Por: Rangel Alves
da Costa(*)
MÚSICA CLÁSSICA AO ENTARDECER
Indubitavelmente,
ouvir música clássica faz bem em todos os momentos, desde o amanhecer ao sentir
a lua. E mais adiante, no silêncio da madrugada.
Contudo, não é
todo instante que ela tem o dom de adentrar no espírito, bailar na alma,
despertar os sentimentos. Como um processo, sua fruição exige o atendimento de
certos requisitos pessoais, ambientais, temporais e até climáticos. Ao menos
penso assim.
Não consigo
sentir qualquer prazer, fruir em profundidade sua melodia, se o barulho impede
a viagem conjunta que necessariamente se faz. Daí que o maior silêncio possível
se torna imprescindível para navegar nas águas, voar nas asas e passear nas
nuvens das sonatas, noturnos, valsas, prelúdios, e muito mais.
Mesmo sem que
eu esteja bebendo cerveja, uísque ou vinho, creio que um bom vinho se torna
como um instrumento essencial para despertar a sinfônica dos sentimentos.
Sorvê-lo junto aos acordes musicais é dançar a mesma valsa, viajar pelo mesmo
noturno, avistar o olhar meigo do cisne à beira do lago. E depois dar passos
nesse balé.
Nem som muito
alto nem muito baixo. Contudo, difícil obter o volume exato quando se ouve, por
exemplo, O Fortuna, da Ópera Carmina Burana, de Carl Orff, ou mesmo a Cavalaria
Rusticana, de Pietro Mascagni. Os acordes quase silenciosos repentinamente
irrompem de forma magistral.
Acerca do
ambiente ideal, verdade é que não há nenhuma grande exigência para se ouvir
música clássica. Existe, porém, alguns fatores que devem ser considerados.
Tchaikovsky certamente se sentiria desconfortável ao ser ouvido em meio a
multidões barulhentas, em meio a vozes que entrecortem sua música, em lugares
que o próprio ouvinte não se sente bem.
Penso, sim,
que a música pode ser melhor apreciada, saboreada, espiritualmente alcançada,
em ambiente de silêncio e paz. Sempre bom ter uma janela aberta onde o vento
bata na cortina e adentre trazendo um perfume bom. E da janela lançar o olhar
sobre as paisagens, as nuvens, sobre tudo que inunda de prazer o singular
momento.
Mas cuidado
com a janela e também com o olhar. Certamente surgirá uma vontade imensa de
voar, de seguir a revoada passarinheira que corta o horizonte naquele momento.
E também - e tantas vezes ocorre assim - será momento de a saudade chegar, as
recordações atiçarem o peito, trazendo antigas cartas e fotografias. Por isso
cuidado com as lágrimas.
Mas prefiro a
música clássica ao entardecer. Ainda que seja um noturno, sempre me cai melhor
ao entardecer. Colocar na vitrola Schubert, Tchaikovsky, Mozart, Strauss,
Lizst, Schumann, Offenbach, Vivaldi, Bach, Richard Wagner, Beethoven, dentre
muitos outros, não há nada que supere a singeleza e a grandeza do momento.
A orquestra
traz a plangência, a melodia, o encanto, o indescritível mistério do viajar
pelas sinfonias, enquanto olhar se molha de por de sol, do vermelho-saudade do
entardecer. E tudo parece tão sentimentalmente forte que de repente é possível
se sentir como folha ao vento, como pedaço de nuvem, como a própria brisa que
passa. E também viajar pelos salões suntuosos, onde as luzes de velas sopram ao
sabor das valsas vienenses.
Tudo tão
bonito adiante e dentro de mim, e pelo ar o voo da música, do barco com asas
percorrendo o Danúbio Azul: “Danúbio tão azul, tão brilhante e azul, através de
vales e campos, você flui tão calmo, nossa Viena cumprimenta, sua corrente de
prata, através de todas as terras você alegra o coração com suas belas praias.
Longe da Floresta Negra você se apressa para o mar dá a sua bênção para tudo. A
leste de fluxo, acolhe seus irmãos, uma imagem de paz de todos os tempos! Os antigos
castelos são visíveis de baixo para o alto, agradecendo seus sorrisos de suas
íngremes colinas escarpadas, e vistas das montanhas espelham em suas ondas
dançantes...”. Conheço a letra, viajo também.
E um pouco
mais tarde, ao cair da noite, acendo a vela. E eis a valsa ali, à minha frente,
no passo da chama que me chama ao contentamento com a grandiosidade da vida e
sua tão bela música.
Ouça
(Poesia)
Ouça
Não
sei
se
sei dizer
o
que quero dizer
a
você
do
jeito que
queria
dizer
sem
dizer
mais
nem menos
do
que penso
dizer
a você
mas
se vou dizer
tenho
a dizer
esse
meu silêncio
sem
nada dizer
esse
meu grito
de
nada entender
só
fala em você
por
amar você
por
querer você.
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e cronista
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