

Nessa linha de argumentação, Charles Newman (apud CONNOR, 1998: 15)  afirma:

[...] o pós-modernismo é somente o sistema representativo de uma “inflação do discurso”, que percorre todos os níveis da sociedade, mas em especial, as esferas da cultura e da comunicação [...] a linguagem crítica e a literária renunciaram deliberadamente toda relação com valor de uso confiável e acumulam obscuridade sobre obscuridade em intermináveis aspirais de autovalidação.

Habermas (apud  CONNOR, 1998: 15) assim argumenta sobre o discurso autovalidador:

[...] é possível tomar a idéia de um discurso autovalidador com um pouco mais de sobriedade, pois, se está claro que debate sobre o pós-modernismo oferece à política crítica um meio de autodivulgação e de autoprolongamento, ele também reflete e personifica o real envolvimento da crítica cultural com o que Habermas denominou a “Crise de legitimação” que afeta a vida sócio-contemporânea. 

Assim sendo, a condição pós-moderna manifesta-se em multiplicação de centros e poder e de atividade, bem como na discussão de toda espécie de narrativa totalizante que afirma governar todo o complexo campo da atividade e da representação social, conforme se pode comprovar lendo Cultura e pós-modernidade de Steven Connor.
            
A desintegração da sociedade atual, denominada por Foucault  de ´heterotopia”, consiste na falta de consenso entre o próprio universo de diferença e a pluralidade cultural, sendo notável o grau de consenso no discurso pós-moderno quanto ao fato de já não haver possibilidade de consenso, o que redime numa situação paradoxal, bem definida por Connor (1998: 17).
            
Falta à chamada pós-modernidade a sustentabilidade na desconstrução dos valores, no desequilíbrio dos sentimentos e decisões do homem, pois lhe falta o sentido do ser que deu lugar ao ter. É visível como a cultura se expandiu motivada pela difusão e diversificação das formas pelas quais a experiência cultural é medida. E a academia é uma mediadora importante nesse processo (CONNOR, 1998: 22).
            
É notório como a idéia de pós-modernidade fincou raízes profundas nos estudos literários, e na concepção de Helmut Leven ( apud CONNOR, 1998: 89), “a situação pós-moderna criou a possibilidade de ver o modernismo como uma entidade fechada e muito rígida e, se desejamos desconstruir, precisamos antes homogeneizar a nossa matéria para que ela se torne desconstrutível”.

 Nota epilogal

Os escritores caracterizados pela complexa interação entre desestruturação e uma qualidade consistente tanto no  modernismo como no pós-modernismo ( HABRAN apud  CONNOR, 1998: 93). Este estudioso fala de um sintoma de “vontade e contravontade de poder” que ele reconhece dominar os debates  acadêmicos sobre o pós-modernismo, reconhece, ainda, que a era pós-moderna está marcada por profundo questionamento de idéias e críticas sobre autoria, público, processo de literatura e a própria crítica.
            
Nesse pensar, Connor (1998: 107) observa como a literatura pós-moderna segue os motivos e preocupações de teoria pós-estruturalista institucionalizada, ecoando com simpatia todos os seus requisitos hermenêuticos.
            
Eis o posicionamento de Foucault (apud CONNOR, 1998: 183):

[...] estamos num universo pleno, um espaço radiante de poder mas também rechaço, como um pára-brisa quebrado que ainda se mantém de pé. Entretanto, esse “poder” permanece um mistério -, partindo da centralidade despótica, ele se torna, a meio caminho, uma “multiplicidade de relações” [...] e culmina, no pólo extremo, com resistência [...] tão íntimas e tênues que, falando literalmente, nesse nível microscópico, átomos de poder e átomos de resistência se fundem. O mesmo fragmento de gesto, de corpo, de olhar e de discurso contém tanto a eletricidade positiva do poder como a eletricidade negativa da resistência.

Portanto, “articular questões de poder e valor na pós-modernidade é, com freqüência, identificar princípios centralizadores – do eu, do gênero, de raça, da nação, da forma estética – para determinar o que esses centros empurram para as suas periferias silenciosas ou invisíveis”. (CONNOR, 1998: 184). 
            
É oportuno assinalar que as preferências pelo marginal é uma das características da política cultural da chamada pós-modernidade. E nessa preferência pelo  marginal está presente a escrita feminista, projetando  o feminismo como lugar do outro do patriarcado, identificado como o lado negativo, desacreditado e sombrio de toda polaridade, como o corpo diante da mente, a natureza diante da cultura, a noite diante do dia, a matéria diante da forma e a insanidade diante da razão. Nesse raciocínio, para Alice Jardine (apud CONNOR, 1998: 185), a modernidade na filosofia e na literatura é definível como a tentativa de explorar e articular esses espaços marginais, num movimento que ela denomina “ginese”:

Fornecer uma nova linguagem esses outros espaços é um projeto tanto de promessas como de temores [...] esses espaços permanecem até agora desconhecidos, terrificantes, monstruosos; são loucos, inconscientes, impróprios, impuros, sem sentido, profanos. Se deseja de fato questionar esses espaços, a filosofia tem de afastar-se de tudo o eu se tem definido – o Homem, o Sujeito, a História, o Sentido – e colocá-los em seu lugar.

Como é possível observar, a crise de sentido no mundo atual aparece com  síndrome da modernização e da pluralização da sociedade. Nesse sentido, Berger & Luckmann (2004:49) afirmam que  a modernidade significa um aumento quantitativo e qualitativo da pluralização, e se não for possível limitar a interação, causada pela pluralização, por “muros” de um tipo, o pluralismo se tornará plenamente atuante e, com isso, também uma das suas consequências: a crise “estrutural” de sentido.
            
Essa afirmação sobre a crise de sentido no mundo de hoje induz a concordar com os referidos autores  no  tocante a que o pluralismo leva a um enorme relativismo dos sistemas de valores e da interpretação.
            
Constata-se que são inúmeras as contradições desta modernidade tardia que, ao sofrer mudanças com a tecnologia, impulsionada pelo capitalismo exacerbado, que não “permite” ao homem ser o centro do universo, colocando-o em segundo plano. Desta forma, a maior contradição deste período denominado de pós-moderno está assentada na base do estruturalismo, do efêmero, do prazer, do consumo exagerado como forma de preenchimento de um vazio pela falta de sentido dos se, portanto, este movimento de efemeridade da pós-modernidade conseguiu abalara certezas inabaláveis, deixando o humano embevecido com o ter e esvaziado do ser.
            
Por conseguinte, o grande desafio de uma política pós-moderna é esta dupla perspectiva: de um lado, a transformação da história por um simples ato de vontade imaginativamente, e de outro, uma total radicalidade no sentido de que tudo é imaginativamente possível, porque , de fato, nada tem valor.

Referências

ANJOS, Augusto dos. EU e outras poesias.  Edição comemorativa dos 100 anos do EU. João Pessoa: Academia Paraibana de Letras. Senado Federal, 2012.

BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Tradução: Edgar Mauro Gama e Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.
BERGER, Peter & LUCKMANN, Thomas. Modernidade, pluralismo e crise de sentido: a orientação do homem moderno. Tradução: Edgar Orth. 2 ed. Petrópolis, RJ: Loyola, 2004.
CONNOR, Steven. Cultura pós-moderna. Introdução às teorias do contemporâneo. Tradução: Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. 2 ed. São Paulo:Loyola, 1998.
EVANGELISTA, João Emanuel. Elementos para uma crítica da cultura pós-moderna. Revista Novos Rumos. São Paulo:Novos Rumos, v. 34: 29-40, 2001.
HABERMAS, Jürgen. O discurso filosófico da modernidade. São Paulo: Cortez, 2004.
LUKÁCS, G.  Ela salto a la razón. México: Grifalbo, 1968.
_____. História e consciência de classe: estudos de dialética marxista. Porto: Escorpião, 1974.
LYOTARD, Jean-François. O pós-moderno. 4 ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olímpio, 1993.
ORLANDI, Eni Paucinelli.  Discurso e leitura. São Paulo: Cortez, 1999.
REZENDE, Antônio Paulo. (Des)encantos modernos. Recife: FUNDARP, 1997.
ROUNET, Sérgio Paulo. Mal-estar na modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
SOUSA, Manoel Matusalém. Ética e pós-modernidade.  In Plenarium. Revista acadêmica de produção do saber. Timbaúba: FACET?FAEST; João Pessoa: Idéia, Ano II, Nº 1, Agosto/2001: 11-48.
SOUSA, Manoel Matusalém; DÁLIA FILHO, Luisimar (Orgs.). Síndrome da pós-modernidade:  pensando o nosso tempo. Filosofia. Política. Educação. Direito.  João Pessoa: Imprim, 2011: 153-168.
SUBIRATS, Eduardo. Da vanguarda ao pós-moderno.  4 ed. São Paulo: Nobel, 1991.
[1] Este ensaio foi revisado e atualizado. Encontra-se publicado na coletânea Síndrome da pós-modernidade:  pensando o nosso tempo, organizada por SOUSA, Manoel Matusalém; DÁLIA FILHO, Luisimar.  João Pessoa: Imprim, 2011: 153-168.

Enviado pelo escritor, professor e pesquisador do cangaço José Romero Araújo Cardoso

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