sexta-feira, 26 de abril de 2013

SAMBALELÊ TÁ DOENTE - CRÔBICA


Por: Rangel Alves da Costa(*)


SAMBALELÊ TÁ DOENTE

Infelizmente, o que se constata é uma enfermidade generalizada nas autênticas brincadeiras e diversões infantis. O abandono das cantigas de roda, das velhas e comoventes canções, das inocentes brincadeiras e diversões e dos inventos artesanais que se tornavam a alegria da meninada, passou a comprometer a própria saúde da infância.

Fato é que a grande maioria das crianças de hoje jamais brincou de roda no meio da rua, arremessou bola de gude no pequeno buraco, pulou corda ao entardecer, brincou de pula-pula, teve boi de barro na estante de seu quartinho, cantarolou versinhos humanizando animais. E assim o fazem porque não conhecem e nem são ensinados e motivados ao ludismo nos moldes de antigamente.


Aquilo que tanto serviu como autêntico prazer aos avôs e pais foi, forçadamente, ficando para trás, relegado ao desuso. E de forma lamentável, pois aquelas brincadeiras repassadas de geração a geração poderiam se eternizar sendo consideradas cada vez mais importantes no desenvolvimento psicossocial dos meninos e meninas. E tudo porque possuidoras de singelezas que tão bem despertam o interesse dos pequeninos.

 Eram as mesmas crianças, com suas inocências, sonhos e aspirações, só que distantes dos apelos mercadológicos de hoje, onde se impõe a máquina como fator de atratividade infantil. E, por consequência, tornando a criança num mero manipulador de tecnologias desinteressantes e solitárias. A infância de hoje, infelizmente, se vê refém do brinquedo a pilha, a chip, computadorizado.

Quem tem mais idade certamente lembra-se do que estou falando. Esquecia-se de tudo brincando no meio da praça, debaixo da lua, nos quintais, nos cantos da casa, nos pátios escolares, nos instantes de recreação. Contudo, aos poucos tudo foi sendo relegado de tal forma que praticamente ninguém fala mais sequer em “pinta-lainha”. Isso mesmo, aquela brincadeira de adivinhar dando pequeno beliscão na mão do outro para ver se ali estava o segredo. “O rei mandou dizer que eu tirasse essa aqui...”.

O esquecimento e o desuso das velhas brincadeiras e cantigas, aliados à omissão e ao descaso dos responsáveis pela formação educacional e lúdica das crianças, vão empobrecendo o acervo e a memória das coisas belas e divertidas da vida. E é como se o cancioneiro infantil estivesse fragilizado, adoecido, tendente ao desaparecimento. Assim como um Sambalelê que tá doente.
  
Não só o Sambalelê tá doente, mas também Os escravos de Jó, o Lobo mau, o Sapo que não lava o pé, a Galinha pintadinha, o Pirulito que bate-bate, o Marinheiro só, o Boi da cara preta e a Canoa que virou. E mais, muito mais cantigas infantis adoecidas pelos sintomas do progresso.

Não só as cantigas infantis estão em vias de esquecimento. As brincadeiras de crianças, as danças de roda, todas as manifestações infantis do passado também estão num gradativo processo de desuso e abandono. Menino não brinca mais de cavalo de pau, menina não brinca mais de boneca de pano nem de casinha em miniatura. Criança não tem mais carrinho de madeira nem corda pra pular.

Nos dias atuais, onde os brinquedos tecnológicos estão massificados no cotidiano das crianças, estas nem se importam com aqueles atrativos artesanais que acaso possam encontrar. Do mesmo modo, sempre acham que é melhor ir numa loja escolher seu brinquedo a serem presenteadas com algo que, por exemplo, não fala e não anda sozinho.


Verdade que as crianças do tempo presente não têm qualquer dever ou obrigação de conhecer e gostar dos brinquedos antigos, das velhas canções infantis, das brincadeiras de roda. A realidade é outra, como os mais velhos costumam dizer. Contudo, precisam conhecer para alargar suas opções.

Do mesmo modo que os pais gostam de contar aos filhos as boas experiências passadas, bem assim deveriam fazer com relação às suas brincadeiras de antigamente. E não somente isso, não apenas rememorar tais ludismos, mas também, e principalmente, incentivá-los a experimentar, a usar, a praticar.

Ora, as cantigas de roda e os brinquedos antigos não perderam sua validade nem sua importância. Pelo contrário, continuam como exemplos de práticas sadias e eficientes no desenvolvimento motor, sensorial e da criatividade. Além de se constituírem numa forma de preservação cultural.
Se a criançada de hoje soubesse o prazer contagiante daquelas antigas brincadeiras e cantigas, certamente cantaria: “Como poderei viver, como poderei viver, sem a tua, sem a tua companhia...”.

(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.

Poeta e cronista
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