Por Marinalva
Freire da Silva
O termo ‘pós-modernidade’ é um
modismo na língua; foi criado para fazer referência aos fatos que vêm depois, o
que significa dizer que indica uma ruptura na qual o pós-moderno passa a negar
o moderno, quando, na realidade, trata-se das modificações provocadas pela
revolução tecnológica, fruto da sociedade capitalista. Nesta fase há uma quebra
de paradigmas, uma inversão de valores.
A vanguarda é a mais importante
revolução cultural e política, rompendo com todas as convenções do passado e
ressoando na história.
Para que haja uma ruptura, faz-se
necessário que ressoe na história, ou seja, é necessário que tal fato se torne
uma referência para outras manifestações (ORLANDI, 2006) sobre que movimentos
de vanguarda guarda eclodem em uma sociedade em tramitação que passa de um
cenário agrário a um urbano.
Sousa (2001: 29) argumenta que a
pós-modernidade é uma experiência cultural, uma condição ou talvez a combinação
das duas. Nesse sentido, Lyon (apud SOUSA, 2001) considera a pós-modernidade uma
ideia de forma de crítica na mente dos intelectuais e nos meios de comunicação.
O curioso é que a pós-modernidade só pode ser
entendida com sua cumplicidade ética do
ser que estão no espaço antes preenchido pela modernidade, o que significa
dizer que os desafios que os desafios pós-modernos estão voltados para os
ideais, os valores e os símbolos da vida capitalista, como eles aparecem na
vida dos consumidores e no consumo mesmo.
Para reforçar o que foi dito no
parágrafo anterior, Sousa (2001: 39) refere que a pós-modernidade não se faz à
custa da economia capitalista e sem esgotamento pelos anos 70. É o neoliberalismo que, teoricamente,
justifica a crise do método capitalista pela intervenção do Estado na
manipulação do mercado.
Nessa linha de raciocínio,
enfatiza-se a ideia de que o homem é um ser de necessidades e desejos, que,
para serem satisfeitos, necessitam de recursos. Na concepção de Sousa (2001), é
o equilíbrio entre fatores de produção e consumidores e aspiração da
pós-modernidade: mercado perfeito.
É
oportuno destacar que a evolução tecnológica vivenciada no século XX ocasionou
grandes modificações na sociedade. Tais modificações foram na maioria,
desencadeadas pela cultura de massa com os meios de comunicação, resultando
conceitos e manipulando ao agir de milhões de pessoas. O consumo e suas
implicações constituem o fenômeno que merece especial atenção, tendo em vista
que este é a mola propulsora da chamada ‘pós-modernidade’. A mídia do consumo
humano que virou uma necessidade vital na atual sociedade, oportunizando uma
enorme inversão de valores, a partir da educação primária – a do lar. A
estética “es+ética” responde pela coisificação do ser humano. O homem vale
quanto “pesa”, quanto tem de material, em detrimento de todo seu potencial.
A
espiritualidade foi posta à margem da sociedade. Em nome dessa exacerbada
necessidade de consumir, o homem afasta
de sua frente seus iguais “impiedosamente”, aqui se faz referência ao
grau de violência que assola a sociedade contemporânea, tudo em busca do ter, pois é muito bom ter, melhor ainda é
ter e ser, mas não sendo possível ambos, o último é muito importante porque
nele estão inseridos os valores espirituais
que faz o homem ser diferente dos irracionais.
Segundo
Freud (apud BAUMAN, 1998: 8), a civilização se constrói sobre uma renúncia ao
instinto, pois a modernidade impõe grandes sacrifícios à sexualidade e
agressividade do homem. O anseio de
liberdade, portanto, é dirigido contra formas e exigências particulares da
civilização ou contra esta como um todo.
Prosseguindo,
Freud, já referido, argumenta:
[...] os prazeres da vida
civilizada [...] vêm em um pacote fechado com os sofrimentos, a satisfação com
o mal-estar, a submissão com a rebelião. A civilização – a ordem imposta a uma
humanidade naturalmente desordenada – é um compromisso, uma troca continuamente
reclamada e para sempre instigada a se negociar. O princípio de prazer está aí
reduzido à medida do princípio de realidade e as normas compreendem essa
realidade que é a medida do realista. ‘O homem civilizado trocou um quinhão das
suas possibilidades de felicidade por um quinhão de segurança’.
Entretanto,
na concepção de Bauman (1998: 91), dentro da estrutura de uma civilização
concentrada na segurança, mais liberdade em nome da segurança significa mais
mal-estar:
Nossa hora, contudo, é a da
desregulamentação. Princípio da realidade, hoje, tem de se defender no tribunal
da justiça onde o princípio de prazer é o juiz que a está presidindo. ‘A ideia
de que há dificuldades inerentes à natureza da civilização que não se
submeterão a qualquer tentativa de reforma’, parece ter perdido sua prístina
obviedade. A compulsão e a renúncia forçada, em vez de exasperante necessidade,
converteram-se numa injustificada
investida desfechada contra a liberdade individual.
FRANÇOISE
Choy (apud REZENDE, 1997: 24) refere:
[...] a sociedade moderna produz
as metrópoles, conturbações, cidades industriais, grandes conjuntos habitacionais,
mas fracassam na ordenação desses locais; a cidade está sempre em movimento, um
movimento que é impossível de ser percebido na sua totalidade e que não tenha
talvez um sentido comum.
O que se entende, produz o caos,
a desordem, a falta de espaço, o aglomerado humano desordenado. Mas, é inegável
que a sociedade moderna industrial é essencialmente urbana, constitui-se por assim dizer, os territórios
do sagrado e do profano. No que um se revela, no outro, se esconde, às
vezes nos confundimos. Nesse pensar,
ainda na concepção de Rezende (1997: 25):
[..] os caminhos para a cidade
moderna não passaram apenas pelas trilhas da industrialização, tendo em vista
que não houve essa relação de necessidade absoluta. A modernidade tem suas
ligações intrínsecas com a modernização e o espaço físico desta, sua concretude
acelera a modernidade, alarga os sentimentos dos que se dizem progressistas.
Diante do exposto, as grandes
cidades representam, por conseguinte, forte tensão entre o moderno e o
tradicional. E a pós-modernidade, segundo Lyotard (apud SOUSA, 2001:118), faz referência à mudança de
uma época para outra, surgindo uma nova tecnologia e transmissão de
informações. Contudo, urge definir-se o
perfil do que se chama pós-modernidade.
Tipologia de pós-moderno
As
discussões em torno da realidade presente dão a noção de que as mudanças e os
novos problemas vividos pela humanidade significam ou indicam uma situação
histórica sem precedentes, configurando a própria crise da modernidade, tornaram-se
praticamente um lugar comum. É consensual o envolvimento e a crise da
modernidade. Neste compreender, destaca-se o pensamento pós-moderno que surgiu
na década de 1970 nos países capitalistas industrializados, no início dirigido
à tematização das questões estéticas e arquitetônicas.
Como
o próprio tema sugere, o pensamento pós-moderno se afirmaria como expressão
intelectual de uma nova ordem societária que se está formando em contraposição
à modernidade em crise. Em outros temas seria a expressão teórica e cultural de
uma nova situação sócio-histórica: a condição pós-moderna.
O
pensamento pós-moderno instauraria uma nova modalidade de racionalidade e de
cultura, que seria a expressão de um conjunto de transformações econômicas,
sociais e políticas, produzindo uma mudança qualitativa nas instituições da
sociedade moderna. Desse modo, o pensamento pós-moderno significaria, ao mesmo
tempo, uma crítica e uma ruptura com a modernidade, com implicações que atingem
desde a vida cotidiana até a produção de conhecimento social.
Na
discussão atual sobre pós-modernidade, constata-se uma grande confusão e
indefinição quanto ao seu significado e à sua abrangência conceitual (Veja-se:
EVANGELISTA, 2001; LYOTARD, 1978; ROUANET, 993; SUBIRATS, 1991). A noção de
pós-moderno possui as aplicações mais diferenciadas:
Nessa
linha de raciocínio, Lukács (1968; 1974) se expressa que ora aparece tratando
da estética (na arquitetura, na literatura ou na pintura), outras vezes, referindo-se aos fenômenos abrangentes da
esfera cultural (inflexões temáticas epistemológicas da ciência e da filosofia)
e ainda podendo pretender dar conta de mudanças estruturais que teriam ocorrido
ou estariam ocorrendo, no conjunto da sociedade, da economia, da política e da
cultura.
Percebe-se,
pois, que não há consenso, tampouco se o pós-moderno representa uma
continuidade ou uma ruptura com o modernismo, constitui-se um estilo ou uma
periodização histórica; se é revolucionário e inovador ou uma domesticação do modernismo; se consiste
numa crítica ou numa integração à política neo-conservadora hegemônica no mundo ou, ainda, se se configura uma
reestruturação radical da sociedade ou
se é exatamente a lógica cultural do capitalismo avançado (LUKÁCS, 1974).
Teoricamente,
do ponto de vista estático, político e ideológico, a ambiguidade ou a ambivalência constitui uma das
características mais salientes do pensamento pós-moderno. Entre outros traços
da contemporaneidade pós-moderna, o princípio esvaziador do mundo e da
sociedade moderna é sistemático de modo a ver-se o seguinte: Estar-se-iam
processando a desreferencialização do Real, a desmaterialização da Economia, a
destatização da filosofia, a despolitização da Sociedade e a
dessubstancialização de Sujeito. (EVANGELISTA, 2001).
Tudo
o que existe estaria marcado pela efemeridade, pela fragmentação, pela
indeterminação, pela descontinuidade, pelo seletismo das diferenças e pelo caos
paradoxal.
O cotidiano constitui, por
conseguinte, o espaço onde se encontram condensados esses traços definidores da
pós-modernidade através da publicidade, que invadiu todos os espaços da vida do
homem pela estetização dos objetos de consumo, a erotização e a personalização das
mercadorias. Numa palavra, a realidade social de desmaterializou e passou a ser
o signo que transformou o cotidiano na vivência imediata de simulacros,
instaurando-se a hiper-realidade pela generalização da informação e da
simulação na sociedade informatizada de massas.
Augusto dos Anjos e a
pós-modernidade
A
modernidade é um projeto inacabado (HABERMAS, 2000). Ele teve início muito
antes da Semana de Arte Moderna, em 1922, deu o recado do caos telúrico através
de um reflexo do futuro incerto, como o é todo futuro. É fácil justificar este
argumento, quando se toma por parâmetro a agonia cósmica do “Eu” de Augusto dos
Anjos, escritor de uma única obra, que disse para o que veio; ele antecedeu,
sim, a Semana de 1922, traçando o caminho do “absurdo”, do caos “telúrico” a
partir de “uma Sombra”, previu os acontecimentos do mundo moderno, como as duas
primeiras guerras mundiais, a era da cibernética, a inversão dos valores
humanos, as grandes descobertas científico-tecnológicas, um marco da
modernidade. Nele se encontra uma ruptura profunda, uma crise de valores:
“Tome, Dr. ,esta tesoura,
e...corte
Minha singularíssima pessoa.
Que importa a mim que a bicharia
roa
Todo o meu coração, depois da
morte?!
(Budismo
moderno.In Eu, 2012: 76, v. 1-4)
A falta de esperança, de
perspectiva de dias melhores amargura a existência de um poeta “agônico”. Neste
espaço de angusticidade, Augusto dos Anjos quebra os paradigmas da ordem
estética, proclama o caos que assola a humanidade. Tem visão apocalíptica;
transgride a ordem da poesia, quebra os grilhões do parnasianismo, da mesmice,
do modelo enfadonho da época. Sua obra é uma ponte entre o moderno e o
contemporâneo. A aspereza de seus versos é
fruto da modernidade, é um grito que lhe estava preso na garganta – a falta de
sentido do outro, de sentido da vida, a desesperança dos excluídos, um produto
do capitalismo exacerbado, desumano, que coisifica o homem, robotiza-o; a crise
dos sentimentos, a falta de amor entre os iguais, a corrida desenfreada em
busca do ouro, levando o homem ao “vale quanto pesa”, vale pelo que tem a
oferecer, assim, constata-se ausência de alteridade, ou seja, falta a ética
cristã para se ter uma sociedade mais justa.
A modernidade trouxe à baila o
anarquismo, a vulgaridade; mas Augusto dos Anjos não optou pela vulgaridade,
não escolheu a pornografia para chamar a atenção do mundo que (se diz
civilizado) sobre a falta de esperança dos excluídos, dos miseráveis; da
injustiça social. Ele manteve uma linguagem elegante, embora desagradável ao
sabor dos parnasianos, uma linguagem carregada de uma carga semântica picante,
acre, denominado por muitos críticos literários de: o poeta do mau gosto, do
absurdo, do negro, da podridão. Sim, da podridão moral, dos valores. Augusto
dos Anjos pode ser considerado um poeta de transgressão, posto que rompesse com
a métrica rígida do parnasianismo cujo estilo era o equilíbrio, estética;
assimilou toda crise da modernidade, as guerras, os conflitos bélicos, raciais,
religiosos capitalismo selvagem, o que induz
considerá-lo contemporâneo.
Não apenas a literatura, a música
da vanguarda também rompe com a “ordem”. A partir de 1930, houve uma retomada
dos primeiros passos da chamada pós-modernidade, há um processo de ruptura, de
transformação da estética. A Semana de Arte Moderna trouxe à tona a nota
destoante de todos os equilíbrios.
A chamada pós-modernidade é uma inversão
total de valores, e Augusto dos Anjos, que não é considerado pós-moderno,
antecipou-se a essa inconformação. Ele antecede ao período de 1922, pois já chamava
para a crise dos valores que dignificam o homem. Sim, era um inconformado, uma
voz sem eco para sua época e, quem sabe, ainda sem o “pós” para a
contemporaneidade.
A antecipação da inconformação de
1922 significa a inconformação contemporânea, pois é nesse período pré-22- que se está vivendo hoje. Ninguém superou ainda a
incerteza da modernidade, ou seja, o homem que deveria ser o centro das
atenções no universo, é posto em último plano. É grande o caos da modernidade
pela falta de sentido do outro, cada um pensando em si, no melhor para si,
descartando seus iguais como se fossem um objeto de estimação que logo perde
seu valor estimativo e torna-se descartável, o que equivale dizer que o homem
vale pelo que pode produzir, pelo que tem a oferecer . O capitalismo
“desumano”, cruel, é tão insaciável que se apodera do sexo como o mapa de um mina “inesgotável”. E o
homem vai ficando aqui, ali, enquanto o amor, que é algo sublime, a razão de
ser da existência humana, passa o largo, sem encontrar guarida, espaço porque o
homem está ocupado com o quantum o negociável, o rentável, com o sexo coisificado
e banalizado, porque utilizado, praticamente, em todas as estâncias da
sociedade com um único objetivo- a corrida para o ouro. E assim, o casamento e
a família, enquanto instituições, estão desaparecendo. Os filhos não são mais
frutos do amor, senão de momentos de prazer, mas que , em seguida, tornam-se
indesejáveis porque vai mudar o decurso da vida, vai atrapalhar planos que não
foram traçados, mas o destino se encarregou de fazê-los. Assim, na
pós-modernidade, a maioria das crianças não desejadas, vêm ao mundo desprovidas
de amor, afeto; conforme o padrão paterno, a muitas nada lhes faltam materialmente. Mas e os
sentimentos de afeto? Estas crescem sem o tempo dos pais, sem os olhares
necessários ao seu desenvolvimento principalmente psicológico, sem a ajuda para
dar os primeiros passos. E o mundo se encarrega da desorientação; e,
lamentavelmente, as drogas são o lenitivo da afetividade.
Que tristeza! Mas é a chamada
pós-modernidade que conduz o homem aos caminhos tortuosos. “Aqui é oportuno
conclamar Platão: “Eduquem-se as crianças e não será preciso castigar os
homens”, pois, já ensinava Rousseau que “o homem nasce bom; a sociedade é que o corrompe”. Porém, não há tempo para o
diálogo, para se ouvir o outro posto que o ter é o que importa.
Retomando, a literatura é uma
inserção na história e, como tal, reflete toda inquietação, todos os conflitos
que ocorrem a sociedade. Essa inquietação justifica-se pela inconformação
diante da exclusão, que prova ma síndrome, denominada “síndrome da pós-modernidade”.
Mas somente a posteridade é que confirmará a existência de tão badalado
movimento.
Síndrome da confluência
contemporânea
Vive-se,
sim, uma modernidade tardia transformada, mas inacabada. Como viver na
pós-modernidade se até o presente não
houve a “efeméride pós-moderna”?
Nessa
linha de pensamento, Connor (1998: 11) argumenta:
Há afirmação frequente de que só
se pode obter e aproveitar o conhecimento sobre coisas de alguma maneira
acabadas ou encerradas. Por isso, a reivindicação de que se conhece o
contemporâneo é vista muitas vezes como uma espécie de violência conceitual,
uma fixação das energias fluidas e informes do agora urgente, mas tenazmente
presente numa forma apreensível e exprimível, através dos atos fundamentais e
irrevogáveis de seleção crítica.
Para
que existisse a pós-modernidade, repetindo-se, a semana de 1922 deveria ter
sido chamada “Semana da efeméride arte pós-moderna”, o que não ocorreu mesmo a
modernidade, além de tardia, trata-se de um período inacabado.
Sabe-se
que a sensibilidade moderna sente-se inconformada, inquieta, com a situação
sócio-econômica. Porém, se essa inquietação faz parte da pós-modernidade, então
deve ser tratada numa semana de perspectiva da pós-modernidade. Daí surge o
questionamento: A Semana de 1922 é moderna ou efeméride pós-moderna? Há, sim,
inquietações paralelas à crise da contemporaneidade. Mais uma vez retoma-se
Augusto dos Anjos para recordar que ele previu esta tão propalada
pós-modernidade, o caos social, o desequilíbrio dos sentimentos humanos, a
falta de sentido.
É
mister destacar que os autores de 1945 eram fechados em temas. A literatura dos
anos 1945-1950 está totalmente direcionada aos aspectos sócio-políticos.
Cite-se o sociólogo Gilberto Freyre com sua “casa grande & senzala”, tema
focado no social, um alarde de pós-modernidade (?), já bem ratificada por
Augusto dos Anjos, que confirma uma modernidade antecipada, uma tentativa de
ajustar-se aos autores contemporâneos. Pode-se confirmar, com outros
estudiosos, que a literatura sob a ótica augustiana é messiânica.
O
que dizer de João Ubaldo, com seu “Sorriso de lagarto”?- Ele quebra os
paradigmas dos que defendem a pós-modernidade, pois sua autonomia no “eu”
lírico é um terço moderno não perceptível antes; nele tem-se uma modernidade
com liberdade, sem repressão. Mesmo assim, não se pode definir a
pós-modernidade a partir do discurso de João Ubaldo que, com muita convicção,
afirmou que sabia de antemão ser o detentor do Nobel de Literatura 2002. É algo
messiânico? – Deixou o questionamento para reflexão do leitor.
Para
contextualizar a pós-modernidade, segundo Connor (1998), faz falta ao homem a
descoberta das características da cultura modernista e da modernidade.
Faz falta ao homem descobrir as
características da cultura modernista e da modernidade em geral, pois, somente
a partir destas será possível compreender claramente a modernidade. Ontem e o
hoje moderno não dá ao homem o passaporte para chegar ao agora da
pós-modernidade, tendo em vista que algo ainda está por fazer, por ser concluído.
Os conflitos sociais e políticos que assolam o
mundo moderno são responsáveis pela exclusão social, pela fome, pelas guerras,
enfim, pelo caos que domina e/ou desordena a sociedade atual. Os homens
afastam-se dos iguais quando deveriam unir-se, juntar suas forças pela
construção de um mundo melhor, então, poder-se-ia chamar período pós-moderno,
se houver recuo dos conflitos, redução da violência, das injustiças sociais, em
busca de entendimento para uma melhor qualidade de vida. Mas, somente o amor
modifica o mundo porque transforma o coração do homem. E sonhar é preciso.
Alguns escritores dos anos 1950-1960 já
falavam em pós-modernidade, na concepção de Connor (1998: 13), somente a partir
dos anos 1970, quando começaram a guardar força as afirmações desse fenômeno
social e cultural são heterogêneos entre algumas disciplinas acadêmicas e áreas
culturais, na filosofia, na arquitetura, nos estudos sobre o cinema e assuntos
literários.
Nessa linha de argumentação,
Charles Newman (apud CONNOR, 1998: 15) afirma:
[...] o pós-modernismo é somente
o sistema representativo de uma “inflação do discurso”, que percorre todos os
níveis da sociedade, mas em especial, as esferas da cultura e da comunicação
[...] a linguagem crítica e a literária renunciaram deliberadamente toda
relação com valor de uso confiável e acumulam obscuridade sobre obscuridade em
intermináveis aspirais de autovalidação.
Habermas
(apud CONNOR, 1998: 15) assim argumenta
sobre o discurso autovalidador:
[...] é possível tomar a idéia de
um discurso autovalidador com um pouco mais de sobriedade, pois, se está claro
que debate sobre o pós-modernismo oferece à política crítica um meio de
autodivulgação e de autoprolongamento, ele também reflete e personifica o real
envolvimento da crítica cultural com o que Habermas denominou a “Crise de
legitimação” que afeta a vida sócio-contemporânea.
Assim
sendo, a condição pós-moderna manifesta-se em multiplicação de centros e poder
e de atividade, bem como na discussão de toda espécie de narrativa totalizante
que afirma governar todo o complexo campo da atividade e da representação
social, conforme se pode comprovar lendo Cultura e pós-modernidade de Steven
Connor.
A
desintegração da sociedade atual, denominada por Foucault de ´heterotopia”, consiste na falta de
consenso entre o próprio universo de diferença e a pluralidade cultural, sendo
notável o grau de consenso no discurso pós-moderno quanto ao fato de já não
haver possibilidade de consenso, o que redime numa situação paradoxal, bem
definida por Connor (1998: 17).
Falta
à chamada pós-modernidade a sustentabilidade na desconstrução dos valores, no
desequilíbrio dos sentimentos e decisões do homem, pois lhe falta o sentido do
ser que deu lugar ao ter. É visível como a cultura se expandiu motivada pela
difusão e diversificação das formas pelas quais a experiência cultural é
medida. E a academia é uma mediadora importante nesse processo (CONNOR, 1998:
22).
É
notório como a idéia de pós-modernidade fincou raízes profundas nos estudos literários,
e na concepção de Helmut Leven ( apud CONNOR, 1998: 89), “a situação
pós-moderna criou a possibilidade de ver o modernismo como uma entidade fechada
e muito rígida e, se desejamos desconstruir, precisamos antes homogeneizar a
nossa matéria para que ela se torne desconstrutível”.
Nota epilogal
Os
escritores caracterizados pela complexa interação entre desestruturação e uma
qualidade consistente tanto no
modernismo como no pós-modernismo ( HABRAN apud CONNOR, 1998: 93). Este estudioso fala de um
sintoma de “vontade e contravontade de poder” que ele reconhece dominar os
debates acadêmicos sobre o
pós-modernismo, reconhece, ainda, que a era pós-moderna está marcada por
profundo questionamento de idéias e críticas sobre autoria, público, processo
de literatura e a própria crítica.
Nesse
pensar, Connor (1998: 107) observa como a literatura pós-moderna segue os
motivos e preocupações de teoria pós-estruturalista institucionalizada, ecoando
com simpatia todos os seus requisitos hermenêuticos.
Eis
o posicionamento de Foucault (apud CONNOR, 1998: 183):
[...] estamos num universo pleno,
um espaço radiante de poder mas também rechaço, como um pára-brisa quebrado que
ainda se mantém de pé. Entretanto, esse “poder” permanece um mistério -,
partindo da centralidade despótica, ele se torna, a meio caminho, uma
“multiplicidade de relações” [...] e culmina, no pólo extremo, com resistência
[...] tão íntimas e tênues que, falando literalmente, nesse nível microscópico,
átomos de poder e átomos de resistência se fundem. O mesmo fragmento de gesto,
de corpo, de olhar e de discurso contém tanto a eletricidade positiva do poder
como a eletricidade negativa da resistência.
Portanto,
“articular questões de poder e valor na pós-modernidade é, com freqüência,
identificar princípios centralizadores – do eu, do gênero, de raça, da nação,
da forma estética – para determinar o que esses centros empurram para as suas
periferias silenciosas ou invisíveis”. (CONNOR, 1998: 184).
É
oportuno assinalar que as preferências pelo marginal é uma das características
da política cultural da chamada pós-modernidade. E nessa preferência pelo marginal está presente a escrita feminista,
projetando o feminismo como lugar do
outro do patriarcado, identificado como o lado negativo, desacreditado e
sombrio de toda polaridade, como o corpo diante da mente, a natureza diante da
cultura, a noite diante do dia, a matéria diante da forma e a insanidade diante
da razão. Nesse raciocínio, para Alice Jardine (apud CONNOR, 1998: 185), a
modernidade na filosofia e na literatura é definível como a tentativa de
explorar e articular esses espaços marginais, num movimento que ela denomina “ginese”:
Fornecer uma nova linguagem esses
outros espaços é um projeto tanto de promessas como de temores [...] esses
espaços permanecem até agora desconhecidos, terrificantes, monstruosos; são
loucos, inconscientes, impróprios, impuros, sem sentido, profanos. Se deseja de
fato questionar esses espaços, a filosofia tem de afastar-se de tudo o eu se
tem definido – o Homem, o Sujeito, a História, o Sentido – e colocá-los em seu
lugar.
Como
é possível observar, a crise de sentido no mundo atual aparece com síndrome da modernização e da pluralização da
sociedade. Nesse sentido, Berger & Luckmann (2004:49) afirmam que a modernidade significa um aumento
quantitativo e qualitativo da pluralização, e se não for possível limitar a
interação, causada pela pluralização, por “muros” de um tipo, o pluralismo se
tornará plenamente atuante e, com isso, também uma das suas consequências: a
crise “estrutural” de sentido.
Essa
afirmação sobre a crise de sentido no mundo de hoje induz a concordar com os
referidos autores no tocante a que o pluralismo leva a um enorme
relativismo dos sistemas de valores e da interpretação.
Constata-se
que são inúmeras as contradições desta modernidade tardia que, ao sofrer
mudanças com a tecnologia, impulsionada pelo capitalismo exacerbado, que não
“permite” ao homem ser o centro do universo, colocando-o em segundo plano.
Desta forma, a maior contradição deste período denominado de pós-moderno está
assentada na base do estruturalismo, do efêmero, do prazer, do consumo
exagerado como forma de preenchimento de um vazio pela falta de sentido dos se,
portanto, este movimento de efemeridade da pós-modernidade conseguiu abalara
certezas inabaláveis, deixando o humano embevecido com o ter e esvaziado do ser.
Por
conseguinte, o grande desafio de uma política pós-moderna é esta dupla
perspectiva: de um lado, a transformação da história por um simples ato de
vontade imaginativamente, e de outro, uma total radicalidade no sentido de que
tudo é imaginativamente possível, porque , de fato, nada tem valor.
Referências
ANJOS, Augusto dos. EU e outras
poesias. Edição comemorativa dos 100
anos do EU. João Pessoa: Academia Paraibana de Letras. Senado Federal, 2012.
BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da
pós-modernidade. Tradução: Edgar Mauro Gama e Cláudia Martinelli Gama. Rio de
Janeiro: Zahar, 1998.
BERGER, Peter & LUCKMANN,
Thomas. Modernidade, pluralismo e crise de sentido: a orientação do homem
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CONNOR, Steven. Cultura
pós-moderna. Introdução às teorias do contemporâneo. Tradução: Adail Ubirajara
Sobral e Maria Stela Gonçalves. 2 ed. São Paulo:Loyola, 1998.
EVANGELISTA, João Emanuel. Elementos
para uma crítica da cultura pós-moderna. Revista Novos Rumos. São Paulo:Novos
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HABERMAS, Jürgen. O discurso
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LUKÁCS, G. Ela salto a la razón. México: Grifalbo, 1968.
_____. História e consciência de
classe: estudos de dialética marxista. Porto: Escorpião, 1974.
LYOTARD, Jean-François. O
pós-moderno. 4 ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olímpio, 1993.
ORLANDI, Eni Paucinelli. Discurso e leitura. São Paulo: Cortez, 1999.
REZENDE, Antônio Paulo. (Des)encantos
modernos. Recife: FUNDARP, 1997.
ROUNET, Sérgio Paulo. Mal-estar
na modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
SOUSA, Manoel Matusalém. Ética e
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SOUSA, Manoel Matusalém; DÁLIA
FILHO, Luisimar (Orgs.). Síndrome da pós-modernidade: pensando o nosso tempo. Filosofia. Política.
Educação. Direito. João Pessoa: Imprim,
2011: 153-168.
SUBIRATS, Eduardo. Da vanguarda
ao pós-moderno. 4 ed. São Paulo: Nobel,
1991.
[1] Este ensaio foi revisado e atualizado. Encontra-se
publicado na coletânea Síndrome da pós-modernidade: pensando o nosso tempo, organizada por SOUSA,
Manoel Matusalém; DÁLIA FILHO, Luisimar.
João Pessoa: Imprim, 2011: 153-168.
Enviado pelo escritor, professor e pesquisador do cangaço José Romero Araújo Cardoso
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